Divórcio

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  Tinha saído da escola e a minha mãe guiava o carro calada. Não entendia porquê, ela sempre gostou de fazer conversa comigo nas viagens da minha escola para a nossa casa, especialmente na hora de almoço, para eu não ficar nervosa com as horas e os atrasos. Mas desta vez não. E era hora de almoço. Arrisquei:
  -Mãe, o que se passa? Não falas? ALGUÉM TE ARRANCOU A LÍNGUA?!
  Brinquei, mas não se riu. Olhava para os olhos concentrados na estrada através do espelho retrovisor, mas ela não respondia ao olhar. Deduzi que algo a estivesse a incomodar e entristecer, e muito:
  - Mãe o que se passa?
  Tentei, mas não consegui. Insisti:
  -Mãeeee diz diz diz por favor eu não me vou calar!
  Parámos num semáforo, e ainda calada. Até que disse, com voz amedrontada e embargada:
  -Margaret. Eu e o teu pai vamos divorciar-nos
  Olhei imediatamente para ela. Parei de mexer no iPod. Olhei para ela com uma expressão de choque... E tédio.
  -Outra vez?
  Pois, reação inesperada hein? Haha, eu explico:
  Os meus pais já se tinham  "divorciado" há um ano, mas nem chegaram a assinar papéis, porque passada uma semana voltaram atrás na decisão. Porque mudámos de casa. E porque os meus avós achavam que era uma péssima imagem para a família. E porque eu e o meu irmão sofremos. Apenas porque eles tinham decidido separar-se na antiga casa, e essa... Bom. Essa tinha umas belas memórias. Memórias mórbidas, e memórias que simplesmente me matavam e desfaziam-me em lágrimas de saudades todas as noites pouco antes de mudar de casa. Em novembro do ano passado mudámos de casa. Em setembro os meus pais anunciaram o divórcio. Mas a questão foi o mês de tristeza em que chorava todas as noites em silêncio para que os meus pais não ficassem com remorsos e pudessem seguir com a vida deles. E não sou uma vítima. Não. A sério que não. Acho estúpido um casal continuar junto se não se amam e se fazem mal um ao outro. E eu não queria ver os meus pais recuarem e voltar à infelicidade. Mas foi isso mesmo que aconteceu. E mudámos de casa, foi espetacular. A nova casa tinha jardim, o meu quarto foi pintado, renovei a mobília. Se há coisa que detesto é arrastar-me pelos cantos a lamentar. Mudei de casa? Ótimo! Decoro a nova casa como sempre quis!
Mas passando à frente... A minha mãe fez um sorriso amarelo:
-Nós mais logo falamos sobre isso.
-Eu sei porque é que vocês se vão divorciar. E apoio isso, mãe. Até fico feliz: duas casas, dois quartos... Hehe
Ela olhou para mim. Sorriu e disse-me que ficava feliz por saber que eu me sentia assim.
E como é que eu sabia a causa do divórcio? Simples. Na noite passada eles estiveram duas horas a discutir sobre dinheiros, e eu tinha na minha mente "eles vão divorciar-se". Dito e feito. Como disse, o mal deste ano era o facto de tudo ser definitivo.
O resto do dia foi triste, o meu irmão estava triste porque tinha vivenciado mais coisas do que eu, também estava a passar por uma fase má, enfim, decidi ficar a ver séries de televisão o dia inteiro...
No dia seguinte, dia 27 de setembro, disse a Kim, a minha melhor amiga a notícia:
-Os meus pais vão-se separar.
Kim entalou-se com o sumo de maçã que estava a beber, parou no meio do refeitório:
-O QUÊ?!
-Yah, as coisas estavam péssimas e pronto, vão divorciar-se.
Kim riu-se e aproximou-se.
-E dizes isso assim? Se os meus pais se separassem, eu matava-me.
Ri-me, sempre adorei a maneira exagerada de Kim, em tudo. E da maneira como ela me fazia rir nas piores situações.
Continuámos a caminhar....
-Hum, vais àquela viagem a Dinamarca que a escola organizou?
-Se tu fores, eu vou.
Sorri.
-Então vamos.
E saímos para o recreio, repleto de gente, com o sol invernal a bater nas nossas cabeças e os olhos dos professores bem em cima de nós. Sim, porque eu e Kim somos conhecidas por arranjarmos confusão em todo o lado. Não em questão de conflito, mas sim em questões de disparates que fazemos.
Resumindo... Eu tenho a certeza que as coisas se resolvem. A minha família dá apoio à minha mãe, eu também, o meu pai também recebe apoio familiar... Vai ser espetacular.

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