Eu Confio - Capítulo 15

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"Eu amei e eu amei e perdi você... Eu amei e eu amei e perdi você. E dói como o inferno"

- Fleurie (Hurts like hell)

Gustavo estava dormindo na minha cama, suspirava de leve, os ombros subindo e descendo, os olhos movendo-se sob as pálpebras denunciando que ele estaria sonhando. As olheiras escuras diziam por si só as noites em que ele não tinha dormido.

Gustavo estava destruído, dilacerado por dentro, cada caco dele estava se transformando em pó.

Eu não conseguia imaginar como seria a sensação de ser rejeitado daquela forma, de ser julgado. Claro que eu fora rejeitado pelo meu pai, e a minha mãe me ignorara por anos, mas aquilo pelo qual Gustavo estava passando não tinha nem comparação. Quando ele estacionara seu Jeep mais cedo na minha porta, eu não fazia ideia do quão grave era a situação.

Ele tinha emagrecido uns dois quilos, os olhos estavam vermelhos, os cabelos desgrenhados, e olheiras profundas sob os olhos. Naquele momento eu vi o quanto meu amigo estava completamente destruído.

- Ulysses... – Saltei para trás quando escutei mamãe sussurrar meu nome. – Quando ele acordar peça para ele deixar os documentos separados para que eu possa matriculá-lo na escola.

Balancei a cabeça em concordância.

- Tem comida pronta para vocês dois, esquente no micro-ondas.

Minha mãe saiu da porta e começou a descer os degraus da escada silenciosamente para não acordar Gustavo, ele tinha demorado a dormir e só conseguira dormir por causa dos comprimidos da minha mãe.

Ela tinha me surpreendido ao aceitar Gustavo sem fazer perguntas ou julgá-lo, ela até mesmo tinha repreendido os pais dele pelo ato de expulsar o garoto.

Essa situação toda fizera que ela se esquecesse por um momento de mim e Caleb. Ele também demonstrara compaixão quando eu o contara sobre o acontecido com Gustavo, às vezes eu ainda me surpreendia com a nobreza e gentileza de Caleb, durante o tempo juntos, ele nunca xingara ou levantara a voz. Para ninguém.

Peguei minha mochila de cima da cadeira e desci as escadas em silêncio, parei na cozinha para escrever um bilhete e o deixar colado na geladeira.

"Tome um café da manhã reforçado, não se preocupe com nada, faça o que quiser. Só tome cuidado com a velha que mora em frente, ela gosta de garotos mais novos, se é que me entende"

- U

Margareth era a senhora que morava em frente a nossa casa, ela era um doce de senhora, mas as pessoas a julgavam por ser viúva e namorar caras que tinham a idade para serem netos dela. Para mim ela estava certa, ela tinha que fazer o que quisesse sem se preocupar com o que os outros pensariam sobre ela.

Aquele dia eu resolvera trocar um pouco o skate pela bicicleta, eu chegaria mais rápido a escola, já que eu estava consideravelmente atrasado.

***

Eu tentava prestar atenção no que o professor de História falava, mas cada vez que eu olhava para o lado eu perdia completamente a explicação do professor. Caleb estava quieto como sempre, os dedos percorrendo pela página em braile do livro de História para deficientes visuais.

Cada vez que eu olhava para aquele garoto concentrado em sua carteira, uma vontade imensurável de sentar ao seu lado e passar o braço atrás de seu pescoço me invadia com o peso de uma bala de canhão.

Olhos AzuisOnde histórias criam vida. Descubra agora