Capítulo 1

637 87 106
                                    

☀ Junho, 2012


"Essa foi a única forma que encontrei para desabafar, desabafar sobre tudo..." meus dedos rasparam na folha amarelo-areia, enquanto minha voz dá voz as palavras dela.

Algumas poucas palavras são borrões manchados em sua tinta vermelha, como sangue, mas eu continuo as lendo em voz alta, débil.

Não sei o que é viver, não mais. Tudo o que faço é uma mentira, e apenas para tentar me livrar...

Meu pai, a única pessoa capaz de me ajudar, se fora, na verdade ele é o culpado por isso, o destino dele foi o culpado por tudo isso!

Mamãe está mais devastada que eu, vivendo em seu mundo paralelo de dor e sofrimento.

Tudo o que me resta são essas folhas e a pouca vontade que tenho de recomeçar.

Tudo começou em setembro do ano passado. As brigas obrigavam-no a sair mais cedo para trabalhar, papai quase não dormia nas noites em que estava em casa e um caminhoneiro necessita dessas preciosas horas de sono.

Aquele dia ele saiu as quatro e quinze da manhã, os olhos apertados por conta da noite mal dormida, as mesmas botas negras, um grande copo de café preso entre seus dedos, ainda mastigando seu sanduíche de peito de peru, sem cascas...

— Volte pra cama, querida. O sol ainda nem apareceu — sorriu, aquele mesmo sorriso de sempre, curvado meio para cima, meio para baixo. — Vai logo menina, eu vou ficar bem, só precisamos de um tempo. Tudo vai melhorar, eu prometo.

Não acreditei em nenhuma de suas palavras e me mantive parada, olhando-o afastar-se um passo a cada segundo.

— Eu te amo, querida. Agora feche a porta, anda, sim? Você precisa dormir!

— Tome cuidado na estrada, fique de olho nas placas, nos carros...

— Quer me ensinar a dirigir? Eu sei o que faço — piscou e entrou em sua cabine batendo a porta atrás de si.

Disseram-nos que o caminhão rolou algumas vezes na estrada antes de bater no rochedo e começar a queimar.

Eu o avisei para não sair.

Ele não me ouviu.

Ele não me ouviu e isso o matou.

Mamãe ainda se culpa por tudo, se alto flagelando, pensando em mata-se, em jogar-se de pontes e poços...

— A culpa é minha, eu fiz isso com ele, eu o matei — ela elevou o garfo que usava para revirar a carne na frigideira, apontando para as paredes, para as fotografias dele coladas na parede parda.

— Não foi você mãe — ergui-me do banco frente ao balcão para andar até ela e segurá-la pelos ombros. Mamãe se virou para mim, os olhos cheiros de lágrimas, o rosto vermelho. — Eu pedi para ele não ir... O que podemos fazer?

— Eu deveria...

— Shhh, continua cozinhando, tá bom? Ou não comeremos hoje — entreguei meu melhor sorriso e ela enxugou suas lágrimas com a ponta quente de seus dedos.”

Enxuguei a lágrima intrusa que rolou sobre minha bochecha, e fechei meus olhos sobre a página, suplicando interinamente para haver algo melhor, algo que me traga a verdadeira Lis cheia de si, não a menina frágil e os problemas sobre os quais ela nunca me disse estar passando. Mas, infelizmente, nada me convenceu:

Ela ainda chora a noite, ainda chama por seu nome quando sua tristeza está em ponto de ebulição. Já eu, bem, eu resolvi não segurar essa bolha escura.

Eu sei que precisava de mim como nunca precisou de ninguém, ela ainda precisa de mim todos os dias, todas as noites, para ser a âncora que não a deixará cair, mas eu resolvi sair, correr, dançar, cantar... Resolvi tentar mudar minha vida de algum jeito. É, eu consegui, e cabei por me tornar um fantasma  naquela casa e na vida de quem antes fazia parte da minha. Mas minha mente sempre esteve lá, junto a ela, suplicando para que suas lágrimas parassem de cair, suplicando para ele voltar.

Infelismente eu não tenho esse poder.

Suas lágrimas ainda caem.

Ele nunca voltará”.

________   ✳  ✳  ✳   ________

É, a vida de nossa protagonista não foi fácil. Mas ela nos disse que tentou mudar, não foi?
Continue acompanhado e descubra como ela se saiu, hehe :)

Abrigada pelos comentários e votos, me desculpem pela demora. Como alguns de vocês sabem, eu ainda estava concluíndo uma fic.

Mas, ela acabou :'( já deu saudades ❤

Enfim... Não vou chorar mais hehe

Ah, lembrando, nossos capítulos serão bem irregulares; alguns microscópios, outros enormes conforme a intensidade da coisa hehe

Beijocas de algodão doce (^o^)

Até... ✈

PreviouslyOnde histórias criam vida. Descubra agora