Depois de conhecer Rafael, ao invés do rapaz pensar nele, tudo o que vinha na sua cabeça era a imagem de Petrus. O nariz de Augustus quase foi quebrado pelas mãos do jogador de futebol. Ele pensava que já tinha esquecido o rapaz, mas aparentemente o soco não foi tão forte a ponto de também quebrar o seu coração.
Anos se passaram desde o ocorrido e ele pensou que jamais pudesse perdoar Petrus, até ter uma visão enquanto andava em direção à biblioteca. Lá estava Petrus. Ele estava um pouco mais alto e com uma aparência de homem que contrastava com a de adolescente que Augustus se apaixonara. A visão foi mais forte do que Augustus e como um raio, o atingiu em cheio, queimando tudo o que estava ao seu redor. Todos aqueles anos se privando de conhecer pessoas novas e deixando sua vida simplesmente passar de repente valeram a pena. Talvez tudo tinha a sua hora e lugar certos, pensou ele.
Ao passar do lado de Petrus, Augustus ficou tão nervoso que derrubou sem querer um livro de botânica. Se sua antiga paixão platônica ainda não o havia anotado, desta vez seria impossível que o rapaz não o visse. Augustus se abaixou para pegar o livro ao mesmo tempo em que Petrus. "Como ele havia mudado", pensou Augustus. Em outra época, Petrus teria chutado o livro de Augustus para longe ou não feito o mínimo esforço para ajudá-lo. "Talvez o tempo mude as pessoas", Augustus tentou segurar o pensamento dentro de sua cabeça.
Quando os dois se abaixaram, os olhos e mãos dele se encontraram. Como uma estúpida comédia romântica, Augustus sentira como se os seus sonhos estavam se realizando. Após anos sem ver ou pensar em Petrus, tivera a mesma sensação da primeira vez que o observara. Um fogo queimava dentro dele e o coração pulsava sangue com força e velocidade para o seu corpo todo.
− Obrigado pela ajuda – agradeceu Augustus.
− De nada. Eu te conheço de algum lugar – Petrus deu um olhar desconfiado para o rapaz.
− Eu também tenho essa impressão – mentiu Augustus, mas o rapaz era um péssimo mentiroso.
− Nós estudamos juntos no mesmo colégio?
− Pode ser que sim. Qual é o seu nome?
− Petrus. E o seu?
− Augustus. Prazer em te conhecer.
− O prazer é meu. Para onde você estava indo apressado daquele jeito?
− Para a biblioteca.
− Eu também estava indo para lá. Posso te acompanhar?
− Claro. Por que não?
− Então, você gosta de botânica. Provavelmente estuda biologia, ao menos que seja muito interessado na área.
− Sim. Estudo biologia e tenho interesse em seguir a área de botânica. E você, o que está fazendo?
− Estou estudando Educação Física.
− Tem tudo a ver com você. – As palavras escaparam da boca de Augustus. Até parece que era possível esquecer Petrus. Ele era o tipo de rapaz que até mesmo os outros colegas heterossexuais deveriam sentir atração ou desejo de ter um corpo parecido. Imagens de Petrus no vestiário surgiram na mente de Augustus e ele ficou em uma espécie de transe. O corpo escultural de Petrus. Ah, como Augustus sentira vontade de colocar as mãos em cada centímetro daquele corpo.
− Verdade. Sempre participei de todos os esportes no colégio, principalmente futebol.
− Lembrei-me de você. Você era um dos melhores jogadores de futebol do colégio, certo?
− Sim. Não estou muito lembrado de você. – Petrus estava mentindo tanto quanto Augustus. Dizem que a pessoa que apanha nunca se esquece de quem o agrediu, mas, às vezes, o inverso também acontecia. O menino nunca sentira tanta raiva de si mesmo. Foram alguns anos consultando um analista para entender mais sobre seus impulsos e por que sentira tanta raiva do garoto que ficava o observando. Petrus descobriu que odiava Augustus, pois tinha tantos desejos internalizados quanto ele que não tinha vergonha de expressar suas vontades.
− Tudo bem. Eu nunca fui um atleta, nem nada assim para que pudessem se lembrar de mim.
− Deixa de bobeira. Bom, vou ficar por aqui.
− Tudo bem. Foi bom te ver. Tenha uma boa tarde.
Augustus não se recordara de Petrus tão educado desta maneira no ensino médio. Depois de ter sido agredido pelo estudante, durante algum tempo ele ficou traumatizado. Augustus tinha medo de ficar no vestiário quando os jogadores de futebol estavam lá, especialmente Petrus. Nos corredores do colégio, o estudante tinha a impressão de que a qualquer momento uma mão pudesse atingir o seu rosto novamente. Levou certo tempo para superar essa fase. Augustus ficou surpreso com ele mesmo; pensou que teria medo de conversar com Petrus, mas ele parecia uma pessoa totalmente mudada, exceto pela sua aparência que estava cada vez mais atraente.
***
Petrus se sentira mal ao ver Augustus. Ele continuava um pouco desleixado como era na época do colégio, mas ao mesmo tempo desenvolvera sua personalidade. Augustus estava mais autoconfiante. Durante aqueles anos, Petrus sentira-se mal por ter agredido o rapaz e pior ainda, por nunca ter tido a coragem de se desculpar. Os anos se passaram e a culpa foi se dissolvendo, mas em algum lugar dentro dele ela ainda estava lá. "Fizera tanto tempo que Augustus não deveria se lembrar mais", desejava Petrus.
O coração de Petrus bateu mais forte quando viu Augustus. Ele ansiou por este momento durante anos. O momento em que finalmente pediria desculpas. Ele até tentou, mas não conseguiu. "Quem sabe numa próxima vez", pensou. Quando ele bateu os olhos em Augustus, Petrus lembrou-se na hora do que tinha feito. Sentiu um aperto no peito, mas ao observar as mudanças de Augustus, não pôde deixar de se sentir feliz em saber que ele estava bem.
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Enfeitiçado
FantasyUma novela de fantasia urbana / young-adult, com temática de bruxaria. Augustus Cornacchini é um jovem gay, nascido em Florença em uma família de bruxos de raiz. Cada geração dos Cornacchinis deve estudar o livro das sombras deles e com Augustus não...