Por algum motivo estranho, me recordei de um discurso antigo que minha professora de história recitara sobre o medo durante o momento aterrador que Torque pairou sobre meu rosto da mesma forma que um executor impassível representava uma sentença de morte. Minha memória não guardara todos os detalhes nas pastas das Coisas Super Maneiras do Magnus, mas a linha de raciocínio cozinhava meus pensamentos igual a carne picada em panela de pressão. Principalmente, a cotação envolvia o fato de que a maioria das pessoas no planeta pensam que a sensação do medo pode ser superada por meio da experiência. Aqueles que conhecem suas fobias tendem a acreditar na filosofia de que irão conquistá-los através da força de vontade. Mas o verdadeiro medo não é uma emoção que possui razão. Ele é um instinto. É como um enxame de insetos rastejando acima de sua pele. O verdadeiro medo não tem limite.
Eu me recordo exatamente da resposta atravessada que aprisionei em minha lingua no minuto seguinte em a Sra. Lobato terminou o monólogo: Puxa, que velha maluca! Eu só perguntei que horas batia o sinal para o intervalo!
Agora, eu lamentava por não ter dado a razão merecida da professora (é, você vai se arrepender de certos atos vergonhos de que não se orgulhou de ter feito quando enxergar sua amada mortalidade passando diante de seus olhos pela segunda vez em um Coliseu subterrâneo). Nós, seres humanos, temos coisas que nos fazem nos sentir confortáveis e que nos fazem nos sentir apavorados. Quando entramos em um lugar aconchegante, nem mesmo conseguimos formular uma resposta clara do porquê de estarmos satisfeitos. Mas quando chegamos em um lugar temeroso, até mesmo o garoto mais tolo pode identificar as causas do medo. A escuridão, o frio, o confinamento, a altura, a dor, a contaminação. As pessoas podem listar números inimagináveis de razões para terem medo. Nós pecamos em nossa simplicidade. Alguns milhares de seres vivos gastam incontáveis anos úteis de vida estudando para descobrirem o sentido de sua existência e outros bilhares fornecem infinitas respostas para o porquê não quererem morrer. É natureza da vida evitar a morte. Por isso tentamos sonegar o medo. É mais fácil se esconder dele do que enfrentá-lo. Assim, a possibilidade de não ser afetado pelo medo ao ainda respirar é nula.
Não podemos escapar de nossos instintos.
Eu conhecia a verossímidade estabelecidas por essas lembranças em primeira mão ao encarar Torque arremessar sua espada para o lado e agarrar um pilo sangrento de suas costas com um sorriso perturbador impresso em seu semblante imoderado. Ele ergueu-o milimétricamente sobre meu pulmão esquerdo, mas não havia como ele me fazer sentir mais assustado do que eu já estava deparado em um oceano de dor e desespero.
- Esse é o seu fim, humano! - Ele urrou, descendo sua arma contra mim.
Todavia, o ser entrou em ação e me ofereceu azia.
Uma sensação de ardor começou a consumir meu estômago com uma queimação tão forte que parecia que eu estar sofrendo um doloroso refluxo com ácido e a substância corrosiva estivesse derrentendo lentamente orgãos internos em seu caminho. A temperatura insuportável fez meu pobre coração palpitante tentar o possível para ultrapassar a escala de trezentos batimentos cardíacos por segundo. Eu subitamente fui novamente tracionado para alto por uma força invisível e liberei um círculo gigantesco de chamas devastadoras de meu umbigo, infligindo uma grande explosão a área circundante com a abóbada de fogo iluminando o forte com uma claridade dourada e ofuscante. O estranho fora que a onda ardente cada vez maior e mais quente cruzou o corpo dos guerreiros-animais à minha volta tão inofensivamente que poderia ser confundido com o oxigênio transpassando a superfície da terra, mas repelira o defensor alado cruel agressivamente para trás. Eu vi Torque subir do solo com um som agudo e desabar como o cometa mais deformado do mundo. Seu pilo havia sido derretido e sua armadura parecia estar se tornando uma força de coesão intramolecular líquida sob ação do ataque das chamas abrasadoradas.
Eu me preparei para deixá-lo de lado, mas o Encarregado dos Defensores ainda se ergueu insistentemente do chão. Seu bico estava torcido em um formato esquisito, sua face angular se encontrava em um estado deplorável e suas penas haviam perdido o brilho. Uma de suas panturrilhas tinha um corte nojento e seu ferimento fumegava. Sua armadura negra estava amassada e chiava. Seu elmo começou a se desfazer, soltando pedaços e fibras.
- Você pensa que ganhou alguma coisa, mortal? - Torque praguejou, cuspindo uma porção escura de sangue dos lábios. - Acha que venceu essa batalha? Eu ainda estou vivo. Eu represento o Orgulho das Águias. Você não pode me matar!
Ele se retesou e investiu contra mim. Apesar do defensor estar mancando e praguejando lamentavelmente, tinha que admitir que a águia era irritantemente durável. Torque se aproximou à alguns centímetros e se preparou para me atingir, mas eu soquei seu rosto com a mão esquerda, o quê não teria sido grande coisa se eu não tivesse o poder do ser correndo por meus braços e pernas. Meus músculos pareciam ter adquirido uma imensa energia. Minha pele estava protegida. Meu punho estava mais pesado, denso e forte. Para você ter uma boa noção, um golpe meu equivalia a um lutador peso-pesado usando uma serra elétrica. O defensor alado rugiu de frustração e se jogou contra mim de novo, embora estivessemos em uma escala de poderes completamente distantes.
Meu outro soco foi lançado com tanta força que Torque voou para o lado e aterrissou esparramado no piso.
- Argg - Gemeu a águia.
- Cale a boca, cara - Disse eu, com a testa dobrada.
- Matar... uh... você... uh... - Murmurou ele em estupor.
Eu me movi para acertá-lo outra vez, mas Kevin foi mais rápido. Ele correu até a cabeça da ave, agarrando o escudo pesado mais próximo e o batendo com força no nariz da ave.
- Eis uma dica sobre a derrota, Orgulho das Águias. - Meu amigo contou. - Você levou uma surra de dois humanos sinistros. Então aceite a perder, otário!
Kevin golpeou o seu rosto mais duad vezes.
- Ugh! - Gemeu ele em resposta.
Eu sorri e apoiei minha espada no ombro direito, dando um passo à frente.
- Meu nome é Magnus Elliot Jr. - Disse eu, com uma voz totalmente diferente, soando mais profunda e rouca. Dúvida se transfornou em pânico. Era a voz do ser na minha mente. Desde de que momento eu não conseguia distinguir meus pensamentos com os do ser? - E nós dissemos que iriamos chutar seu traseiro!
Torque literalmente desmaiou de emoção. Seu ódio surreal e sua sede por vingança finalmente entraram em falência. Seus corpo rangeu e seus olhos giraram nas órbitas, fazendo a ave desfalecer e espalhar milhares de penas pelo torreão.
Por um momento, o forte ficou silencioso, exceto por alguns deslizamentos de pedra da construção defensiva e oito focos de incêndio causados por mim. Um anel irregular de animais-atacantes me cercou. Os guerreiros-castores foram os primeiros a saltarem em comemoração. Antes que me desse conta, eles ergueram Kevin e eu sobre os ombros como se fossemos cantores famosos e começaram a entoar:
- Mortais! Mortais! Mortais!
Entre os que gritavam estava a própria Liah, que levantou a mão e agarrou a minha, me parabenizando. Toda aquela atenção me constrangia, mas eu me senti feliz ao ver como os castores estava sendo tratados. Todos os chamavam de atacantes natos, e eles mereciam. Um camaleão até falou sobre reitegrar os roedores ao rol de honra da Sociedade dos Cinco. A multidão aclamadora nos carregou ao longo da muralha interna, tomando o cuidado de evitar um Torque roncando no solo, escoltando de volta para a arena. Nós descemos educadamente de nossa carona quando saímos do torreão, marchando triunfantemente e passando por inimigos boquiabertos e fileiras de espectadores igualmente atuardidos.
Kevin apareceu ao meu lado, com um largo sorriso.
- Boa, Homem-Galinha. - Elogiou ele, embora seu rosto estivesse bem arranhado e parecesse estar se segurando para não desmaiar.
- Kevin, você...
- Ei, humanos. - Interrompeu a garota-leão, acotovelando um conjunto aglomerado de crocodilos enloquecidos em euforia e me estudando como se estivesse me vendo pela primeira vez. - Isso foi extraordinariamente bravo, apesar de imensamente estúpido, para humanos. De qualquer maneira, nós não teriamos vencido as Provas de Combate sem vocês.
- Humn, obrigado - Eu falei, meio envergonhado.
Ela balançou a cabeça em direção ao meu companheiro e se juntou aos festejos das pessoas-animais. Eu entreolhei Kevin de soslaio, ambos sorrindo. Parecia que havia conseguido o respeito da felina. Eu encarei o camarote de ouro e avistei Delfim nos observando com fascínio. Seus olhos cintilavam com orgulho. Sobek estava completamente boquiaberto enquanto Nagato exibia um leve sorriso em seus lábios escamosos. Thotenic parecia em estado de negação. Suas asas se inquietavam atrás de seu corpo e um tique incontrolável ocorria na pálpebra esquerda do seu olho arregalado.
- As Provas de Combate tem vencedores! - Indicou Delfim, divulgando a informação como se estivesse tentando conter o riso. - Deuses e mortais, reúnam-se para receber as honras!
Houve uma breve agitação no camarote de seda do Coliseu e um friozinho de suspense arranhou minha garganta. Forcei meus olhos para enxergar melhor o que estava acontecendo, mas o máximo que consegui ver foram as fracas e distantes silhuetas dos Mestres das Tribos. Eu mordisquei o lábio inferior após decidir deixar aquele assunto de lado, pois minhas tempôras quase se abrirem de tantas idas e voltas de escolhas corretas. A organização na arena lentamente se estabeleceu, com os guerreiros-animais se reunindo conosco. Eles me cercaram, dando tapinhas animados nos ombros de Kevin e elogiando minhas técnicas de combate, comparando-as com as de um tal jovem castor chamado Heitor.
Eu me perguntei se estava sonhando.
Aquele era um dos melhores momentos da minha vida. E talvez realmente fosse, mas o destino resolveu chutar meu traseiro e dar uma grande guinada na situação.
Subitamente, o Mestre da Tribo dos Leões se levantou de seu trono dourado e subiu no parapeito do camarote do Coliseu, saltando à dez metros de altura.
- Não, não, não! - Disse Liah, surgindo bem ao meu lado, com uma expressão mortificada. - CERREM FILEIRAS!
Quando Kenpachi alcançou a arena, o piso arenoso rachou sob o impacto de seus pés no ponto exato em que aterrissou e criou diversas fissuras no terreno, quebrando-o em um ritmo constante. Os guerreiros-castores se juntaram e ficaram ombro a ombro enquanto em torno deles, a terra tremia. Crateras gigantescas se formaram por todo o forte. O Coliseu inteiro se abalou. Um vento varreu a arena violentamente. Abaixo de mim, o solo começou a ondular, como se tivesse se transformado em um grande colchão de água gigante. Castores tombaram. Defensores escorregaram. Kevin e Liah cairam de cara no chão.
Mas, de alguma forma, eu consegui me manter de pé.
Então o corpo de Kenpachi detonou em uma aura de poder avassaladora, fazendo a terra e areia se erguerem da arena em um redemoinho como se ele fosse a broca de uma furadeira gigante, transformando uma pequena parte do piso central em pó. Meu queixo pode ter caído quando a superfície inferior se revelou sendo uma extensão tecnológica de aço comprimido sobre o Coliseu.
- Finalmente um oponente à altura - Bramiu Kenpachi, retirando um machado imenso de dois gumes de suas costas.
Ele era bonito, do tipo vou-matar-você-dolorosamente. Cada uma das lâminas gêmeas tinha a forma de um C de vou-Cortar-você-como um-peixe. O cabo tinha quase a altura de Kenpachi, forjado em ouro e envolvido com um couro esverdeado suspeitosamente parecido com o de crocodilo.
Seu braço de bronze reluziu malignamente.
- Lute comigo, Khalid!
Centenas de respirações foram presas. As múltiplas fileiras das arquibancadas separadas estavam extremamente estupefadas, completamente chocados com a última palavra que Kenpachi dissera em um aparente egípcio arcaico.
- Você é louco! - Eu mandei para o Mestre da Tribo dos Leões, embora tivesse levantado a minha arma. Qual era o problema desses deuses menores comigo para sempre desejarem duelarem até a morte comigo? - Eu não vou lutar com você!
- Você não tem escolha - O Mestre da Tribo sorriu assustadoramente para mim antes de desaparecer instantâneamente da arena.
- Mas que mer...? - Eu comecei, mas senti um formigamento terrível na espinha.
Em um flash, Kenpachi interrompeu minha frase surgindo bem à minha frente, com o machado erguido e pronto para me matar. Instintivamente, ergui a espada à tempo de evitar que eu me transformasse em duas fatias nada deliciosas de Magnus Elliot. Minha lâmina chocou-se contra a do Mestre dos Leões com um estrondo intenso assim que ele desceu o punho, apararando seu golpe mortal. O impacto formou um muro de areia de três metros de altura sobre a extensão tecnológica misteriosa. Eu constatei maravilhado que a grossa camada de aço estava tentando magicamente reconstruir a estrutura da arena como uma espécie de projetor, criando lentamente um terreno arenoso com novas armadilhas e ardis nada excitantes.
Contudo, mesmo com o golpe defendido do felino, eu segurei a lâmina de minha espada na parte chata com as duas palmas das mãos em uma tentativa desesperada de não ser esmagado pela força praticamente imparável de Kenpachi. Era a coisa mais pesada que eu já havia suportado, e mesmo com todo aquele o poder flamejante viajando pelas minhas correntes sanguíneas, a sensação se assemelhava ao estar sendo esmagado debaixo de mil caminhões. Minha consciência imbecil decidiu abandonar a resistência de não desmaiar e declarar desistência por causa do peso, mas respirei fundo e impulsionei uma firmeza que não possuia na espada.
Isso vai doer amanhã, pensei esperançosamente. Mas eu tenho que conseguir! Eu me recuso a morrer!
Os olhos do Mestre da Tribo se estreitaram.
- Você sobreviveu ao meu ataque... - Ele estava tão surpreso com o fato que hesitou por um momento, relaxando brevemente a brutalidade em seu machado.
O quê me assustou de verdade foi que eu continuei me concentrando bastante para não ser achatado como walffles em uma paquequeira. Mesmo devido a sua estatura musculosa, o grau de força do leão estava em tamanho nível que não me surpreenderia se ele pudesse demolir um prédio de dez andares com uma cabeçada. Kenpachi afastou suas reflexões com uma gargalhada insana e ameaçadora, recomeçando a me atacar furiosamente com um poder inumano. Eu mal conseguia respirar. Meus olhos quase não conseguia vê-lo se mexer. Cada vez que eu inspirava tremulamente, a lâmina perdia a altitude, e cada vez que expirava sufocantemente, faíscas saltavam de minha espada negra e o chão estremecia com lamentos triturantes. Eu tive a sensação de que estava ficando menor e minhas pernas arderam em agonia, me fazendo desviar o olhar baixo e ver que não me encontrava diminuindo. A terra que estava afundando em uma cratera disforme sob influência das manobras ofensivas de Kenpachi embaixo de meus pés. Teias de rachaduras abriram caminho pelo Coliseu e pedregulhos do tamanho de carros saltavam da arena como lápides tenebrosas de um cemitério amaldiçoado.
O que é isso?, eu me perguntei, alarmado. Os golpes de Kenpachi são pesados, mas nem mesmo tenho capacidade de acompanhar seus movimentos! Como isso é possível?
O Mestre da Tribo dos Leões atacava minha espada com seu machado repetidas vezes com apenas um braço e meus calcanhares gritavam de sofrimento ao suportarem as investidas aniquiladoras. Eu imaginei o estrago que o felino poderia fazer me atacando com seu braço de bronze e uma paralisia de terror se espalhou por meus neurônios.
- JÁ FAZ MUITO TEMPO QUE EU NÃO ME DIVERTIA TANTO ASSIM! - O sorriso no rosto de Kenpachi começou a se alongar de forma animalesca e ergueu seu machado sobre minha cabeça derradeiramente.
Entretanto, eu estava absolutmente convicto de que só minha força de vontade não seria suficiente para deter o próximo ataque fatal. Meus cálculos mentais não objetavam. Nunca poderia vencer o duelo na força. Meus reflexos retomaram o controle motor e eu saltei para trás exatamente quando o machado de Kenpachi abriu um buraco fundo na camada de aço comprimido onde meu centro de gravidade se posicionava anteriormente. Minha consternação pesarosa se transformou em um forte impulso de ansiedade. A brecha perfeita para avançar surgira. Só teria a vantagem por menos de três segundos. Eu risquei os ventos com minha espada negra na direção do Mestre dos Leões de modo frenético até produzir um feixe de luz vermelho. O felino assustador vincou a testa e conclui equivocadamente que conseguiria sobrecarregá-lo, mas o leão restringiu o ataque com as costas nuas de sua mão livre.
Eu senti um gosto metálico na boca. A corrente de energia carmesim foi redirecionada para direita forçadamente e nivelou um pedaço significativo da extensão escura com um atrito poderoso, fazendo milhares de linhas de choque subirem no ar. Um motor protegido com uma espécie de trepa-trepa de alta tecnologia se tornou visível fixado no núcleo da engenhoca extraordinária. Ele era feito de tubos, pistões, engrenagens de bronze, discos de aço, saídas de vapor, fios elétricos e um milhão de outras peças mecânicas que eu não reconheci com meus olhos humanos.
O equipamente de ferro rangeu e zumbiu, fazendo minha crescente desconfiança de que esse não era o sinal de batatas fritas para viagem subir para um estado crítico.
Kenpachi extraiu sua arma do chão com hostilidade e a apontou para mim em uma mesura debochada.
- Por que está fugindo da luta, mortal? - Questionou o leão. - Retorne para a linha de frente e lute comigo!
Algo roçou minha canela e enxerguei um defensor-águia se encolhendo ao meu lado. Seus olhos inchados indicavam que o indíviduo deveria ter acordado de um desmaio recentemente e sua face expressava puro terror. Sua armadura parecia ter sido derretida à algum tempo, mas o material escuro já havia se estabilizado e endurecido em volta de seu corpo como piche, parecendo uma segunda pele grudenta e rançosa. Seu bico estava virado em ângulo estranho. Suas pernas se situavam imersas na terra.
Eu continuei fitando Torque tentando se desprender do terreno arenoso semidestruído, cavando a arena alucinadamente para tentar escapar de sua prisão imprevista.
Na primeira vez que eu o vi, pensei que a ave alada era assustadora com sua armadura sombria, a liderança violenta os olhos sanguinários. Mas estudando o medroso Algoz das Provas de Combate diante do selvagem Mestre dos Leões, Torque parecia um tolo aspirante a guerreiro.
Era Kenpachi que interessava. Ele não precisava de armadura. Era uma máquina de pura destruição.
Eu analisei o campo de batalha com a visão cansada e retratei uma imagem de miséria. Um bárbaro-leão caído gritava por socorro enquanto segurava um felino desacordado e idêntico à ele, possivelmente seu irmão gêmeo, sendo tragado por areia movediça. Duas dezenas de camaleões em trapos tentavam alcançar um jovem réptíl voluntário com a barriga perfurada por uma espada, que parecia quase estar segurando a arma entre o toráx e o braço, mas havia sangue demais. Três castores conseguiram parar de afundar no chão, apesar de muitos outros guerreiros ainda estarem enterrados até a cintura. A maior porcentagem dos deuses presenciavam o medo palpável de estarem presos no Coliseu, fazendo uma grande colaboração árdua para não morrerem enquanto a extensão tecnológica tentava reconstruir o lugar debilmente, tornando a situação ainda pior. O peso dos oceanos de culpa jorrou sobre meus ombros. Kenpachi queria lutar comigo, mas não se importava nem um pouco com as consequências insanas. Até mesmo os membros de sua Tribo não escapavam de seu desejo pirado de combate. Meu coração se quebrou quando meus olhos encontraram Kevin e Liah empurrando inutilmente algumas hastes de ervas-daninhas envolvidas em seus corpos e os puxando para baixo. A garota-leão tentava fatiar gavinhas enroscadas em seus tornozelos e meu melhor amigo impedia vugorosamente que um apêndice filiforme se instalasse em seu pescoço com as duas mãos.
Então meu ânimo se dissolveu em uma cólera intensa em pico máximo.
Eu, vendo meus novos companheiros de armas sozinhos, desprotegidos contra ira de um Mestre de Tribo, senti algo despertar dentro de mim como um motor de carro cuja a última marcha é engatada. Minha mente foi tomada pela calma. Meu pensamento subitamente tornou-se mais rápido e limpo. A raiva e o medo não desapareceram de meu âmago, mas me dei conta de que essas emoções não eram importantes.
Elas não iriam me ajudar a salvá-los.
Os grilhões que me aprisionavam se partiram. Meu corpo explodiu em uma tempestade de chamas e eu me sentia feito de fogo. Era como se eu tivesse invocado uma erupção solar. As chamas cresceram pela minha lâmina e espalharam-se em uma torrente incontrolável de calor. Turbilhões de fogo dançaram pelo terreno e labaredas fulgurantes criaram pilares gigantescos e incandescentes sobre o céu acima do dossel escuro, capazes de incinerar qualquer coisa que se aproximasse demais. O conjunto de seres animalescos assistindo as Provas de Combates no Coliseu hesitou. Os deuses menores estancados na areia se viraram e me encararam, sobrepostos com minha repentina eclosão de energia e com seus dutos lacrimais secando com a temperatura poderosa. Rochedos se derreteram ao longo da arena.
O Mestre dos Leões sorriu.
- Ah, pobre Khalid. Você precisa de rodinha, assim como aqueles que impedem que as crianças caiam enquanto está aprendendo a andar de bicicleta, para vencer esse combate - Ele abriu os braços, vanglorioso. - Espera mesmo me desafiar com isso?
Eu estava tão furioso que ergui minha espada em um tornado flamejante e expandi minha energia até Kenpachi sem pensar duas vezes, mandando uma vendaval de chamas desintegradoras para o felino. O leão não conseguiu se proteger do lance ofensivo dessa vez, sendo jogado com força para trás e colidindo contra a muralha oeste do forte, que despencou em cima dele. Os ruídos dos instantes seguintes foram só de deslizamento de escombros caindo. Depois, do meio dos ruínas, uma gargalhada se reverberou. Kenpachi se levantou das ruínas, atirando um enorme pedaço de pedra para o lado e errando por pouco uma águia com a face paralisada.
- Muito bom! - Rosnou ele, com o manto similar a um haori em farrapos. - Completamente inútil, mas bom, Khalid! Eu terei o prazer de fazê-los em pedaços!
O Kenpachi apontou seu machado de dois gumes para mim e as lâminas brilharam. Ele se provou tão bom em empurrões mágicos quanto eu, pois o impacto transparente de um time inteiro de futebol americano acertou meu peito como um aríete, mas nem fiz careta. Minha pulsação acelerou. A aura de fogo em meu torno permaneceu incólume do assalto enquanto o leão parecia relativamente incrédulo com minha defesa drástica. Meus vasos sanguíneos canalizavam tanto poder que pareciam com a ativação de geradores elétricos com energia suficiente para iluminar uma nação. Eu movimentei meu pé para frente e manipulei minha energia transbordante para dar uma boa lição em Kenpachi, mas o ser pediu em minha mente:
Magnus, deixe-me assumir o comando.
Eu cuido disso, respondi.
Não, eu preciso impedi-lo de se matar! Você não está preparado e não poderá lutar com Kenpachi. Ele não é nosso inimigo!
Ele parece um inimigo bem convincente, principalmente na parte que está tentando me matar, eu repliquei rudemente.
O Mestre dos Leões se perdeu pelo seu caminho divino, o ser respondeu com o tom supérfluo do famoso Isso Explica Tudo. Mas o deus menor ainda não se foi para sempre. Não é porque alguém caí na estrada que ela nunca se levantará. Muita dor foi inflingida à ele.
Ele quer inflingir muita dor em mim!
Não irei ajudar você a combatê-lo, Magnus. Não posso escolher entre os dois. Você precisa aprender...
- Não! - Gritei
Nossa conexão vacilou. Por algum motivo, eu sabia que não podia compartilhar a mente com o ser e ter um desacordo. Para um Manipulador do Fogo, eu teria que agir em perfeita sintonia. Eu tentei invocar minha barreira mágica flamejante novamente, mas ela imediatamente se dissipou e me jogou no chão.
Vamos lá, ser!, eu reclamei. Você tem que me ajudar!
Ele não me respondeu.
A risada de Kenpachi ecoou por todo Coliseu igual a um verdadeiro vilão dos cinemas.
- Sem ka, pequeno humano? - Ele perguntou como se fizesse o maior sentido. - Que pena. AGORA QUE EU ESTAVA COMEÇANDO A ME DIVERTIR!
Então Kenpachi liberou uma quantidade monstruosa de poder. Uma forte explosão de energia amarela o envolveu e uma uma caveira imensa pairou à suas costas, rindo insanamente como o Pac Man mais malvado e esquelético do mundo. A terra da arena se atraiu em sua direção. Montanhas se inclinaram, rochas rangeram, o solo se moveu como ondas. Eu me elevei com os ventos, mas os guerreiros-animais começaram a se afogar no campo de batalha. O forte do Coliseu tombou e desapareceu na terra.
Eu levantei minha espada e comecei a ir na direção dos Mestre dos Leões. Minha auto-estima estava sendo drenada por amargura e decepção, mas não iria me entregar apenas porque a fonte de meus poderes se recusava a lutar ao meu lado. Eu nunca desistiria. Meus amigos contavam comigo. Ergui minha espada, mas o ser não estava me ajudando naquele momento. Eu era apenas Magnus Elliot, e minhas forças eram claramente vagarosas. A expansão de poder que havia me invadido diminuia gradativamente e meu surto de adrenalina parecia estar perdendo o efeito. Eu me sentia como se estivesse a ponto de desmoronar. Apesar de todo o poder flamejante que já estivera em mim, meu corpo começou a pulsar. Meus olhos estavam pesados de exaustão. A energia do ser parecia estar se esvaindo rapidamente de meu organismo, me deixando sem muitos recursos.
- Não faça isso! - Gritou Liah, a garota-leão, mas eu estava tão furioso que nem mesmo respondi de volta. - Você nunca poderá vencê-lo!
Kevin olhou para mim. Pela primeira vez, seu tom estava mortalmente sério:
- Magnus, eu nunca o perdoarei se você morrer. - Seus óculos cintilaram. - E não só porquê você ainda não me pagou meus dois reais, cara!
Magnus, concentre todo seu poder em sua espada, disse o ser com a voz vacilante, como se desejasse me ajudar, mas não soubesse se a oferta seria bem-vinda. Você gastará todos suas reservas de energia um único ataque final, mas consequentemente, seu poderes se esgotaram completamente.
Eu vou conseguir vencê-lo?, perguntei de má vontade, embora ainda estivesse zangado.
É sua única chance, respondeu ele sombriamente.
Por que as coisas nunca podem ser simples?
Eu estendi minha espada para o alto com o braço direito enquanto o apertava com o punho esquerdo em direção um Kenpachi alegre demais.
É meu amigo, pensei, dando um passo à frente nos ares. Impressionante, mas nós dois podemos brincar desse jogo.
Um pequena espiral de chamas se desprendeu de minha espada negra e um fogo concentrado flutuou em torno de mim, mas a diferença de energia entre o Mestre dos Leões e eu estava em um patamar tão oposto que era quase patético.
- Eu não posso perder. - Eu murmurei para mim mesmo. - EU PRECISO GANHAR!
Kenpachi pareceu apreciar minha ira.
- Então é assim? - Ele retumbou, balançando sua arma dupla. - Você é destemido. Esse crédito eu lhe concedo. E É POR ISSO QUE IREI LUTAR COM METADE DE MINHAS FORÇAS!
Eu disparei pela arena gritando, deixando um rastro de vapor às minhas costas enquanto Kenpachi vinha em minha direção como um trem-bala, destruindo tudo em seu caminho com seu machado e sorrindo insanamente.
Minha última lembrança é de nossas lâminas se encontrarem e uma mini-explosão nuclear sacudir todo o Coliseu.
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Sociedade dos Cinco e a Jornada pela Cidadela
AventuraOlhe, se você estiver ouvindo essa gravação, saiba que eu não queria ser tão "especial". Eu não queria participar do fogo cruzado de uma guerra entre feras lendárias, não queria ter "acidentalmente" incendiado sua casa ou destruído seu jardim de flo...