IV. Epílogo (Parte II)

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Quando Zhang adentrou o quarto de número 09, pôde ver a cobaia de número 10 dormindo profundamente em sua cama. Um dos efeitos primários do soro do esquecimento: o sono profundo induzido. O prédio poderia desabar, que a doce menina continuaria dormindo como um bebê. Prazer tomou conta do seu rosto por segundos, antes de focar no seu objetivo: dia 09 de abril de 2016, mais uma aplicação do soro do esquecimento na sua querida 09. Zhang deu uma olhada na cama de 09, logo percebendo que a mesma estava vazia.

- Onde diabos...? - Distraído, o sexagenário doutor acabou sendo imobilizado por trás por uma raivosa 09, que só esperava por um descuido para dar o bote. O golpe perfeito. Naquele momento ela queria gargalhar, mas precisava de cuidado com a serpente escorregadia com a qual estava lidando. Apertou um pouco mais forte o pescoço de Zhang, só pela diversão de vê-lo encurralado, enquanto tentava, miseravelmente, escapar de suas garras.

A sede de vingança podia ser vista nos grandes olhos azuis da ruiva, em contraste com a seriedade de Zhang. O predador, o sádico, o algoz, simplesmente não sabia como agir. Um dia da caça, outro do caçador.

- Por que tão sério, logo agora? Você me disse, há muitos anos, que era prazeroso me adestrar, porque o gostinho da vitória ao ver minha rendição no final seria maior. Parece que o grande Zhang não é tão poderoso assim. - 09 gargalhou, seus olhos azuis tingidos de sangue. - E seu tão idolatrado soro do esquecimento, o qual você perdeu metade da vida criando, veja só... tem prazo de validade. - A paciente empurrou o doutor, que se viu encurralado no pequeno espaço entre as prateleiras - Três meses, Doutor Malvadeza. Até a validade de uma maionese dura mais que o seu soro.

- Sua vadia! Você foi meu cãozinho adestrado por vinte anos. Não foram apenas três meses, foram vinte anos da sua vidinha medíocre. Tornei sua vida um inferno por duas décadas, e nada me impede de continuar por mais duas.

- Olha o que eu tenho aqui, querido doutor. - O sarcasmo na voz da ruiva era palpável. - Diga "oi" para o meu pequeno amigo. O que acha de provar do seu próprio veneno? - 09 sacudia a seringa, que transbordava do líquido do qual ela fora refém por tantos anos - Uma furadinha só, prometo que não vai doer. Não quanto eu queria.

- Você não teria coragem.

- Até hoje você não se ligou que as aparências enganam? Prove você do próprio remédio. - 09 injetou o líquido no pescoço de Zhang, que em segundos adormeceu no chão gélido do quarto 09.

Lembranças - HIATUSOnde histórias criam vida. Descubra agora