Parte II - Despedaçado \ Capítulo 9

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Em questão de minutos há uma quantidade considerável de pessoas em nossa casa. Eu apenas consegui balbuciar algumas palavras, tentando explicar o horror da situação. Katniss se manteve num constante estado de choque, portanto alguém sabiamente chamou um médico, que achou melhor dar algumas doses de calmante a ela. Não permiti darem uma quantidade exagerada para fazê-la dormir, pois eu não gostaria de ficar desacordado enquanto meus dois filhos estão desaparecidos. Os remédios a acalmaram, mas não o suficiente para que ela parasse de chorar. O médico também sugeriu que eu tomasse alguns calmantes, o que eu recusei. Tenho que estar plenamente consciente, se eu quiser encontrar meus filhos. Os novos pacificadores, que agora não são providos do distrito 2 e sim dos distritos inferiores, alegaram que nada poderiam fazer, mas as ameaças de Johanna com seu machado recém tirado do porão nas mãos, fizeram com que eles decidissem cooperar ao invés de prendê-la. Haymitch completamente sóbrio, resolveu organizar equipes de busca, para vasculharmos a colina e a floresta. Katniss insistiu que iria conosco, então os grupos foram divididos.

Katniss, eu, Haymitch, Johanna, Annie e um pacificador ficamos no mesmo grupo. Effie queria vir também, mas achamos melhor ela ficar com Posy em casa, caso as crianças aparecessem aqui. Partimos cada grupo rumando a lados opostos da colina, de modo que toda a área fosse vasculhada. Apesar de o dia ter sido ensolarado, a noite é fria, e as lágrimas ficam impossíveis de deter ao imaginar meus filhos perdidos por aí, com fome e frio. Mas secretamente eu desejo que eles estejam mesmo na colina ou na floresta, do que em outro lugar. Munidos de lanternas, vasculhamos a colina gritando por eles, ouvindo os gritos dos outros grupos. Mas não obtemos resposta alguma. Adentramos a floresta, e meu corpo começa a sofrer tremores que eu não sei explicar de onde vem. Seria meu lado ruim querendo vir a tona mais uma vez? Essa é uma coisa que nunca pode acontecer. Principalmente agora, enquanto Katniss soluça em meus braços, e fica mais desolada a cada passo que damos, a cada centímetro que chegamos perto do fim da floresta, e não encontramos nossos filhos.

- Olhem... O que... é aquilo? – Annie pergunta, enquanto aponta sua lanterna para uma árvore que se encontra bem longe de onde estamos, e que já pertence ao distrito 13. Todos apontamos nossa lanterna na mesma direção, e Johanna é a primeira a sair em disparada. Ela chega até a árvore e fica de costas para nós, por um longo tempo. Até que cai de joelhos no chão, e seus soluços são audíveis. Todos já havíamos nos esgotado de chorar, mas Johanna não havia derramado uma lágrima sequer. Até agora. Katniss parece não ter forças nem coragem para ir até lá ver o que foi achado. Mas eu a pego em meu colo, e corro junto com os outros até Johanna. Assim que chegamos próximos a ela, Haymitch esmurra a árvore ao ver o que ela segura. Annie solta um gritinho, e começa a se balançar, murmurando algo inaudível entre suas lágrimas. Katniss decide descer de meu colo e se agacha ao lado de Johanna. E quando ela vê, o que causou tamanho desespero á todos, coloca o rosto entre as mãos e em seguida é abraçada por Johanna. Só então, tomo coragem para ver o que foi achado. No chão, onde johanna o colocou, está um grande pedaço do tecido do vestido que Prim estava usando quando desapareceu. E eu quase não consegui reconhecer a estampa, pois ele está completamente vermelho. E ninguém precisa me dizer que isso é sangue.

- O tecido estava enroscado num ponto muito alto. Algo, ou alguém estava a carregando – O pacificador diz, e toma o tecido nas mãos. – Melhor levar isso para o laboratório e tentar achar alguma digital, que não seja a de vocês que já o pegaram na mão.

Mas eu não consigo dizer nada. Não consigo fazer nada. Apenas morder com força meu lábio inferior, até sentir o gosto de sangue. Só consigo pensar em algo que possa me distrair dessa dor, desse despedaçar interior. Pois é isso que provoca a fera adormecida dentro de mim. E é isso que fez com que essa outra personalidade minha, essa coisa com um instinto assassino, acordasse. Começo a respirar com dificuldades. Meus filhos desapareceram... Esse sangue... O vestido de Prim... Me sinto sendo sugado, todas as memórias felizes desaparecem aos poucos, só restando a dor, o desespero e a raiva. Aos tropeços me afasto de Katniss, pois eu sei o que vem em seguida. E logo uma dor absurda em minha cabeça me acomete. Eu aperto minhas mãos em minha cabeça, e apesar de ser insuportável eu não quero que a dor pare, pois quando ela acaba o que vem em seguida é muito pior. Mas a dor para. E meus olhos se cravam em Katniss, soluçando nos braços de Johanna. A vontade de feri-la é maior do que qualquer coisa. Mas não pode ser maior que meu amor por ela. Desesperado, olho para Haymitch, e como sempre meu velho mentor, amigo, pai... Entende tudo. Ele anda decididamente até mim, e me fita, com tamanha dor estampadas em seus olhos, que por um segundo eu penso que sua dor fara essa coisa ruim se adormecer novamente dentro de mim, num canto obscuro. Mas meu corpo queima, com a necessidade de tocar em Katniss e fazê-la sofrer. E assim que dou um passo na direção dela, sinto a mão de Haymitch acertar meu rosto em cheio, com um soco feroz. E a partir daí, só me lembro da dor em meu rosto, e do meu baque contra o chão.

Depois da esperança - Peeta MellarkOnde histórias criam vida. Descubra agora