Capítulo 3 - Impactos

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- Ele ainda não acordou. – Disse Daria, quebrando assim o silêncio. – Será que ele está realmente bem?

Não era possível enxergar muita coisa dentro daquela cela, mas Diara forçou seu olhar para aonde seu cônjuge estava. Stuart continuava deitado de bruços, na mesma posição em que fora deixado. Seus braços permaneciam algemados como os dos demais, e apenas sua respiração o denunciava como vivo.

- Ele recebeu uma pancada muito forte, mas vai ficar bem. – Respondeu Braax de seu canto na cela. O novariano tinha mais de uma algema em seus longos braços, e sua máscara fora confiscada, o que lhe enfraquecia o corpo. Era notável a dor que sentia a cada novo minuto que se passava. – Se Thrunn o quisesse morto, aquele golpe o mataria.

Diara, a herdeira do trono de Lovan, deixou que sua cabeça se inclinasse até que encontrasse apoio em uma das vigas de aço da nave. Seus olhos púrpuras vagavam em meio à pensamentos, enquanto fios de seu curto e escuro cabelo lhe tocavam o rosto. Andre Price pilotara Corvo até que chegassem à nave do Tirano, na órbita lovaniana. Era a primeira vez em dez anos que ela orbitava seu planeta natal, e uma onda de sentimentos invadiu rapidamente seu coração.

- Veja só, se não é a corajosa princesa deste planeta. – Disse Thrunn ao perceber que os Decifrados traziam seus mais recentes prisioneiros para Ponte. O gigante azul mantinha os redemoinhos brancos que eram seus olhos fitados nela, como se comemorasse uma vitória, ou como se vibrasse pelo sucesso de um plano. – Explodiu metade do próprio palácio para proteger o seu humano, e isto é honrável, claro, porém, de nada valeu se pensar no que perdeu para isso.

O General se ergueu da Cadeira, quase encostando seu capacete escarlate no teto da Ponte. Cada passada que dava com suas rubras botas provocava um tremor, assim como quando batia com a base de seu martelo, o símbolo de seu imensurável poder.

- Graças aos seus impulsos eu pude colocar dois de meus mercenários em Go'k, onde você me entregou exatamente o que eu queria. – Thrunn seu aproximou de Braax, que, mesmo sendo um novariano, ainda assim era mais baixo do que o Tirano. Olhos rubros se encontraram com os redemoinhos do General, e por um segundo lutaram uma guerra silenciosa. – Cônsul, você já deve imaginar o que eu conquistei em Go'k, além de um punhado de prisioneiros.

O novariano fechou os olhos e, subitamente, rompeu sua algema em meio à fúria que desencadeou em si. Impulsionou um de seus longos braços contra à face de Thrunn, atingindo-o em seu queixo retangular.

O General nem sequer se moveu, o golpe não conseguiu quebrar a inércia do corpo de Thrunn,. Era como se não tivesse o acertado. O tirano abriu um longo sorriso, segurando com uma de suas manoplas o braço que ousou tocá-lo, ergueu-o junto com seu dono. Com a outra mão enluvada, lançou um único golpe contra o tórax do novariano, fazendo-o cair desacordado no chão.

- O Lâmina escarlate parece compreender o que vocês realmente perderam naquele planeta. – O Tirano se apoiou em um de seus joelhos, aproximando seu rosto dos grandes e arredondados olhos de Diara. – O seu grande amigo novariano agora é o meu grande amigo novariano.

Pânico se juntou ao mar de sentimentos que Diara Li'ri sentia naquele momento. Lummx havia desmaiado em um dos becos de Go'k para salvá-la, e desapareceu assim que ela olhou novamente para aonde ele deveria estar. Culpa e remorso invadiram sua mente enquanto lembrava das últimas palavras que seu colega havia lhe dito.

- Desgraçado! – Stuart disse lançando-se contra o General. Thrunn, ainda ajoelhado, apenas virou o rosto para observar o humano que corria em sua direção. Cage foi lançado contra os painéis laterais da Ponte com apenas um simples movimento da mão do Tirano, como se tivesse espantado uma mosca com a palma da mão.

- Stuart! – Diara e Daria gritaram em uníssono. Os painéis lançavam seus estilhaços e faíscas no humano caído sobre os monitores. Cage deu uma última olhada para Diara antes de perder sua consciência.

- Parece que alguma coisa muito forte corre no sangue dos Cages. – Thrunn disse ao se erguer. O ditador de Lovan caminhava mais uma vez pela Ponte, observando os monitores que os rodeavam. – Seu filho também tinha algo de especial em seu âmago, algo que nunca terá a chance de demonstrar, porém.

Diara ergueu um de seus braços, assim como sua irmã erguera o oposto. Apoiadas uma nas costas da outra, urraram enquanto desferiam um golpe em conjunto contra o Tirano. Raios uniram-se às labaredas . Explosões e faíscas voavam dos equipamentos enquanto dezenas de Decifrados gritavam de dor, rapidamente perecendo perante o calor das chamas que lhe queimavam por fora, e dos raios que finalizavam o serviço por dentro. Um golpe horrível, um que nenhum lovaniano se orgulhava de produzir.

- Isso realmente me machucou, se é o que desejam saber. – Disse então o General, seu gigantesco vulto voltando das chamas que o engoliram. Algumas queimaduras muito pequenas cobriam suas mãos e rosto. – Ser imortal não significa que a dor e a morte não perambulem em minhas redondezas. Minha vez de causar dor, Princesa.

Thrunn girou seu corpo, dando impulso para o seu martelo, lançando-o contra o forte vidro que recobria a Ponte. A arma rompeu tal barreira, criando uma rota direta contra o planeta vermelho que flutuava abaixo deles. Os escudos da nave logo se ergueram, impedindo que o vácuo do espaço lançasse todos para o oblívio.

A velocidade do martelo era absurdamente alta, e não foi necessário mais de meio minuto antes que se encontrasse contra à superfície lovaniana. Diara caiu sobre os próprios joelhos, gritando de dor enquanto as vozes de seus patrícios urravam e desapareciam junto ao planeta. Fogo subia do núcleo do planeta, enquanto este se desestabilizava, criando erupções continentais, derrubando os milhares de prédios que rasgavam a atmosfera de Lovan. E em quarenta segundos, e nada mais, apenas poeira flutuaria pela órbita de Lovan.

Daria e Diara não aguentaram a dor de seu povo, e desmaiaram sob o piso metálico da monumental nave de Thrunn. Acordaram naquela escura cela, algemadas, esperando que o pai delas as acordasse daquele pesadelo, cantando cantigas sobre cavaleiros lendários.

- Não temos mais um planeta para chamar de lar. – Diara disse enquanto observava, com seus grandes olhos desfocados, seu marido acordar. – Não somos mais refugiados, e sim órfãos de um mundo que se foi.

- Ainda temos Corenália. – Daria retrucou. Era como se um vazio ecoasse em sua alma, porém, algo ainda respondia este eco. – Thrunn destruiu um pedaço gigantesco de terra, mas nosso povo ainda vive. Uma nação é feita de carne e ossos, não de madeira e pedra.

-Você viu os monitores na Ponte, Daria, sabe que o avanço já começou. – Diara viu os mapas e estatísticas nas telas antes de destruí-las. – Corenália e a Terra já têm tropas de Thrunn em seus solos.

- Basta sairmos daqui, correr para Corenália, e coordenar um contra-ataque. E sobre Gabriel...

Diara enxugou seus olhos nos próprios ombros, fixando seu olhar para Daria.

- Meu filho é um Cage. – Respondeu Diara com convicção. – Ele vive, eu sinto isso.

A princesa lovaniana então se levantou, procurando por algo que não conseguia ver naquela cela. Algo como uma rota de fuga.

- Precisamos encontrar um milagre ou...

As Crônicas de Corenália - O Deus Entre Às Estrelas - Volume 2Onde histórias criam vida. Descubra agora