A esquina e o ginásio

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Dobravam a última esquina antes de chegar em casa, e sem motivo algum olharam um para o outro.Estampado naqueles olhares estava toda a angústia que tantos anos de sentimentos reprimidos os fazia sentir.

Sem dizer nada Ângelo estacionou o carro ali mesmo,na esquina de casa.Havia ali um ipê roxo,com poucas flores naquela época do ano,embaixo dele um velho banco de madeira que era parte da decoração da fachada do edifício que havia ali em frente.

Ângelo desceu do carro , foi até a porta dela e a abriu:

-Vem?

-Aqui?

Ele sorriu e estendeu a mão á ela.

Quando crianças eles costumavam sentar ali para comer balas, ou sorvetes que compravam no mercadinho mais próximo.Depois de comer,Ângelo costumava subir no banco pra subir na árvore e lá de cima jogar flores sobre ela.Ou pegava algumas e descia para colocá-las de enfeite no cabelo de Tulipa.

Assim que chegaram ali, Ângelo repetiu o gesto da infância,porém, hoje bem mais alto do que na época conseguia colher mais flores sem ter de subir na árvore.Quando sentou ao lado dela começou á distribuí-las delicadamente em seu cabelo.

Na infância a mãe decidia sobre tudo, das roupas aos cortes de cabelo deles, por isso naquela época apenas Tulipa tinha seu cabelo ornado por flores de ipê.Como hoje em dia os cabelos de Ângelo eram mais longos que os dela, Tulipa não resistiu e começou a pegar algumas flores do colo dele e coloca-las em seus longos cabelos loiros.

Quando as flores acabaram apenas riram um do outro. Ângelo lhe deu um beijo na testa e a puxou para perto dele á envolvendo em um abraço.

-Além do seu cabelo ser melhor do que o meu,as flores também ficam muito mais bonitas nele.- Tulipa brincou.

-Eu não acho!-Ângelo fez uma careta.

Ela o olhou carinhosamente por um segundo e desabafou:

-Isso é tão injusto!

-O que?- os olhos verdes angelicais de Ângelo estavam agora dentro dos profundos olhos castanhos dela.

-Nunca vai existir outra pessoa nesse mundo para mim.

Com certeza Ângelo não esperava uma declaração tão sincera e direta quanto aquela e sua expressão de espanto acabou retratando isso.

Tulipa deu um longo suspiro.

Ângelo deu um sorrisinho encabulado: 

-Acho que entendi.Quer mesmo falar sobre isso?

-Até onde eu sei , PRECISAMOS!

Os dois sabiam que estava mais do que na hora de pôr as cartas na mesa.

-Quem mais pararia o carro no meio da madrugada, apenas pra pôr flores no meu cabelo, me abraçar e  me ouvir?

-Com certeza nenhum dos seus namoradinhos!-Ângelo ironizou. 

Os dois riram um pouco.

Ao lado dela, sentindo seu cheiro, sua respiração e segurando sua mão,Ângelo nem sabia por onde começara aquela conversa.Respirou fundo, tomou coragem e deixou que seu coração falasse.

-Tulipa...somos adultos agora! - Apertou a mão dela de tão nervoso. - Acho que já podemos decidir e parar de fingir um para o outro e ... e para eles também.

Ela sabia exatamente do que ele estava falando e também sentia-se cansada de tanta mentira.

-Papai me disse uma vez, ele me prometeu, que no tempo certo estaria do nosso lado.Acho que esse tempo chegou,acho que essa é a hora de cobrar dele essa promessa.

Tulipa 🌷 Parte I Onde histórias criam vida. Descubra agora