Fora do prostíbulo, a fome devastava a Ucrânia. Mães enlouqueciam e matavam alguns filhos para alimentar o restante da família.
Caminhões conduziam pessoas agonizantes para os limites da cidade, onde eram jogadas vivas para morrerem de fome e serem comidas. Falava-se de um mercado negro de carne humana para as cidades mais abastadas.
Por toda a Ucrânia, trens levavam milhares de pessoas para a Rússia. Quase todas morriam de fome e frio no caminho.
Depois do parto, Irina não manifestava nenhuma vontade de viver. Negava-se a sair do quarto. Com os instintos de preservação da espécie aguçados pela fome Anatoli queria mais e mais sexo, desejo ao qual Irina não atendia. Os filhos dormiam no quarto , sendo que Ianovick, sempre muito apegado à mãe, dormia na cama com ela.
E quando Danlov tinha dois anos foi acordado pelos gritos estridentes do irmão. Atordoado acordou e as pessoas gritavam. Porém sua mãe não abria os olhos, não se mexia. Deveria estar dormindo também... Ele, porém não entendia como a mãe conseguia conciliar o sono, com tantos gritos do irmão.
Afinal, porque tanta confusão? Ianovick parecia uma mulher, uma prostituta dentre tantas que ele ouvia gritando no quarto ao lado do que dormia... Gritos, gritos, gritos! Malditos gritos! Seu pai não gritava e ele gostava de seu pai por isso.
Ele foi então levado pela avó para a cozinha e percebeu que seu pai saiu pouco depois com um saco nas costas. Parecia pesado. Ele se orgulhava de seu pai. Sabia que ele era um homem muito forte. Afinal, ele sempre via que seu pai, muito cavalheiro, levava as mulheres, frágeis e sempre cansadas, para o quarto ao lado, onde gritavam e gritavam... Tudo que ele queria então, era se ver livre dos gritos, das mulheres barulhentas...Malditos gritos que faziam com que ele acordasse de noite, e ficasse sozinho, pois ao acordar, apenas o aterrador silêncio reinava no quarto escuro.
Depois ele não tornou a ver sua mãe. A fome continuava la fora e havia poucas pessoas na cidade, mas os clientes do prostíbulo sempre apareciam, um ou outro e traziam alguns grãos e carne. Saciar a fome era a única tarefa prazerosa. Ianovick parecia muito triste e chorava. Porque o irmão chorava e seu pai e os clientes não? Ele também não chorava.
Nem quando o gato magro que era de estimação da sua avó estava se contorcendo em dores provocadas pela fome... Parou e observou que seus olhos paravam, à medida que os miados rasgados também. Os olhos amarelos ficaram sem luz... Silêncio, enfim.
Agora ele dormia com a avó, porque seu pai estava sempre ocupado ajudando nas tarefas das mulheres. Sempre tão cordial,tão pronto para atender a todos os pedidos delas... Porém Danlov entristecia sempre por não ter o pai por perto. Quis por vezes, ser uma daquelas mulheres que sempre tinham tanta atenção de seu pai.
Os gritos continuavam perturbando o sono de Danlov. Mas, aos três anos já, ele não sentia tanta falta da mãe. Dormia na cama com a avó e por vezes acordava com seu pai fazendo companhia aos dois.
Agora todas as manhãs acordava com sua avó debruçada sobre ele. Seu pênis minúsculo, que ele conhecia apenas como via para a saída da urina, estava protegido pelo calor da boca da avó e por vezes parecia que algo o preenchia, numa sensação indefinida. Uma onda e calor seguido de espasmos percorria seu corpinho. Afinal, sua avó estava parecendo ser melhor que sua mãe... Lembrava-se pouco dela, afinal sempre estivera distante, fraca.
Então, aconteceu que Ianovick, sempre tão sozinho, desapareceu como sua mãe. Ficou uma dúvida na cabeça de Danlov... Poderia ter ido se encontrar com ela... O que ele não sabia é que na realidade, sozinho, sem nenhuma proteção, seu irmão seria servido como a refeição dos próximos dias.
Agora todas as noites seu pai dormia com eles... E mais uma vez acordou, dessa vez com gritos de seu amado pai... O que estaria havendo? Estarrecido, viu que sua avó e seu pai estavam nus e que ela estava fazendo com o pai o que fazia com ele todas as manhãs para acordá-lo.
Algo doeu em sua cabeça e ele, que nunca chorava, nem ao acordar com os gritos que atordoavam sua cabeça durante o sono, chorou descontroladamente.
O choro, tão incomum naquela criança, perturbou ao casal. Ele estava com três anos, quase não falava, mas poderia de alguma forma denuncia-los. Mesmo num prostíbulo o incesto seria encarado como um escândalo. Precisavam então, tomar alguma providência.
Porém, com algum instinto de paternidade, Anatoli não permitiu que Danilov fosse morto como seu irmão. Então pela manhã, quando viajantes que pernoitaram lá estavam de saída, ofereceram o menino em troca de alguns cereais e eles partiram.
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ESQUIZOFRENIA
General Fictioncapa by @carolcast A História se encarregou de esquecer a grande fome que assolou a União Soviética, principalmente a Ucrânia, entre os anos de 1932 e 1933. Durante esse período historicamente não contado, nasceu Danlov Kraemer que sobreviv...