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um: nostalgia.

Nostálgico. Sóbrio. Melancólico. Vagamente entediado. Talvez fossem as palavras mais adequadas para descrever o meu estado de espírito peculiar enquanto encarava o extenso prédio. Perante a entrada temida durante toda a minha adolescência enfrentava agora a minha presença nos seus vinte e poucos em frente aos portões de metal da escola secundária. Aparentemente tudo parecia o mesmo. Os candeeiros que transmitiam uma luz débil continuavam a ser as únicas fontes de luz na avenida desocupada, juntamente com o enorme letreiro de tonalidade alaranjada sobre o relógio do espaço escolar.

Encostado à mota na qual classificara como um objeto precioso (o meu exclusivo meio de transporte e a verdadeira escapatória durante situações extremas), relembrava-me dos dias fatigados e incoerentes que presenciara em Veneza. Até mesmo o orvalho que caía durante as noites gélidas permanecia na cidade repleta de histórias por decifrar. Relembrava-me das tardes em que jogava os dérbis contra a escola adversária, convicto que todos os meus treinos no quintal casa comum em que vivia eram o suficiente para vencer a equipa que mais tarde, se tornara o meu lar. A cidade, que provou que ao completar dezoito anos e tendo finalmente o acesso legal aos cigarros, estes não funcionavam como antigamente. Porém, havia algo inegável; Estava de regresso.

Posiciono o capacete preto novamente no meu antebraço, rendido às sensações nostálgicas que percorriam a minha mente. Arqueio uma sobrancelha ao notar numa luz repentina, seguido com um barulho das folhas secas a serem calcadas. Rodo os calcanhares de modo a identificar de onde provinha o barulho, deparando-me com uma figura esbelta segurando firmemente uma câmara fotográfica amadora. Sem pronunciar uma única palavra, a jovem rapariga pouco – ou nada – incomodada com a minha presença, verifica a fotografia que captara a minha atenção.

– Desculpe, a minha mota não esta para venda. – declaro, desconfiando com o possível conteúdo retirado da sua máquina.

– Descontraí. – a morena segura no gorro que cobria os seus longos cabelos escuros, num tom de voz melodioso. – Quem sabe, um dia irás recordar este momento e saber o porquê de ter acontecido.

– O quê? – inquiro, obtendo um afastamento da rapariga misteriosa entre a florestação do recinto escolar.

Nós estávamos fora de tempo. Em geral, na verdade.


Overtime · cthOnde histórias criam vida. Descubra agora