Capítulo 23

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Devem ter se passado cerca de dois dias... Ou talvez duas horas... Na realidade eu não sei. Devemos estar sendo acometidos pela maior tempestade já registrada. Não conseguimos enxergar um passo a nossa frente. O vento é castigador demais. Parece que estamos andando em círculos. Não achamos uma saída. Sinto o cansaço de Katniss e Gale por estarem me carregando, tento a todo custo depositar minhas forças na minha perna que ainda esta boa para diminuir o peso, mas mesmo assim, o cansaço nos vence. Katniss é a primeira que cede, e cai de joelhos no chão. Gale me apoia numa grande pedra para em seguida deixar seu corpo tombar no chão também...

- Nós vamos morrer – Katniss murmura, e se aninha ao meu corpo. – Só espero que Prim esteja a salvo.

Em meio ao barulho da chuva e do mar, consigo escutar um ruído diferente, distante. Gale parece escutar também, e logo se levanta.

- Estão ouvindo isso? – Ele pergunta.

Katniss assente mas não tem forças para se levantar. Então Gale começa a andar tentando encontrar o que causa o barulho e logo some de vista.

- Peeta... Obrigado por todos esses anos ter me feito tão feliz... – Katniss diz, as palavras saem fracas demais...

Sei que isso é uma despedida. Sei que nenhum de nós aguentara muito mais tempo se não formos resgatados. Engulo o nó em minha garganta, e com o resquício de força que consigo juntar, abraço Katniss. Nossos lábios rachados se juntam, num beijo doloroso. Por mim, eu não pararia de beijar seus lábios, morreria assim, aqui e agora. Mas esse meu desejo é interrompido por um grito. Subitamente Katniss se levanta, e cambaleando começa a correr as cegas em direção ao grito.

- Prim! – Ela grita roucamente o mais alto que consegue.

- Eu não vou te fazer mal – escuto Gale gritar.

Eu mal posso acreditar. Meu coração paralisa. Se eu pudesse sairia correndo também, mas me limito a ficar encostado na pedra, sentindo todo o meu corpo tremer. E dessa vez não é pelo frio, a sede, a fome, nem a dor dos ferimentos.

- Mamãe? Mamãe?

Mesmo soando distante, consigo escutar o choro de Katniss. Sorrindo, eu sinto as lagrimas quentes escorrendo em meu rosto ferido. O barulho de algo sendo arrastado se aproxima, e logo vejo gale, arrastando uma espécie de tabua, com Johanna, aparentemente desacordada em cima, e atrás dele, Katniss, com Prim em seus braços.

- Filha – eu murmuro, e observo com um amor tão grande que chega a doer, seu rostinho se virando para mim, seus olhos azuis já cheios de lágrimas marejando ainda mais, e seu sorriso transbordando de amor. Ela então desce do colo de Katniss e corre de braços abertos para mim. Enterro meu rosto em seus cabelos, e fico imóvel, abraçado a minha pequena Prim. Sinto Katniss se ajoelhando ao meu lado, enquanto nos abraça também.

-Eu fiquei com tanto medo de te perder, papai – Prim soluça, enquanto passa suas mãozinhas cheias de cortes, pelo meu rosto.

- Blah, que cena mais linda, vou vomitar – a voz de Johanna nos alcança, e eu me viro e a vejo apoiada em Gale, extremamente pálida, mas com um sorriso no rosto acompanhado por suas lágrimas.

E no momento, eu apenas sei de uma coisa. Nós temos que sair daqui.

Nas horas seguintes que se passam, Prim e Johanna se alternam contado sobre os acontecimentos... Elas foram levadas pelas ondas até a costa do mar, onde vários destroços foram levados também. Prim achou alguma comida mas Johanna se recusou a comer, deixando tudo para minha filha, que depois descobriu que Johanna estava com um ferimento na barriga, enorme, e já havia perdido sangue demais. Quando Johanna não conseguiu mais permanecer acordada, Prim improvisou com uma tabua e uma corda que achou nos destroços, algo para que pudesse sair dali e levar Johanna junto. E ela arrastou Johanna consigo até aqui, no lado oposto onde estavam. Isso explica porque suas mãos estão quase em carne viva. A cada relato, meu coração se enchia mais de orgulho. E eu podia ver isso refletido nos olhos de todos. Mas minha mente trabalhava sem parar, pensando num modo de sair daqui. A tempestade diminuiu um pouco, mas ainda nos castigava com o frio. Gale olhava fixo para o mar, com uma expressão sombria, e depois de fitar Prim por um longo tempo, pigarreou e soltou a frase que nós queríamos tanto ouvir de alguém.

Depois da esperança - Peeta MellarkOnde histórias criam vida. Descubra agora