Capítulo 11

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     Era sábado então tive um ótimo dia de sono. Meu pai provavelmente sabia que eu saía de madrugada, pois os Nefilins tem uma audição um tanto que boa. Eram exatamente 19hrs quando meu pai me acordou, pedindo que eu vestisse uma roupa escura pois ele, Michel e eu faríamos um passeio. Logo a conversa com Kush me lembrou de que hoje teria o tal "juramento".

     Tomei um banho quente e me vesti com calça jeans escura, uma regata branca com uma estampa meio maori em desenho de lobo - o que achei um pouco irônico - botinhas marrom e uma jaqueta de couro preta. Deixei meus cabelos - agora já longos e meio ondulados - soltos. Antes de sair do quarto verifiquei o celular, nele haviam 13 ligações perdidas e 7 mensagens, todas de Emma. Eu havia esquecido completamente de que hoje iriamos treinar. Abri as mensagens:
    * 15:19
Mandy onde você está? Havíamos marcado às 15:00!
   * 16:00
Mandy! Já estou te esperando a UMA HORA. CADÊ VOCÊ?????
   * 16:15
Estou desistindo de você, se não chegar até às 17hrs eu vou embora.
   * 16:20
Mandy é sério, vem, estou te esperando a um tempão.
   * 16:30
Está parecendo que vai chover. Não vai vir mesmo?
   * 16:45
Okay Mandy, se não chegar em 15 minutos eu vou embora!
   * 17:00
...

   Não acredito que me esqueci da Emma. Mando uma mensagem para ela pedindo imensas desculpas mas que agora precisarei sair com meu pai. Guardei o celular no bolso e sai do quarto indo de encontro com meu pai e meu irmão que estavam na sala.
     — Divirtam-se meus amores. — Desejou minha mãe dando um pequeno selinho nos lábios de Jeff e beijando minha testa e a de Michel. Saímos em direção ao carro.
     Do lado de fora meu pai agarra meu braço com força e abre minha jaqueta, observando o desenho da regata.
     — Mandy Audrey, vá trocar essa blusa agora. — Ordenou, dando ênfase no "agora".
     — Mas foi você quem me deu ela. Achei que se fossemos dar um divertido passeio, que ao menos ele fosse simbólico. — Respondi desvencilhando suas mãos da minha jaqueta.
     — Você acha mesmo que está indo para um lugar repleto de pessoas que odeiam lobos e sairá sem nenhum comentário? — Perguntou. Parecia que ele estava mais preocupado com a reputação que deve ter conquistado com aqueles outros Neflins do que comigo. Eu só queria que este maldito dia acabasse logo.
     — Olha pai, nós odiamos os lobos. Essa regata mostra que eles são tão insignificantes quanto uma roupa velha. — Eu disse, sentindo o bile subir na minha boca. Retiro tudo o que disse. Gritei na minha mente. Ele pareceu satisfeito, quase até orgulhoso e deu a volta no civic fora de linha cinza, entrando no banco do motorista. Michel foi atrás e eu no lado do carona.

     Ficamos na estrada ao que se pareceram horas até chegarmos a uma parte do estado que se parecia mais um deserto. Nada de verde ou sinais de civilização estavam à vista, apenas a grama queimada pelo sol e a terra avermelhada que castigava os pneus. Ao seguirmos mais alguns minutos pela estrada de terra silenciosa uma luz branca me chamou a atenção a alguns metros. Me parecia um enorme celeiro por causa da cor avermelhada da luz, mas chegando mais perto vi que era um grande barracão, com paredes cinza altas e teto enferrujado. Castigado pelo tempo. Paramos o carro onde vários outros estavam.

     Jeff foi o primeiro a sair, depois eu e Michel saímos juntos. Meu pai seguiu na frente, Michel ao seu lado e eu um pouco atrás. O frio e o nervosismo me faziam tremer. Entramos no barracão barulhento, ele era maior do que eu havia visto por fora, com dois andares. O andar de cima mais parecia um "camarote", pois era apenas uma espécie de corredor em volta da estrutura, o meio era oco. Ambos os andares estavam cheios, com pessoas de idades variadas entre 7 e 50 anos, homens e mulheres fortes e altos. Alguns passavam dos dois metros de altura.

     Não encontrei ninguém conhecido por ali, nem mesmo Kush. Por isso tentei ficar o mais perto possível do homem que me trouxe até aqui.
     — Fiquem aqui crianças. — Jeff fez com que eu e Michel ficassemos lado a lado, olhando para um pequeno "palco" improvisado que ficava contra a entrada do lugar. Aos poucos as pessoas ali foram parando de falar e em poucos segundos o silêncio era absoluto. Pude ouvir apenas passos na minha lateral direita, parecia ser apenas uma pessoa. Quando ele entrou em meu campo de visão minha vista ficou turva, me desequilibrando um pouco. Michel segurou minha mão o que me fez recobrar a concentração. Foquei-me no homem que acabara de chegar. Alto, cabelos grisalhos e um rosto muito familiar.
Era Francis. Ele ganhou espaço no meio do mini palco e encontrou meu olhar espantado, sorrindo em deboche, também me reconhecendo. Travei os dentes de raiva. Ele se lembrava de mim.

     Ele levantou a mão direita, como se desse uma bênção ao povo presente e vi meu pai se ajoelhando, em direção à Francis. A minha volta todos se ajoelharam, inclusive Michel. Me mantive em pé, não o obedeceria, muito menos me ajoelharia, venerando-o. Seu sorriso pareceu duro quando me viu ainda de pé. Jeff me repreendia com o olhar, mas eu não ligava. Todos se levantaram novamente e ele começou um discurso patético de como se orgulhava em ser Nefilin.
     — Todos, dêem as mãos. — Disse Francis após o longo e chato discurso. Meu pai prontamente ficou ao lado direito do homem grisalho. — Repitam essas palavras comigo: Eu juro.
     — Eu juro... — Todos disseram juntos, menos eu. Jeff me lançou um olhar mortal. Me dando medo. — Eu juro. — Eu disse alto e entre dentes, atraindo o olhar de todos.
     — ... Que ficarei aos lado dos meus amigos, família e conhecidos Nefilins, ajudando-os e apoiando-os durante a batalha, dando minha vida pela deles sem hesitação. Eu juro que darei o meu melhor. Eu juro. — Completou Francis, e depois todos repetiram, inclusive eu, mesmo que relutante. Depois de mais algumas palavras não importantes, Francis nos dispensou. Meu pai vinha na minha direção pisando firme, eu engoli em seco. De repente uma mão grande segura meu braço, puxando-me para a multidão. Me senti aliviada, com sorte seria Kush me livrando mais uma vez das broncas do meu pai. Quando me virei para agradecê-lo minhas sobrancelhas se uniram. Nós estávamos do lado de fora do galpão, em uma parte escura do lugar, mas ainda assim conseguiamos ouvir a bagunça de lá de dentro.
     — Te conheço? — Perguntei. Ela sorriu e deu um soco de leve no meu braço.
     — É uma pena, mas não. — Ela disse com sua voz de sino.

Toca do Lobo - Batalha entre Dois MundosOnde histórias criam vida. Descubra agora