Nem as Estrelas no Céu

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— Você não pode ir.

— É claro que posso, Diego — o som característico do zíper de minha mochila sendo puxado se fez presente. — Não está vendo as malas? Precisa de óculos agora?

A insistência das pessoas era  a quase comovente, mas como poderia permanecer em um lugar onde tudo — absolutamente tudo — me lembrava do que eu havia perdido? Mesmo com o olhar severo que o semideus direcionava para mim, não houve alteração em minha expressão.

— Então é isso? Vai deixar tudo pra trás, por causa do que aconteceu? Pelos deuses, Nath, não pode...

— Ah, cala a porra da boca, Campbell! — rosnei. — Você perdeu um olho, eu perdi meu irmão!

Aquilo bastou para mantê-lo em silêncio. Diego pareceu piscar várias vezes, tentando absorver minhas palavras de alguma forma, enquanto aquele olho sem vida não se focalizava em lugar algum.

— Te mando um cartão de aniversário... — falei ao passar pelo brutamontes, me dirigindo até a saída do chalé.

Noite. Desde aquele dia, a noite parecia durar mais que os dias e assim persistiu. Eu poderia lidar bem com o fracasso ou com olhares tortos que geralmente me dirigiam, mas a perda... A morte de Claudio ainda era uma das coisas que meu cérebro custava a processar.

[...]

— Finalmente... Estou livre.

Em primeiríssimo lugar, queria deixar bem registrado que se pudesse escolher entre ser ou não uma semideusa... Claramente minha resposta seria um digníssimo não, com direito a negrito e caixa alta. Digo, fala sério, todos os dias correndo risco de virar espetinho de carne e quando pensa que tá melhorando, BOOM! Deusa primordial na TPM volta dos confins do tártaro pra te matar!

Ou pior, não sei.

Quando o feiticeiro de Christopher desapareceu, levou as amarras invisíveis que me prendiam junto, porém era impossível mover um único músculo diante da presença primordial de Nyx. Estar na frente de um deus já era desconfortável o bastante, quem diria aquilo. Não haveria escapatória e meus planos se mostravam inúteis, então o que nos restava? Esperar por clemência?

Não deu tempo pra pensar, eu já rumava em direção a divindade com a foice em punho, parando poucos metros a sua frente. Nyx me encarou com curiosidade, antes de me conferir um sorriso de congelar o sangue e... Aquilo atrás dela eram vampiros?! Deuses, provavelmente eu teria soltado algum comentário depreciativo básico sobre vampirismo e citado alguma frase do Nosferatu genialmente, mas fui interrompida por outra citação: o berro do próprio inferno, o falsete de Hades, o grito do fim do mundo, literalmente.

Não pensei muito antes de partir para o ataque, girando a foice como um bastão para atingir Nyx na lateral do corpo. O golpe foi bloqueado por duas lâminas nas mãos dá divindade, que só pela estranha aura emanada, era o suficiente para que eu mantivesse aquilo longe. Não dava, eu não tinha um plano.

— Vocês, semideuses... Tão cheios de si e tão burros... — disse Nyx, ao afastar minha foice com um giro, me forçando a recuar para não perder o equilíbrio. — O que te fez pensar que poderia me combater, filha de Hades?

Não percebi o ataque. Meu punho gelou quando uma das lâminas cortou a carne, inutilizando o uso da canhota. Praguejei, vendo que os outros combatiam os vampiros o máximo que conseguiam pela visão periférica, mas sem ousar desviar minha atenção. Três passos para a lateral, seguido de um giro para recobrar impulso durante o ataque.

Novamente não surtiu efeito.

Tentei recuar a tempo, mas a divindade já partira para o ataque, girando como o diabo numa dança mortal. Me forçava a ficar na defensiva a todo instante, pois em meio a tantos golpes, eu não possuía qualquer abertura para revidar. Estaria morta em alguns segundos.

Diário de Uma Filha de HadesOnde histórias criam vida. Descubra agora