05 - Terceira Prisão - A Saltadora

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05 - A Terceira Prisão - A Saltadora

Eram quase quatro horas da tarde e a estação de metrô ainda não estava tão cheia. Todos os bancos estavam ocupados e haviam uma ou outra pessoa em pé, esperando. Eu estava sentado ao lado de um casal adolescente bem pegajoso. Céus! Arranjem um quarto! Aumentei o volume da música e já não ouvia mais nenhum som externo. Apenas música e silêncio.

Quando me dei conta, estava em pé, em cima da linha de segurança e observei o trem se aproximando. Minha mão esquerda segurava algo quente e confortável. Intrigado, virei a cabeça para o lado e de fato segurava uma mão que pertencia a uma linda garota de olhos tão negros quanto seus cabelos. Olhos completamente negros. Não fazia ideia de quem era a menina, mas me pareceu correto sorrir e permanecer segurando a mão dela. Ela sorriu de volta e juro que não havia nada mais lindo nesse mundo que o seu sorriso. Seu cabelo fino voava ao vento agora enquanto o trem se aproximava.

A garota deu mais um passo pra frente, a ponta do seu sapato agora saindo da plataforma. Fiz o mesmo. Era o que parecia certo. Já era possível ouvir o rugir do trem iminente e foi aí que eu percebi o que estava acontecendo. A menina começava a dar o próximo passo e eu tentei lutar contra a vontade de fazer o mesmo. Não consegui.

Saltamos.

Ainda de mãos dadas, caímos no trilho e vimos o trem passar sob um ângulo que ninguém jamais pode ver, e sobreviver para contar.

O avião passa por uma leve turbulência e então eu acordei.

- Você dormiu um bom tempo, moço. É estranho te ver assim... - Tina fez um gesto amplo em minha direção que não tive certeza do que quis dizer. - ...teve um, não é? - Mira dormia ao lado dela, no corredor.

- Sim. Mas não foi um grave... - suspirei cansado e encarei a cidade abaixo que se revelava a mim pela janela. Agora, elas me olhavam como se eu fosse feito de vidro e pudesse quebrar ao menor toque da brisa. Elas estavam assustadas, e eu não podia culpá-las. Eu tava me borrando de medo das possibilidades.
Após algum tempo ouço o anúncio oriundo da cabine:

- Atenção senhores passageiros, estamos em aproximação do Aeroporto da Pampulha, Carlos Drummond de Andrade. Em Belo Horizonte fazem 24º... - o comandante seguiu falando coisas das quais eu não me importava em saber. Chegamos!

***

Essa talvez seja uma boa hora para falar sobre um detalhe importante ao meu respeito: eu gosto de estar preparado e de saber das coisas. Nos últimos dias observei mapas, aprendi distâncias, memorizei referências, conheci ruas. Descobri linhas de ônibus e pontos de táxi. Tudo isso para não nos perdermos e nem acabarmos indo parar num lugar ruim por engano. Não ia dar sorte ao meu azar.

Já me considerava um mineiro honorário.

Pegamos um ônibus que agia apenas como conexão entre o aeroporto e a rodoviária, e uma vez no centro, comecei a nos guiar.

- Arrgh! Dá até raiva, nunca veio aqui e age como se morasse a vida toda. - Mira, como sempre feliz da vida com meus sucessos.

- Confia, pai. Sei o que tô fazendo.

- Sei que sabe, mas ainda assim da raiva, eu provavelmente ia vir de taxi desde o aeroporto.

- Você é louca? - cortei.

- Marv, ela só não que admitir que você realmente pode ser útil, só isso...

- Como assim "pode"? - às vezes era um saco lidar com elas, especialmente naqueles dias.

Elas riam e eu me rendia. Sempre assim.

Algum tempo depois fizemos o check-in no hotel onde deixamos a maior parte da nossa bagagem. O show era domingo a noite, o que nos dava todo o fim de semana para conhecer e explorar a cidade. Esse era o primeiro problema: não chegamos a um consenso sobre como investir nosso tempo livre em BH. Tina queria ir a lugares ao ar livre como a Lagoa da Pampulha ou a Serra da Moeda. Mira, como uma boa estudante de humanas, queria conhecer a Feira Hippie, e umas outras três ou quatro feiras, verdade seja dita. E eu, por meu caso de romance com a história, queria ver alguns marcos, museus e praças. Andaria separado numa boa, mas elas insistiam que era melhor brigar o dia todo e achar um meio termo para os três. Além do mais, conhecendo-as como as conheço, se eu soltasse a mão delas, nunca mais as veria. Elas não iam achar o hotel e assim que o celular delas descarregasse de tanto reclamar no twiter, estariam condenadas.

As Doze PrisõesOnde histórias criam vida. Descubra agora