Capítulo 4

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          A tarde morria no acampamento, mas o movimento ainda era grande. Preparavam-se para partir. O outono ia em meio e havia movimento na cidade, onde a maioria cuidava de se abastecer para o inverno.

          As donas de casa cuidavam de suas conservas e de suas carnes, que deveriam sustentar suas famílias nos dias difíceis de inverno. Os ciganos não tinham celeiros nem gêneros para armazenar, mas tudo quanto puderam obter nas festas de verão, e ainda durante o outono, procuravam acomodar nas pitorescas carroças onde viviam.

          Para eles o outono era mais curto, porquanto o verão se alongava ao máximo. Profundos conhecedores da natureza, com a qual viviam em constante contato, estabeleceram um roteiro que lhes permitiam acompanhar a estação quente viajando com ela. Observavam atentamente as árvores e as aves, cuja migração e ciclo conheciam perfeitamente e, de acordo com seus sinais, resolviam também a viagem e o rumo.

          Tinham saído de Madri rumo a Contreta, Córdoba e Cáceres. Seguiram pelo litoral parando em Santo Eleutério e El Prícipe. Barcelona e Alcântara. Agora rumavam para Toledo, onde deveriam permanecer mais tempo.

          Sergei marcara a saída para a madrugada seguinte e as atividades eram muitas. Durante o verão, acondicionavam as roupas de inverno no fundo da carroça e colocavam as almofadas ou o colchão de penas de ganso por cima. Agora tinham que fazer o contrário. Tirar a roupa quente, os acolchoados e os agasalhos e guardar as roupas de verão. Deveriam ainda acomodar os objetos e víveres que tinham conseguido para consumir durante o inverno. Os tachos, os arreios e enfeites tinham sido vendidos e levavam dinheiro com o qual pretendiam adquirir o que precisassem.

          Carlos, curioso, observava o movimento, e seu criado aproximou-se. Durante todos esses meses, Inácio permanecera no acampamento com a vida que pedira a Deus. Fizera amizade com vários ciganos que a princípio riam-se dele, mas que depois, percebendo-lhe a humilde dedicação e a limitada inteligência, acostumaram-se com sua presença.

          Perdendo o medo dos primeiros tempos, e sem coragem de ir-se embora abandonando o patrão, mostrou-se prestativo e útil, e acabou tornando-se aceito e até querido, principalmente pelas mulheres, cujos afazeres mais pesados aliviava, cooperando. Ia buscar água, acendia o fogo, cortava lenha, apanhava frutas, brincava com as crianças, cuidava dos doentes.

          Com isso, conquistara a simpatia e era solicitado por elas, que lhe ofereciam guloseimas e até roupas. Ele se sentia livre e querido. Aproximou-se de Carlos, olhando-o com curiosidade.

          - Senhor, vamos com eles?

          - Certamente.

          - Não vamos voltar ao castelo de Dom Fernando?

          Carlos franziu a testa, preocupado. A figura delicada da mãe surgiu-lhe na mente e sentiu funda saudade. Mas reagiu:

          - Não penso em voltar por agora. Estamos bem aqui. Por acaso quer ir embora?

          - Oh! Não. Gosto daqui.

          - Então deixemos esse assunto. Vamos ajudar Esmeralda.

          Mas Carlos não conseguia esquecer. As saudades do lar eram fortes e pungentes. Esmeralda observou pensativa:

          - Está triste. Por quê?

          - Não gosto do inverno. Sempre me põe triste. Amo o Sol, a luz, o calor.

          A cigana deu de ombros.

          - Não se pode mudar a natureza.

          - É. Se eu pudesse, mudaria.

          Ela riu.

Esmeralda - Zibia Gasparetto pelo espírito LuciusDonde viven las historias. Descúbrelo ahora