Capítulo 4 - Eu Me Lembro

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Já não havia mais ninguém na Ponte além deles. Todos evacuaram o Punguista, acatando assim ao comando de seu Capitão. Lamir ajustava uma de suas ombreiras, olhando para as janelas de observação, esperando não estar ali no momento em que ela atingisse o monstruoso cruzador de Thrunn.

- Rendar. – Disse então o colúriano para o abatido lovaniano. – Se sente melhor?

O Lovaniano amarelo olhou com seus grandes e arredondados olhos para o amigo, demonstrando toda raiva e angústia que habitavam seu coração. Tentou falar, mais demorou um pouco antes das palavras saírem.

- Posso não ser um amante do meu planeta natal, mas isso é horrível demais. – Ele então disse, erguendo-se de um dos assentos que os tripulantes usavam para monitorar as dezenas de telas posicionadas na lateral esquerda da Ponte. – Eu pude sentir minha raça inteira urrar em dor e agonia antes que tudo terminasse. Senti como se meu corpo não fosse aguentar tudo isso.

- Bem, que bom que ele aguentou. – Disse Lance ao entrar na Ponte. Apoiou sua mão esquerda sobre o ombro direito de Rendar antes de continuar até a Cadeira de Comando da nave. – Não estou com a menor vontade de preparar discurso de funeral para você, cara. Eu ia acabar chorando e me tacando no seu caixão.

- Você realmente acha que tem habilidade o suficiente para decolar uma nave de emergência sem desativar a simulação de velocidade? – Lamir perguntou para o humano ruivo que se armava na sua frente. – As chances de morrermos esmagados contra a nave de Thrunn, ou até mesmo contra nossa nave, são imensas!

- Viu? É exatamente disso que eu sempre falo de você, Lamir! Falta fé! – Lance colocou seu capacete, configurando sua interface para enxergar todas as informações lançadas no visor. – Eu sou o melhor piloto que estas galáxias já viram!

- Você não foi o melhor nas Cem Voltas Dolorianas. – Rendar retrucou enquanto limpava seu rifle. – Nem no Grand Prix da Federação, nem no...

- O Passado é uma imagem tortuosa demais para ser lembrada por nós! – Lance disse, cortando a fala de seu amigo. – O que importa é que já não podemos mais parar esta nave. Se ficarmos, com certeza morreremos.

Os três ladrões se puseram em movimento pela nave, dando seus últimos passos dentro da Punguista. Apenas uma nave de emergência sobrara dentro da velha espaçonave federativa, reservada para que os três amigos ladinos escapassem do impacto voluntário contra o tirano azul.

A nave de emergência era compacta, desarmada, e com um único reator para levar seus tripulantes para o planeta, ou satélite, mais próximos. Lance fitou com seus olhos, as estrelas distorcidas que rasgavam o vazio do espaço sideral, visíveis através do, já descido, portão do grande compartimento de carga.

- Na pior das hipóteses, ficaremos como aquelas estrelas. – Lance Kirby disse enquanto acionava o pequeno reator da nave, acelerando-o até chegar ao seu limite, ultrapassando-o. Suas células energizadas produziam o sempre indesejado vapor escarlate, simbolizando um gigantesco perigo, parafusado poucos centímetros abaixo dos assentos. – E lá vamos nós!

A minúscula espaçonave irrompeu contra o escuro do Universo, ultrapassando rapidamente o escudo energético que os protegia, até então, do vácuo do espaço. O reator superaquecido impulsionou-os para longe da Punguista, evitando que a velocidade dela destruísse a menor assim que saísse de sua simulação.

Lance, Rendar, e Lamir presenciaram o momento em que sua amada nave atingiu a cauda do cruzador de Thrunn, causando danos o suficiente para destruiu um, ou mais de um, dos seus reatores principais.

- Consegue sentir alguma das lovanianas, Rendar? – Perguntou Lamir enquanto observava as diversas explosões que a Punguista ainda ocasionava à estrutura do gigante metálico que flutuava próximo deles.

- Estão vivas. – Rendar respondeu. Apontou para uma região do cruzador próxima da explosão. – A cela deve estar naquela área. Sorte que não as atingimos.

- Você chama de sorte. – Lance desviava dos destroços que começavam a preencher o vazio em volta do cruzador. – Eu chamo de "entrada para visitantes".

Kirby girou a nave de emergência, ultrapassando uma pequena brecha na fuselagem de Thrunn e colocando-os dentro da grande máquina de guerra do tirano azul. O superaquecimento do reator fez com que o pequeno veículo flutuasse até pousar no que antes era uma gigantesca ala médica. Os três ladrões rapidamente saíram dela antes que os trens de pouso se desligassem, perdendo o magnetismo que a prendia contra o cruzador.

- Atirem em todo mundo que não pareça um cônsul, ou um militar rabugento. – Lance disse, sua voz quase abafada pelo sonoro alarme que os avisava da descompressão daquele setor. – Precisamos do caminho livre para a Corvo se desejamos sair vivos daqui.

Os três criminosos se puseram um ao lado do outro, formando uma parede que avançava por aquele gigantesco cruzador lovaniano, guiando-se através das habilidades de Rendar, que usava a Princesa Diara como ponto de referência.

Os confusos Decifrados que corriam contra eles logo eram abatidos, caindo sem vida no chão, ou sendo sugados pelo poderoso vácuo do espaço, que rompia a fuselagem daquela nave sem aviso prévio.

Rendar virou o corredor, pondo-se rapidamente contra o lado esquerdo de uma grande porta de metal. Lamir lacrou aquela ala, atirando contra o painel que mantinha erguido o sistema de emergência. Uma grande parede de aço novariano desceu, vedando o resto da nave. Logo após seu tiro, o coluriano se pôs no lado oposto de seu companheiro de olhos grandes.

- A qualquer momento, Capitão. – Rendar disse com uma voz metálica. Seu capacete era um modelo lovaniano antigo, e ele não queria usar os da Federação.

Lance acenou positivamente com seu polegar, dando permissão para que Lamir atirasse mais uma vez, agora contra o painel da cela.

A grande placa de aço deslizou para o lado, escondendo-se por trás de uma das grossas paredes daquela nave militar. Em seu interior era possível ver os cinco membros do Conselho, com suas costas contra as paredes da cela, lutando para manter o equilíbrio.

- Princesa Diara. – Lance disse, aproximando-se da nobre lovaniana. – Está na hora de irmos.

Diara, sem reconhecer o estranho que usava um antigo capacete federativo, desferiu um soco contra o estômago de Kirby, fazendo-o perder o ar.

- Calma! – Exclamou Lance ao tirar o seu capacete. O criminoso ruivo deixou que um sarcástico sorriso preenchesse seu rosto, escondendo a dor do golpe que Li'ri dera nele. – Lembra de mim?

Mais uma vez um golpe foi desferido pela lovaniana, agora no rosto do ladrão. Ele deixou seu capacete cair, soltando um grito que sumiu entre seus dentes cerrados.

- Eu lembro muito bem de você. – Diara retrucou, mantendo a palma de sua mão erguida contra o Kirby. – Traidor do próprio sangue.



As Crônicas de Corenália - O Deus Entre Às Estrelas - Volume 2Onde histórias criam vida. Descubra agora