Capítulo 4 O Antiquário

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Uma brisa entrava pela janela entreaberta do quarto de Emy. Choveria ainda mais naquela noite de domingo. Jogada na cama, ela podia senti-la em seu rosto, gélida como um sopro de morte. Seu corpo todo tremia, convulsionado em uma crise de choro contida. Ela já derramara lágrimas suficientes por um dia. Não resolveria seus problemas chorando feito um bebê. Precisava ser mais forte para não se deixar ferir por aqueles que, como Julie, acreditavam que seu pai estava morto.

Com a cabeça latejando de tanto pensar na história de Valentini, a menina se levantou. Havia lhe ocorrido uma ideia.

Remexeu na caixa de chapéu até achar a carta do pai. Ela era a prova de que Jordan esperava que Emy o encontrasse, ou descobrisse o que lhe acontecera. Sentou-se diante de sua escrivaninha, com uma folha de papel em branco ao lado da carta e uma caneta firme na mão direita, a menina começou a localizar os erros de ortografia do pai.

"... Certos coisas..." — escreveu Emy na folha em branco — na verdade seria "certas coisas", esse O está sobrando na palavra — disse ela para si mesma enquanto anotava a vogal O no canto da folha.

"... pertindo..." — seria "partindo", mas a letra e está com letra minúscula, o que pode significar que ao invés de o código querer dizer e quer dizer a.

E assim, ajustando os erros ortográficos na ordem em que eles apareciam, a menina foi formando palavras, na altura em que uma tempestade começara a desabar, ela acabara de decifrar o primeiro enigma do pai.

Na folha de papel branco, Emy podia ver as seguintes palavras brilhando a tinta preta:

O ANTIQUÁRIO.

Intrigada com o que aquilo quisesse dizer, ela apenas olhava para as palavras, ouvindo o barulho da chuva açoitar sua janela, tentando se concentrar, pensar, pensar... então, tão rápido como uma descarga elétrica de um raio que contorcia-se do lado de fora, o anagrama fez sentido.

As palavras só podiam significar uma coisa: O velho Antiquário do Sr. Corner, no final da rua, onde ela costumava frequentar com o pai.

— Simples assim? Sempre tão perto — pensava Emy, imaginando os motivos do pai de querer que ela fosse até o antiquário. Já estivera lá tantas vezes com Jordan, conhecia o lugar como se fosse sua própria casa. Não podia pensar em nada de especial que fosse encontrar lá.

Mas a expectativa de encontrar realmente alguma coisa que aguardava por ela existia e tornava-se forte a cada segundo que esperava em seu quarto. E agora? O que faria? Já era noite, estava chovendo torrencialmente, havia discutido com Julie e isso eliminava a possibilidade de contar à mãe o que descobrira e precisava fazer.

Emy sempre fora movida pela curiosidade. Isso a colocava em apuros. Levara-a ir atrás de Lindsay em Damantiham, mas ao mesmo tempo era a sua melhor qualidade, aquela curiosidade absoluta fazia com que a menina arriscasse.

Guardou a carta novamente dentro da caixa de chapéu e parou diante da janela. Colocou a cabeça para fora. Se conseguira pular do teto da garagem até o chão sem quebrar nada, talvez chegasse do lado de fora inteira, se descesse pela escadinha cheia de plantas seria moleza, contanto que aguentasse seu peso. Emy era uma adolescente de estatura franzina, porém, suspeitava de que pudesse fazer os parafusos que a prendiam no muro da casa soltar-se.

Ela resolveu arriscar, segurando-se pelas vigas subiu no peitoril da janela que estava molhado e escorregadio, a escadinha estava bem ao lado e para alcançá-la era só soltar uma das mãos da viga e segurá-la. Ao fazer isso, seu pé escorregou do peitoril e a menina ficou pendurada apenas com uma das mãos na escadinha, que rangeu com seu peso. Com ligeiro desespero, Emy tentou apoiar os pés na escada para começar a descer. A chuva já a deixara ensopada.

O Medalhão Mágico - A Cidade PerdidaOnde histórias criam vida. Descubra agora