16- Ciúmes

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Quando eu achava que ia enlouquecer de tédio naquele quarto de hospital - mesmo que a companhia do Henrique não fosse nada tediosa - eis que surge uma boa notícia.

Por que eu queria tanto me livrar daquele hospital? tirando o óbvio, eu queria sair e ver pessoas e lembrar de pessoas... E quem eu estou querendo enganar? Eu queria lembrar de tudo relacionado à ele.

Fico pensando se eu era tão viciado naquele garoto antes, se ele não saia dos meus pensamentos dessa forma, se eu me sentia tão seguro ao seu lado antes, apesar de saber que eu era o idiota da relação.

Sinto-me culpado quando exijo a sua presença em cada mínimo detalhe e ele me encara surpreso. Henrique ainda é inseguro -  talvez ele tenha medo de eu lembrar como era ser homofóbico e que volte a agir assim novamente eu nunca disse à ele, mas se eu lembrasse de tudo eu só ia sentir vergonha da pessoa que eu era, dos princípios tortos que me faziam ser tão imbecil.

Mas enfim, como eu disse, quando eu achava que o tédio daquelas paredes cor de picolé de chuchu iria me levar a óbito eis que surge o médico.

O meu tédio não passou por ele ser um gato, porque honestamente, ele era, mas porque ele me disse que eu estava liberado.

fiquei feliz, mas logo depois ele fodeu comigo ao me lançar uma piscadinha atrevida.

Esse cara, ele tinha sorte, diria que uma sorte filha da puta, porque se ele piscasse desse jeito para mim antes de eu assumir para mim mesmo que eu tinha muito interesse pelo mesmo sexo, ele certamente iria ter uma fratura gravíssima, mas não, hoje tudo o que ele recebeu foi um olhar abismado da minha parte e um mortífero do Henrique, que virou a cara e fez bico.

Pelo visto o meu namorado atencioso e lindo, era ciumento também, e apesar de querer que a sua atenção em relação à mim não tivesse mudado, eu senti uma coceira imaginária de felicidade e satisfação dentro do peito e sorri sem me conter. O aborrecimento do meu namorado teria passado bem mais rápido se ele não estivesse visto o meu sorrisinho contente. Meu contentamento se devia ao fato do Henrique ter sentimentos de posse direcionado a mim, é claro, mas não sei se isso foi o que ele pensou.

Por culpa daquela piscadinha,  Henrique passou a arrumar as minhas roupas na mala em silêncio e evitava me olhar a todo custo. Quando todas as nossas coisas estavam guardadas na maleta que a minha irmã trouxe, ele ligou para ela, provavelmente para avisar.

Eu sabia que não deveria ter olhado para o médico bonito de forma tão surpresa, não foi por mal, eu não queria namorá-lo nem nada, eu só achei ele bonito, e agora a merda estava feita porque ele disse à minha irmã que iria me deixar no meu apartamento e depois iria para a casa dele arrumar o quarto e explicar tudo para seus pais.

Ele iria me abandonar para arrumar o quarto?  Eu ia ser trocado por uma simples limpeza? Por que o meu médico não podia ser a porra de um senhor de idade?

Eu o deixei falar no telefone, peguei as muletas e tentei me levantar sozinho, mas é claro, não deu certo.

- Espera um minuto, Diana, o Vinícius está aprontando das dele! - Eu não gostei do comentário, mas aceitei a ajuda para me estabilizar e ele me conseguiu uma cadeira de rodas, o que eu achei uma exagero, mas eu não falei nada.

Seu cuidado e atenção voltou quando ele me ajudou a subir no carro que eu acredito ser dele, mas ele ainda parecia chateado e o clima ainda estava tenso.

Seguimos para o que eu acredito ser o meu apartamento e ele parecia concentrado na estrada, ele dirigia com um cuidado excessivo e um tanto anormal, porque um motorista gritou "marcha lenta" e buzinou, ele nada respondeu.

Dirigir lentamente em São Paulo não era recomendável por culpa desses apressadinhos. Mas eu fiquei mesmo foi indignado com a atitude do cara da buzina, o meu namorado estava na velocidade exigida pelo rodovia, e, porra, eu não gostei de ver alguém gritando com ele.

- Passa por cima! - Eu disse puto da vida para o cara que saiu costurando tudo.

- Eu não costumo ser tão cauteloso assim, mas é que, eu não quero pensar em você se machucando de novo, sabe? O acidente... - Ele disse me olhando rapidamente e eu entendi.

- Tudo bem - sorri.

O resto da viagem foi silenciosa e quando chegamos o porteiro me olhou surpreso e disse solícito: "Se precisar de qualquer ajuda, seu Vinícius, é só ligar na portaria", eu agradeci sem saber o nome do senhor simpático.

No elevador eu queria segurar a mão do Henrique, mas as muletas que eu usava quando deixamos a cadeira de rodas no hospital, me impediu.

Henrique abriu a porta do apartamento e mais lembranças de atingiram.

- Lembrei de uma coisa - eu avisei e ele me olhou em expectativa - a gente tinha brigado, era algo sobre um jogo, eu acho, você foi embora e eu fiquei no sofá olhando para a porta por horas. Foi isso mesmo?
Ele me olhava sorrindo e assentia rápido, confirmando que a lembrança era mesmo correta.

- A gente brigava muito? - Perguntei apesar de ter ideia da resposta.

- Sim, talvez a gente gostasse demais do lema "sexo para fazer as pazes".- Respondeu.

- É disso que a gente precisa agora - Pisquei tentando mudar o clima.

- A gente não está brigado, Viny - ele pareceu assustado com essa possibilidade.

- Não?

- Não, eu estou um pouco chateado porque você era bem pegador antes e agora o número de pessoas interessadas em você aumentou consideravelmente. Tenho medo que... você sabe. - Henrique encarava as próprias mãos ao falar.

- Namorado, as pessoas sempre vão se interessar por mim, é natural, sou gostoso pra caralho, sabe? Mas eu estou contigo cara, não importa o que eu era antes, porque eu sou seu agora! - Disse eu com sinceridade e ele me beijou, o seu beijo era muito excitante e ele me segurava firme, até porque as muletas caíram no chão e a minha perna boa estava um pouco afetada com o beijo. Henrique me encarou e disse:

- Agora vou deixar você ser novamente o ciumento da relação!

- Quem, eu? - Brinquei sorrindo torto.

De alguma forma eu sabia disso, sabia que se aquele médico piscasse daquele jeito para ele, porra, eu faria ele engolir aquelas muletas pela bunda.

Um Hétero Quase ConvictoOnde histórias criam vida. Descubra agora