Capítulo 1

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          Espanha! Terra do sonho! Sol, flores, músicas, coloridos. Valença! Cidade do Sol, das mulheres, dos amores e da música. Suas ruas estão cobertas pelas lembranças dos tempos e pela poeira dos séculos.

          Agosto, 1812. A cidade em festa e o ruído alegre dos romeiros que demandavam à Praça para o Dia de Graças.

          Carlos caminhava alegre, tinha asas nos pés, música nos lábios, flores no chapéu e alegria no coração.

          Mocidade: tudo muda a seu toque mágico, todas as coisas se embelezam!

          Agosto, 1812. Festa em Valença, vinte anos, juventude, força e beleza. Como não sorrir? Como não brincar com o amor das mulheres ardentes de Andaluzia, como não tanger a guitarra em ritmos loucos? Como?

          Agosto, 1812. Espanha. Valença. Festa. Luz. Praça regurgitanto. Cheiro gostoso das castanhas na brasa, dos biscoitos rosqueados e das brincadeiras ingênuas. O moço galgou a praça sentindo na boca o gosto do viver. O mundo era seu. Ele era o dono de tudo. No meio, as barracas coloridas de San Agustin, no pregão dos leilões o alarido alegre e a fumaça das fogueiras, onde as carnes eram assadas. No centro, as pipas de vinho e os bebedores inveterados contando suas chasqueadas e mitos.

          Carlos queria dançar. O som da guitarra e da música cigana o animava. Vestira a roupa colorida dos moços da rua, longe do palácio escuro dos seus e da disciplina dos parentes. Seus muros pesavam, sua severidade o esmagava. Era verão e havia festa entre o povo. Ele queria estar entre eles. Vestira roupa plebeia. Ninguém o vira sair. Caminhou contente. Dançar! Era isso.

          De passagem, pegou uma caneca de vinho e bebeu deliciado. Até o vinho comum pareceu-lhe infinitamente melhor do que o de sua adega.

          Uma cigana rodopiava entre os pares que dançavam na rua. Mergulhou na música e nos braços dela. Seu corpo jovem e belo parecia ter asas e em seu rosto corado havia satisfação e êxtase. Parecia irreal e distante.

          Carlos a enlaçou, dançaram juntos. Quanto tempo? Uma, duas, três, quatro horas? Até que a noite desceu e se atiraram rindo, exaustos e felizes, ao chão.

          A festa prosseguia, e os lábios da cigana tinham a cor e a frescura dos botões de rosa. A certa altura ele não se conteve, levou-a para um local deserto e, no campo ermo, à luz das estrelas, amaram-se loucamente.

          Depois, olhando-a nos olhos, Carlos indagou:

          - Como se chama?

          - Esmeralda.

          - Esmeralda! Joia preciosa.

          - E você, como se chama?

          - Ricardo - mentiu ele, por força do hábito.

          Ela alisou o rosto dele com suavidade.

          - Não é cigano. Quem é?

          - Ninguém. Um pobre-diabo. Mas eu a amo.

          Ela riu deliciada.

          - Não nos deixaremos mais - sentenciou decidida. - Virá conosco. Se não é ninguem, pode ser cigano.

          Ele riu enlevado. Se ele pudesse! Por que não? Talvez fosse possível ficar uns tempos com eles. Seria fascinante.

          Afagou a cabeça morena da cigana, cujos cabelos sedosos e ondulados levantavam delicados caracóis que a dança liberara.

Esmeralda - Zibia Gasparetto pelo espírito LuciusDonde viven las historias. Descúbrelo ahora