Eu havia finalmente chegado, no correr dessa
perambulação, às prateleiras que contêm livros de
autores vivos — de homens e mulheres, pois há
agora quase tantos livros escritos por mulheres quanto
por homens. Ou, se isso ainda não é exatamente
verdade, se o masculino é ainda o sexo volúvel, é
certamente verdade que as mulheres já não escrevem
apenas romances. Há os livros de Jane Harrison sobre
arqueologia grega; os livros de Vernon Lee sobre
estética; os livros de Gertrude Bell sobre a Pérsia.
Há livros sobre todo tipo de assuntos, que, há uma
geração, nenhuma mulher teria tocado. Há poemas
e peças e crítica; há histórias e biografias, livros de
viagens e livros de erudição e pesquisa; há até algumas
filosofias e livros sobre ciência e economia.
E, embora os romances predominem, é bem possível
que os próprios romances tenham mudado a partir
da associação com livros de outra natureza. A simplicidade
natural, a era épica da produção literária
das mulheres, talvez tenha passado. A leitura e a
crítica talvez lhe tenham ampliado o alcance, aumentado
a sutileza. O impulso para a autobiografia
terá se esgotado. Talvez a mulher esteja começando
a usar a literatura como uma arte, não como
um método de expressão pessoal. Entre esses novos
romances se poderia encontrar a resposta para diversas
dessas indagações.
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Tomei um deles ao acaso. Estava bem no canto
da prateleira; chamava-se A aventura da vida, ou
um título semelhante, de Mary Carmichael, e foi publicado
neste exato mês de outubro. Parece ser seu
primeiro livro, disse a mim mesma, mas é preciso
lê-lo como se fosse o último volume de uma série
bastante longa, em prosseguimento a todos os outros
que andei olhando: os poemas de Lady Winchilsea
e as peças de Aphra Behn e os romances das quatro
grandes romancistas. Pois os livros vêm sempre
numa seqüência, apesar de nosso hábito de julgá-los
separadamente. E devo também considerá-la — essa
mulher desconhecida — como a descendente de todas
aquelas outras mulheres cujas condições de vida
estive examinando e ver o que ela herdou de suas
características e restrições. Assim, com um suspiro
— pois os romances freqüentemente proporcionam
um paliativo, e não um antídoto, fazendo-nos deslizar
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Um teto todo seu
Kurgu OlmayanBaseado em palestras proferidas por Virginia Woolf nas faculdades de Newham e Girton em 1928, o ensaio Um teto todo seu é uma reflexão acerca das condições sociais da mulher e a sua influência na produção literária feminina. A escritora pontua em qu...