— Tudo começou quando ela tinha dois anos. Ela era tão pequena, eu tinha medo de que aconteceria algo e então quebraria. E ela quebrou...
"Meu maior arrependimento foi não ter percebido antes. Parado antes.
À noite sua tosse ficava intensa. Gripe, era o que os médicos desinteressados diziam. Então, nós, pais de primeira viagem e muito inexperientes deixamos passar. Mas sua tosse não passava. Uma tosse seca, horrível. Parecia que a minha pequena estava oca.
Lara ficava com ela no colo para acalmá-la. Mas o cansaço em seu semblante era intenso. Então eu pegava nossa filha para ela poder dormir.
Ficava horas perdido no céu noturno que eram seus olhos em contraste com o sol dos seus fios de cabelo. Ela era linda... Minha pequena... Minha Beth..."
— Pai, não precisa...
— Não, eu preciso te contar minha filha. Por favor... — Seus olhos marejados e voz embargada me lembra nossas aventuras e como ele ficava exatamente assim.
"Nós não sabíamos o que ela tinha. Beth não conseguia correr com as outras crianças. Sempre ficava ofegante demais... Rápido demais... Sua mãe me olhava com dor e preocupação. Eu não sabia o que fazer. Estava prejudicando minha família e não sabia."
— Cigarro... — Papai cospe a palavra, com repulsa, como se estivesse falando de um assasino ou algo do gênero.
"Aquela noite deixamos nossa filha dormindo e fomos jantar. Já era madrugada e a casa estava silenciosa. Só nossas vozes cochichadas pairavam no ar.
Estávamos muito felizes. Fazia um mês que Beth não tossia. Um mês de alívio, pensamos. Mas mal sabíamos..."
— Pai... — Parece que estamos revivendo o passado, a sua tristeza e arrependimento são tão intensos que parecem palpáveis.
— Já está acabando..
"A partir daí tudo aconteceu muito rápido. Muito desesperadamente. Quando acabamos o jantar eu fui passar no quarto dela para dar um beijo. Mas ao chegar no berço vi minha filha com lábios roxos. Seus olhinhos se arregalaram enquanto balançava as mãozinhas em busca de ar.
A boquinha aberta não emitia som, mas tentava sugar um pouco de vida de volta aos pulmões. Eu fiquei horrorizado.
Minha filha estava morrendo. E eu estava parado olhando, sem reação.
'LARA!CHAME A AMBULÂNCIA!' gritei desesperadamente. Mas ela não o fez. Veio caminhando tranquila ver o que estava acontecendo. Achou que eu estava brincando.
Ela entrou no quarto e seu sorriso se desfez. Me viu com Beth no colo. Tentando alguma coisa. Qualquer coisa. E ela saiu correndo para chamar a ambulância.Enquanto eu tentava forçar o ar de volta para ela. Tentando devolver sua vida.
Mas seu rostinho, que ficava mais pálido a cada segundo, estava com as veias à mostra. Seu pequeno coração batia forte, porém lento. Tum. Ela fechou os olhos. Tum. Abriu os olhos e me encarou, pedindo socorro. Tum.
Acabou.
Ela desistiu de lutar.
Meus olhos eram cachoeiras. Eu estava consciente dos meus gritos, mas não os ouvia.
Comecei a rolar no chão abraçado com corpinho sem vida. Meu mundo acabou. Imagino que fiquei apenas poucos minutos assim antes de Lara chegar. Mas fora como se eles virassem eternos.
Não escutei nada que sua mãe disse. Só senti quando ela tirou nossa filha dos meus braços. Eu não tinha mais forças para impedir."
— Vocês descobriram a causa?
— Asma... Um ataque de asma. Dá pra acreditar?
— Vocês não tiveram culpa...
— Tivemos sim. Ou melhor, eu tive. O doutor disse que foi o meu cigarro que desencadeou o ataque.
— Eu sinto muito...
Vou abraçá-lo e ele me acolhe, como se precisasse ter certeza que estou viva.
— Depois disso eu nunca mais fumei... Mas já era tarde demais...
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Beth||Conto
Tajemnica / ThrillerTodos nós temos mentiras não é? Me diga o quê faria se descobrisse que tudo não passava de uma grande mentira? Ao completar 20 anos, Beth descobre que ela também tem uma mentira. Porém, ela decide continuar a viver sem contar para ninguém esse segre...