Capítulo dois

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Colorado era uma cidade tipicamente calma, pelo menos para mim que mal saía de casa. Localizado no planalto meridional do Rio Grande do Sul, Colorado foi colonizado pela sua maioria italiana e alemã. A verdade era que eu amava morar naquele lugar de poucos habitantes, clima frio na maior parte do ano e tranquilidade para todos os lados. Se você procurar no mapa, talvez encontre um pontinho no meio de centenas de cidades enormes pelo país, mas certamente se você conhecesse Colorado desejaria assim como eu, nunca mais saí daqui.

Já era noite quando, enfim cheguei em casa, esgotada. Não era pelo simples fato de não haver muito o que fazer na biblioteca que eu não sentisse até os fios dos meus cabelos doerem. Queria tomar um banho rápido e dormir, porém minha mãe frustrou os meus planos quando cruzei a porta e a encontrei sentada no sofá com aquele ar de pura satisfação.

— Minha florzinha – Ela me deu aquele abraço que certamente todo filho fica irritado – Como foi o primeiro dia na biblioteca?

Eu revirei os olhos insatisfeita com aquela pergunta enquanto ela me soltava e me encarava.

— Foi legal, mas da próxima vez mãe, me pergunte se eu gosto ou não dá ideia de trabalhar em um lugar como aquele.

Eu virei as costas e caminhei em direção ao meu quarto.

— Você não quer conversar um pouco sobre isso?

Eu nem me dei o trabalho de respondê-la. A porta batendo fortemente foi tudo o que ela conseguiu arrancar de mim pelo resto da noite. O fato era, fazia bastante tempo que eu não dialogava com a minha mãe, desde quando ela começou a namorar o João. Não sei se seria nobre da minha parte chama-lo de padrasto, por que sempre achei que ele não merecia o cargo dado por mim, mas o fato é, o João poderia facilmente ser apenas mais uma pessoa dentro da nossa casa, porém ele decidiu por si só se tornar o meu pior pesadelo. Eu fechei os olhos com muita força quando me lembrei dele. Lembrei que já fazia um bom tempo em que minha mãe mantinha um bom relacionamento com ele. Que tentei ser sua amiga somente para mantermos uma boa convivência, mas que as coisas jamais saíram como eu imaginei, na verdade eu jamais imaginei que coisas como aquela poderiam de fato acontecer comigo.

Tentei mudar o foco dos meus pensamentos para a mais nova descoberta da minha vida, Arthur. Ainda acordada, eu olhava para o teto do meu quarto em meio ao escuro fazendo uma expressão inevitável de alegria ao me lembrar dele. Arthur Bernardo, irmão do prefeito, certamente minha mãe o conhecia e pelo que a Nicole havia dito todas as meninas do Colorado também, exceto eu aqui. Tentei me recordar em que momento da minha vida eu havia deixado escapar aquele homem do raio da minha visão. Realmente eu era uma tola em todos os sentidos. Todo mundo conhecia e falava com todo mundo naquela cidade, porém eu passava despercebida e preferia ser assim em relação ao resto do mundo. Afinal, para que ter amigos? Para que conhecer gente nova? Eu me revirava na cama só de pensar nessas coisas. O fato era, não havia nada de normal em mim em relação ao resto do mundo. Eu era feia, calada e não tinha amigos.

Um dia me apaixonei por um garoto da minha escola quando cursava a quinta série. Foi um amor à primeira vista, assim que o vi senti o meu mundo virar de ponta cabeça. Ele era lindo, moreno e forte, tinha o sorriso mais especial que eu já havia conhecido, porém, eu não passava de mais uma guria qualquer, pirralha e estranha. Ele nunca sequer olhou para mim de um modo especial, me recordo perfeitamente que assim que ele soube do meu suposto interesse, passou a se esquivar como se eu fosse um ser de outro mundo. Talvez essa tenha sido a única época da minha vida em que eu tentei ser mais feminina. Queria me vestir como as outras meninas do colégio, queria ser notada e admirada pela beleza que talvez estivesse escondida em mim, mas não teve jeito, eu continuava sendo a chacota do resto do colégio. Continuava sendo a magricela esquisita, sem amor-próprio, sem amigos e sofrendo por amar um garoto que nem ao menos me percebia. Carreguei aquele amor durante dois longos anos e confesso que não sei bem como ele acabou. Possivelmente tenha acabado quando em uma tarde normal na escola, olhei para ele e não senti minhas pernas estremecerem. Eu não sabia ao certo se tinha tirado a sorte grande em ele nunca ter se interessado por mim de verdade, mas confesso que o modo como encarei isso tempos depois me tornou mais madura do que achei ser um dia. Mas a vida tem dessas coisas loucas, não é mesmo? Pelo menos eu aprendi a controlar mais as minhas emoções, a controlar os meus impulsos, a ser mais quieta e calada, assim ninguém descobriria os meus sentimentos e eu não correria o risco de sofrer novamente, pelo menos até agora, até conhecer o Arthur Bernardo.

Minha Obsessão - Livro 1 COMPLETOOnde histórias criam vida. Descubra agora