* Capa: Diana Montenegro
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O domingo voou.
Acordei somente uma vez de madrugada, com Cassandra chorando.
Depois, apenas às onze.
Cozinhei arroz o suficiente para o almoço, o jantar e o almoço de segunda feira. Cortei os vegetais, fiz mamadeiras, papinhas e passei um pano na kitnet.
Coloquei as meninas no chiqueirinho, de frente para a TV ligada, e deixei os meninos no computador. Lavei o banheiro e o resto das roupinhas que Marina me emprestara. Passei tudo o que pude, embora não tenha sido nem um terço.
Troquei fraudas e alimentei as crianças. Coloquei Andrômeda no andador e assisti, enquanto ela tentava se empurrar pela casa.
Mas, acima de tudo, traduzi. O dia todo, parando somente para trocar fraudas ou dar mamadeiras.
Mandei um e-mail para Omar, avisando que não iria na segunda feira devido à problemas familiares e coloquei as meninas para dormir.
- Eu me lembro desse cofre. - Alex disse, no segundo em que eu o puxei de debaixo do sofá.
- É mesmo? E a senha? Você sabe qual é?
- Acho que começava com zero, dois e terminava com um, mas não lembro o penúltimo. - Ele diz, mas já sei a resposta.
Dois de novembro.
Ah, mamãe.
O dia em que meus pais se casaram.
O cofre se abriu com um clic, revelando documentos, dinheiro, algumas jóias e uma câmera fotográfica.
Aleluia.
As carteiras de identidade dela e dos meninos e duas certidões de nascimento. Nada das meninas.
Mil reais em notas de cinquenta e um colar de ouro, com várias voltas. Brincos e anéis tão caros quanto, cravejados em pedras. Presentes que meu pai deu para ela. Por fim, uma aliança dourada, coberta de brilhantes. A aliança do primeiro casamento.
Por sorte, a câmera ainda tinha bateria, mas mandei Alex para o banho e Heitor para a cama, antes de ligá-la.
As fotos eram as mais surpreendentes possíveis.
Ela na maternidade, segurando um bebê de cabelos castanhos, com Alexandre e Heitor menores, sorrindo ao seu lado.
Algumas fotos com o bebê se intercalando com Alex e Heitor.
De repente, o bebê sumiu das fotos. A câmera terminava em uma foto das gêmeas na maternidade, com os meninos ao lado, como a primeira.
Por isso eles não deram nome para as gêmeas. Estavam com medo de perder outro bebê.
- O nome dela era Penélope. - Alexandre disse, sentado do meu lado.
Eu não o vi chegar. Meu rosto está molhado por que?
- O que aconteceu?
- Ela amanheceu morta um dia, do nada. Mamãe chorou muito. Igual você agora.
Ah sim. São lágrimas.
- Bem. O importante é que isso não vai acontecer com as meninas. Agora é hora de você ir para a cama, vamos.
Dormi com a aliança da minha mãe no meu dedo, quase abraçada com minha própria mão. Eu penhoraria as outras jóias, mas não essa.

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Coraticum
RomanceHelena sempre se considerou uma mulher independente. Sem sua família para lhe dar apoio, ela lutou durante anos para conquistar as poucas coisas que possui. A maior reviravolta de sua vida acontece com um telefonema inesperado em uma manhã qualquer...