Helena
Acabou. Finalmente acabou. A campanha estava pronta, entregue e instalada nos devidos locais escolhidos na reunião de planejamento. Depois dos dias praticamente virados, resolvendo os últimos detalhes e todos os pepinos possíveis, finalmente tínhamos terminado, eu e toda a equipe envolvida. Quando o relógio completou seu minuto, marcando as dezoito horas do dia, eu já estava com minhas coisas arrumadas, ainda que estivesse levando trabalho para casa. Eu tinha noção de que fazer isso seria mais vantajoso do que continuar forçando tempo ali na minha mesa. Minha bolsa pesava mais do que o normal sobre meu ombro, onde eu carregava meu notebook, uma pilha de papéis contratuais da M&D Publisher, e algumas amostras que a gráfica tinha enviado durante a semana. Era sexta-feira e eu precisava descansar.
Quando comecei a trabalhar na agência, eu duvidava que conseguiria crescer ali. Mendes & DiCarmo Publisher era a maior agência publicitária do país. Onde que uma garota recém-formada ia conseguir alguma coisa? Pois é, eu estava bem enganada. Além de ter um plano de crescimento bem legal, os diretores acreditavam nos recém saídos da universidade para manter sempre a empresa atualizada. Foi graças a esse projeto que estou empregada hoje, fazendo o que eu gosto e o que eu sempre quis fazer. Eu paguei minha língua quando recebi aquela ligação, respondendo minha entrevista. Desde então, eu fiz o possível para ajudar a agência crescer, me dedicando aos jobs. Embora o trabalho fosse cansativo e muitas vezes estressante, eu acreditei na agência e os anos só me provaram que eu estava certa nisso. Esse último, por exemplo, no qual eu trabalhei toda a semana, tinha rendido um belo contrato para nós. Enfim, missão cumprida.
O caminho até o condomínio de apartamentos Nova América, onde eu morava, não era lá muito distante, mas resolvi pegar um táxi. Ainda hoje eu me espantava com o tamanho das quadras dentro daquele lugar, assim como sempre me espantei com a sua história. Pra ser sincera, eu achava meio ridículo. Mas como teria espaço para alguém reclamar do prefeito? Ele tinha esse projeto louco, dezesseis prédios, um condomínio a preços acessíveis aos moradores da cidade. Tudo isso nos padrões americanos, como ele costumava dizer. Ele era um apaixonado pela América, e todos sabiam disso, por mais que a cidade já não fosse mais tão pequena assim. É claro que muitos adoraram a ideia, e muitos também foram convencidos pelo financiamento facilitado. Isso tinha sido há pelo menos uns 30 anos. Os prédios ainda estavam lá, intocados e extremamente novaiorquinos. E um desses apartamentos, hoje, era o que eu chamava de lar.
A cidade também era bem icônica. Cercada de praias e grandes prédios pela orla, era difícil não entender como o turismo se tornou o maior meio de sustento da população. Haviam hotéis diversos, dos mais chiques aos menos sofisticados, como os hosteis. Além disso, a cidade foi crescendo, até que se tornou foco de grandes investimentos e hoje tinha um centro comercial razoável, se comparado com as grandes metrópoles. O metrô funcionava, ainda que sempre cheio. E o trânsito nas avenidas centrais, que cortavam a cidade de ponta a ponta, era sempre caótico no horário do rush. Nada muito diferente do que se vê por aí, embora tudo ali tivesse um ar muito calmo e fresco. Por mais estresse que a rotina pudesse causar, era como se os ventos levassem isso pra longe e deixasse todos relaxarem.
O táxi parou na entrada principal do condomínio e eu dei autorização na portaria para que seguisse em frente. Enquanto o carro se dirigia ao longo das ruas internas, indiquei para o motorista onde ele deveria parar. Cacei minha carteira, entregando-o uma nota e saindo do carro sem esperar o troco. Apesar de ainda ser relativamente cedo, estranhei o caminhão de caçamba aberta, de onde alguns homens retiravam caixas grandes e equipamentos eletrônicos que eu desconhecia, e levavam para dentro do prédio. Segui até o elevador, que estava lotado de caixas. O homem que as empilhava dentro do transporte me olhou, se perguntando o que eu fazia parada ali na frente.
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Lá em cima
RomansaHelena está como sempre quis: estabilizada, trabalhando numa agência renomada, com seu próprio apartamento e pensando seriamente em adotar um gato. Quando Miguel, neto de sua antiga e fofa vizinha de 83 anos se muda para o apartamento d...