Uma semana antes da tempestade.

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A vida, segundo alguns cientistas, começou em uma imensa poça de água fervente envolta por gases e pedra derretida. Foi apenas mais um fenômeno químico aleatório que aconteceu no meio de uma cratera, bem no início de um planeta bem diferente do que existe hoje.

Milhões de anos se passaram até que a vida evoluísse para o que somos hoje. Criaturas de enorme potencial, presas em um momento específico do tempo e no espaço que podia ser vivido plenamente,  e para muitos, ser passível de receber julgamento.

Era isso que acontecia naquele imenso complexo onde, milhares de seres humanos entravam e saiam apressadamente por cada enorme porta de vidro existente. E não eram apenas pessoas, infinitas malas, mochilas e sacolas bem como todo o tipo de pacote eram transportados e acompanhavam filhos e filhas, esposos, mães, irmãos, pais e avós que percorriam apressados cada centímetro daquela construção.

E todos eles, é claro, carregavam consigo uma quantidade enorme de sentimentos que, apesar a não ocupar espaço, eram capazes de influenciar cada passageiro de uma maneira toda especial. Era uma mistura tão potente que qualquer cão perdigueiro identificaria aquele cheiro almíscar como um conjunto de reações formado pelo medo, saudade, apreensão, preocupação e esperança.

Isso acontecia todos os dias ao longo dos anos e para muitas pessoas até podia parecer um processo desorganizado mas, era um sistema bastante eficiente capaz de embarcar milhares de pessoas dentro de toneladas de tecnologia que se disparavam para os céus a vários quilômetros por hora.

Esse era o aeroporto de Congonhas, o segundo mais movimentado em número de passageiros e aeronaves do Brasil, uma estrutura que se localizava na cidade de São Paulo em um bairro a apenas onze quilômetros do centro da cidade, bem acima de um antigo cemitério de trens ferroviários que, anos antes, também movimentara milhares de pessoas e toneladas de sentimentos para todas as direções e lugares.

Um lugar que recebia atualmente todo tipo de pessoa, com todo o tipo de intenção. Entre elas, uma parecia se destacar. Ele era mais magro que a grande maioria e mesmo assim era alto, com um corpo estranho com mais um metro e noventa de altura que parecia deslizar pelas plataformas, quase como se fosse uma aparição.

Suas pernas e pés se moviam é claro, mas toda pessoa que olhasse com atenção poderia perceber que seus membros pareciam um tanto quanto desconjuntados, quase como se estivessem desconectados da superfície.

No entanto, como era típico dos seres humanos, todos estavam apressados e preocupados apenas em cuidar de suas vidas e sentimentos então ninguém, nem mesmo os seguranças do aeroporto pareciam notar sua presença.

Sua roupa lembrava claramente um terno preto antigo com um corte clássico Inglês. Era um modelo mais solto, levemente acinturado com uma calça mais acertada ao corpo sem nenhum acolchoamento nos ombros, daqueles que apresentam lapelas finas, bolsos com abas e duas fendas traseiras que originalmente foram criadas por influência de uma época que era comum andar à cavalo.

Mesmo com essa vestimenta ele ainda era muito estranho pois, seus braços e pernas eram longos e finos e terminavam em grandes mãos e pés de aparência forte e calejada. Além disso, sua cabeça era pouco maior na altura da testa e seus cabelos negros e finos caiam displicentemente, quase como se fossem fios de plástico que estivessem ali sem nenhuma preocupação em esconder o seu princípio de calvície avançada.

Sua boca pequena e seu nariz quase inexistente abriam caminho para olhos grandes e vidrados que aparentemente, nunca piscavam enquanto ele percorria o andar superior do aeroporto e observava todas as pessoas abaixo. Quando chegou no meio de uma plataforma ele parou, se aproximou do corrimão e olhando para baixo, soltou a respiração, expelindo uma pequena nuvem de vapor de uma temperatura bem diferente daquela que o ar condicionado distribuía para todo o prédio.

Às vezes ele olhava para cima como se escutasse algo e depois percorria os olhos lentamente para baixo, observando mais uma vez todas aquelas pessoas que corriam apressadas, formando uma massa imensa de seres que se organizavam e agiam da mesma maneira que formigas e cupins.

Mais uma vez ele respirou fundo e de uma forma um tanto quanto aborrecida, se agachou ao ponto de encostar o queixo e a pequena boca sob o corrimão, apenas para revelar uma série de pequenos dentes impecáveis e afiados, muito parecidos com os dentes encontrados em um tubarão.

Se alguém conseguisse tirar uma foto daquele momento, ele não registraria um homem e a imagem mais se assemelharia com a de um morcego vampiro gigante. Um morcego que observava todos os cantos daquele aeroporto da mesma maneira que fizera com seus arredores usando alguns sentidos e tecnologias que muitos não saberiam explicar.

Em mais de um momento a sua presença foi gravada pelos sistemas de segurança, no entanto, as imagens registradas iriam mostrar apenas um borrão distorcido, algo que foi provavelmente causado por alguma estranha interferência eletromagnética que durou exatamente os minutos em que ele passou pelo aeroporto.

Quando terminou de observar os detalhes que precisava ele se esticou, arrumou o terno de maneira impecável e respirou profundamente uma terceira vez. Agora ele parecia um pouco mais satisfeito uma vez que os cálculos e a dispersão da onda estava dentro dos parâmetros desejados.

Seus cabelos ralos pareciam colados na sua cabeça e não se mexeram um único centímetro quando ele terminou de ajeitar a gravata e o lenço vermelho. Então, sem olhar para os lados, ele se afastou como se nada no mundo pudesse detê-lo.

Logo depois disso que o estranho fenômeno aconteceu.

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NOTA DO AUTOR: Quero desejar a todos uma boa leitura e comentar que fico no aguardo de seus comentários e opiniões. Se gostarem, não se esqueçam de deixar seu voto e indicar para seus amigos. ;)

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