CAPÍTULO 11- CATIVEIRO

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- Acho que no final das contas você não iria devolvê-la de qualquer maneira - Yukineko comentou, assim que Kurama deu uma pausa em sua história.

- Eu ainda estava considerando - ele disse, calmo - Mas torci para que eu vencesse a aposta, confesso.

Yukineko ainda não conseguia imaginar a figura de Kurama Youko agindo daquela forma tão sentimental. Quando eles se conheceram, à muito tempo no Makai, Yukineko lembrava-se do olhar frio e cortante que Kurama tinha. Qualquer coisa além disso era simplesmente inimaginável.

- Fiquei curioso - o nekomata falou, cruzando os braços - Até agora eu pude perceber o que você começava a sentir em relação a ela, mas ainda estou esperando alguma informação que ligue ela a você.

- Bom, só posso contar meu ponto de vista, como já falei - Kurama falou - Mas eu a observava bastante, então acredito que possa saber quando ela também passou a me enxergar com outros olhos, sem a máscara do lendário ladrão Youko em meu rosto para atrapalhar.

"Como eu havia prometido, mandei um grupo de subordinados se encontrarem com os humanos. Eu mesmo teria ido, para falar a verdade, mas parecia mais interessante ficar junto dela do que deixá-la tão precocemente. Quando voltaram, tanto eu quanto ela estávamos com as expectativas altas para saber a resposta.

Não saí de seu lado durante a espera. Não conversamos nada durante isso, eu me limitava a apenas observá-la. Talvez nesses momentos de silêncio e contemplação eu tenha notado que os humanos podem ser muito mais do que uma forma de diversão para youkais como eu. Às vezes eu a surpreendia me encarando, com os olhos ainda desconfiados, porém certos de que eu não a mataria.

Quando ela ouviu que meus homens se aproximavam, voltou a levantar a guarda e enrijeceu a postura, como se pretendesse se mostrar mais forte do que sabia que era.

- Chefe - ouvimos um deles falar, pedindo permissão para entrar em minha tenda.

Ao entrarem, eles a olharam com certa insegurança. Logo se voltaram para mim, que os esperava de pé, próximo a ela.

- Quais são as considerações? - perguntei.

- Falamos com o humano que descreveu - ele contou.

Yume estremeceu ao meu lado, mas apertou firme uma das mãos para se controlar.

- Ele disse que se ela não estiver machucada fará a troca - outro deles disse, logo de uma vez.

Não saberia descrever ao certo a expressão que ela fez. Estava surpresa, porém não desapontada nem preocupada. Eu olhei diretamente para ela, e ela também olhou para mim, sem se preocupar com os youkais que estavam diante de nós.

- Certo - eu disse, sem desviar o olhar dela - Já podem ir, então.

- Mas o que a gente vai fazer, chefe?

- Já vão saber - eu disse, apenas.

Confusos, saíram e nos deixaram a sós novamente. Eu tentava disfarçar, mas um leve sorriso apareceu no canto da minha boca. Eu havia ganhado a aposta e ela não voltaria para casa.

Mas talvez, se ela tivesse tentado me convencer, eu pudesse tê-la deixado ir. Porém ela nem sequer mencionou uma palavra sobre sua liberdade.

- Parece que eu venci nossa aposta, não é? - Eu falei, sentando ao seu lado.

- Parece que sim - ela disse.

- Desapontada?

Ela pegou uma mecha do próprio cabelo e começou a enrolá-la nos dedos, distraída. Seus olhos agora focavam o chão.

- Por que ele me quer de volta? - ela perguntou a si mesma, tão baixinho que se eu não fosse um youkai não teria escutado - Não era pra ele ter tentado me trazer de volta!

- Estava tão certa assim? Que iriam te abandonar?

Ela parecia começar a entender somente naquele momento que não retornaria para junto de sua gente. Eu era egoísta o suficiente para continuar mantendo minha palavra de fazê-la ficar comigo. Ainda mais com ela colaborando tanto para que esse sentimento crescesse em mim.

- Sempre soube que não era talentosa o bastante para ter nascido como uma humana no Makai - ela começou a falar - A única coisa que consigo fazer direito são as barreiras sagradas, mas nunca consegui combater um youkai... ah, você deve saber bem, já que teve uma amostra da minha eficiência em combate.

Seria cômico se ela não estivesse tão abalada. Conforme ela ia dizendo as palavras, sua voz se descontrolava mais e mais.

- Criar barreiras não é fácil - falei, tentando entender se era por esse motivo que os humanos a queriam de volta - Eles a querem porque a acham importante.

- Não sou importante - ela disse, me encarando de novo, finalmente.

- Será, agora que ficará ao meu lado.

Seu rosto ruborizou.

- Vamos levantar acampamento e seguiremos pelo norte, já foi alguma vez para lá?

Ela negou com a cabeça. Eu deveria imaginar que ela não me adoraria de uma hora para outra.

- Quero que me conheça de verdade - disse, me aproximando - Nenhuma pessoa nesse lugar sabe quem realmente sou ou o que realmente penso. E se eu disser que quero que você seja essa pessoa?

- E se eu quiser matá-lo para poder fugir? - ela rebateu, perdendo um pouco mais do controle.

- Eu a veria tentar - respondi, calmo - e depois te dominaria e esperaria seu acesso de raiva passar. Estou acostumado com pessoas tentando me matar o tempo todo, Yume.

Ela ficou sem ter o que dizer.

- Vai conhecer o Makai de uma maneira que jamais poderia estando com os humanos. Terá minha proteção e só precisa aceitar se aliar a mim. Serei inteiramente transparente com você, não farei nenhum tipo de jogo psicológico nem tentarei te enganar... só precisa dizer sim."

Kurama parou de falar, assim que percebeu que o sol já estava nascendo.

- Não acredito que vou ter que fingir ser um gato doméstico por mais um dia - Yukineko reclamou, voltando a forma felina.

- Algum outro dia terminarei minha história - ele disse, ainda com o pensamento distante.

- Acho que consegui algumas pistas - o nekomata parecia ansioso para testar seus poderes na garota agora que sabia um pouco mais sobre ela e sua vida passada.

Olhando-a de onde estavam, Kagome parecia dormir tão tranquilamente quanto fosse possível, já que dessa vez não estavam tentando invadir sua mente atrás de suas memórias.

- Será que é uma boa ideia fazê-la lembrar de tudo isso? - Yukineko perguntou - Imagino que deva ter muito mais depois, mas começar do zero nunca foi uma opção?

Kurama franziu o cenho, ele mesmo já havia feito essa pergunta um milhão de vezes em sua cabeça.

- Existe muito mais depois - ele disse, enfim - Seria injusto saber e ela não, entende? Como se aquela em minha memória nem sequer fosse ela, e isso eu não poderia aceitar.

- No entanto, houve uma grande dúvida quanto a essa questão.

- Não queria vê-la sofrer mais - Kurama disse, encarando Yukineko - Mas devo dar a ela a opção de escolher. Não dei essa opção da última vez.

- Ah, entendo...

- Mantê-la em cativeiro por causa de uma vontade tão egoísta foi meu grande erro. Mesmo que depois ela tenha conseguido me enxergar com outros olhos, sinto que a prendi junto a mim, mesmo quando ela mesma quis ficar ao meu lado.

Kagome começava a dar sinais de que iria acordar, então Yukineko precisava voltar ao seu posto rapidamente.

Ainda observando de longe, Kurama planejava com cuidado os passos que tomaria daqui por diante. Eles se veriam o dia todo, já que em poucas horas estariam na escola.

Ele não podia desistir.

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