Capítulo 8

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Augustus entrou na sala de aula, mas estava tão animado com o que tinha acontecido que não conseguia prestar atenção na aula. O estudante abriu o caderno, mas não anotou nada do que o professor estava dizendo. Ele aproveitou para ficar escrevendo o nome de Petrus ao lado do seu e fazendo corações. De repente, foi como se ele tivesse voltado ao tempo, pois era exatamente isto o que ele fazia na época do colégio. Sentiu uma necessidade forte de compartilhar o que tinha acontecido e acabou mandando uma mensagem para a amiga Graziela.

− Você não vai acreditar o que eu acabei de fazer. Dei uns amassos no banheiro!

− Como assim? Com quem? – Graziela estava conversando com o amigo Rafael bem na hora e percebeu que o pior poderia ter acontecido. Augustus deve ter ficado com Petrus.

− Com o Petrus. Foi tudo tão mágico, apesar de ter sido no banheiro.

− Que nojo!

− Vai falar que você nunca ficou no banheiro com outra menina? Esqueceu daquele seu aniversário?

− Não isso... Que nojo você ter ficado com Petrus, depois de tudo o que ele fez para você!

− Ele me pediu desculpas e pareceu sincero. Não sei explicar como começou, simplesmente aconteceu.

− Agora preciso desligar. Desculpa, Augus. Mais tarde nós conversamos.

− Tudo bem. Até mais tarde.

O jeito que Graziela tratou Augustus o desanimou um pouco, mas ele não ia deixar isso atrapalhar sua felicidade. Talvez ela só estivesse com ciúmes e tinha medo de que ele pudesse se machucar novamente. Pela maneira que Petrus o tratou, ele não tinha nenhum medo de se entregar ao outro. Talvez estivesse sendo romântico demais e imaginando coisas, mas sentiu uma conexão muito forte com ele, como se o que tinha acontecido simplesmente era para ser.

***

Rafael estava concentrado em Graziela quando ela atendeu o telefone e percebeu que pelas expressões faciais e a maneira que ela estava falando não poderia ser boas notícias.

− O que houve? Está tudo bem com Augustus?

− Nada demais. Está tudo bem, sim. Um garoto que ele costumava gostar no ensino médio, e foi um idiota com ele, reapareceu e Augustus está todo caidinho.

− Que pena. Por um minuto, imaginei que fossemos nos dar bem. – Rafael não conseguiu disfarçar a raiva que estava sentindo. Ele mal conhecia Augustus e muito menos sabia quem era Petrus, mas estava magoado. Algo estranho acontecia dentro dele. A afeição e pureza que ele sentia por Augustus transformou-se em algo azedo e maligno.

− Eu também pensei que vocês fossem perfeitos um para o outro. Preciso ir embora. Vou passar mais tarde na casa dele. Depois nós conversamos melhor sobre isso.

− Até mais.

Rafael não conseguia definir o que estava sentindo naquele momento, era como se ele estivesse deixando o pior lado dele tomar forma. O homem observou Graziela ir embora e alternou momentos de tristeza com raiva.

− Eu era tão bom para Augustus quanto aquele rapaz... – Rafael deixou as palavras escaparem pelos seus dentes. Quem chegasse perto dele naquele momento poderia se assustar com sua expressão. Ele estava com uma cara de quem ia morder alguém, literalmente.

O destino tinha tentado juntar Rafael e Augustus por meio da intervenção de Graziela, até Petrus reaparecer na vida do jovem estudante de biologia. Rafael fechou os olhos e diferente das imagens amorosas que costumava enxergar de Augustus, desta vez ele via um casal junto. Os dois pareciam felizes, mas quem não estava nem um pouco contente era ele mesmo. Ainda sem saber o que fazer, Rafael decidiu que não deixaria os dois ficarem juntos. Sou muito melhor para Augustus do que Petrus, pensou. Ele não sabia o porquê, mas não queria que o colega se machucasse. Ele estava obcecado por Augustus.

As alucinações começaram a piorar com o tempo. Rafael andava pelos corredores da universidade quando observou um garoto de costas e imaginou ser Augustus.

− Augustus, precisamos conversar! – disse Rafael, enquanto tocava nos ombros do garoto, que pela expressão facial não tinha a mínima ideia de quem era Augustus.

Rafael estava enxergando Augustus em todos os lugares. Tentou fechar os olhos em uma tentativa de escapar das visões e de relaxar, mas as imagens do rapaz com Petrus continuavam surgindo em sua mente. Uma voz dentro dele dizia cada vez mais alto que ele não era bom o suficiente para Augustus. O seu lado racional dizia que as coisas acontecem exatamente do jeito que deveriam e ele encontraria alguém melhor, mas o lado emocional fervilhava ideias malucas. As vozes tornavam-se cada vez mais reais, mais audíveis.

− Você sabe que nunca será bom o suficiente para Augustus... – dizia uma das vozes.

− Olhe para si mesmo. Você já tem 24 anos e ainda está solteiro!

− Feio e burro... Quem é que vai te querer?

Pensamentos autodestrutivos surgiram na cabeça de Rafael. Ele só queria que as vozes o deixassem em paz, mas à medida que as horas passavam ele se via cada vez mais preso naquele inferno. Não era um conto de fadas onde um beijo de Augustus pudesse melhorar tudo. Aquela era a personificação de toda a tristeza e raiva guardadas dentro de Rafael. Ele chegou ao fundo do poço e não conseguia enxergar nem mesmo uma fresta de luz. No escuro, as sombras tomavam formas cada vez mais palpáveis. Se há algum tempo Rafael mantinha essas criaturas que se alimentavam dos seus medos e raivas dentro de si, agora elas estavam controlando e o consumindo de dentro para fora... As sombras estavam expostas na sua pele.

Rafael estava suando e delirando nos corredores da faculdade. Se o rapaz não morasse perto do campus, precisaria ligar para uma ambulância. Por sorte ele aguentou andar mais um pouco até chegar ao seu minúsculo apartamento, lugar escolhido propositalmente próximo à universidade por conta das suas aulas do mestrado e do dinheiro da bolsa concedida para que ele realizar pesquisas na área de botânica. Era a opção mais prática e econômica para o rapaz. Ele sempre gostou de morar naquela região, mas naquele dia nada parecia bom o suficiente. Sabe quando dizem que a grama do vizinho é sempre mais verde? A grama dele estava seca e pisada. Rafael não estava querendo melhorá-la. Para ele, era mais conveniente simplesmente queimá-la.

Dentro do apartamento, Rafael fechou a porta e as janelas. Ele precisava deitar um pouco. Não sabia o motivo de tanto mal-estar. Encostado na cama, Rafael pegou sono e começou a sonhar. Os sonhos não eram nada bonitos como costumava ter. Ele viu o mundo pegar fogo. As flores estavam queimadas, os animais mortos e as pessoas lembravam criaturas saídas de algum filme de terror. De repente, Rafael viu o que restava de esperança no seu sonho, Augustus. Augustus estava abraçado com um rapaz e os dois estavam felizes. Era tanta felicidade, que Rafael sentia como se eles estivessem tentando jogar na sua cara. O homem solteiro, patético e desinteressante se levantou de onde estava. Rafael vestia uma capa preta e carregava na mão direita um punhal. Quando o cavaleiro das trevas estava próximo de Augustus, Rafael foi acordado do sonho por uma ligação.

− Você está bem? Tentei te procurar na universidade, mas não te encontrei. – Era a voz de Graziela no telefone.

− Não estou me sentindo muito bem. Eu devo estar gripado. Estou com um pouco de febre. – Rafael deu a única explicação que conseguia naquele momento. Não queria descontar em Graziela, mas sentia de alguma forma que a culpa também era da garota.

− Melhoras para você. Vou deixar você descansar, então. Depois conversamos sobre aquele assunto. Não quero ser inconveniente.

− Tudo bem. Obrigado!

A ligação de Graziela acalmou um pouco Rafael. Ele se levantou e olhou pela janela. Não sabia quantas horas tinha dormido, mas tudo estava escuro. Naquele dia, nem a lua estava brilhando no céu. Rafael tivera dias melhores que aquele.

Rafael levantou da cama e foi para o banheiro tomar um banho. Passou em frente ao espelho e ficou imóvel por alguns minutos. "Será que ainda estou alucinando?", pensou. O que ele via não se parecia muito com quem ele costumava ser. Seu rosto estava pálido e contrastava com as veias verdes e azuladas. Duas sombras estavam embaixo dos seus olhos e era como se ele tivesse se maquiado para alguma festa de Halloween. Rafael jogou um pouco de água no rosto para ver se melhorava, mas continuava daquela maneira. O rapaz se sentia sem energias. Nada parecia certo. A água que saía do chuveiro estava normal, mas ao entrar em contato com o corpo dele começava a escurecer e ficar negra, como sua alma naquele instante.

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