Maria Eduarda Arantes

550 40 2
                                    

Depois do dia em que aquele petulante resolveu me deixar parada no meio da minha sala sem as respostas que eu queria, minha raiva se acendeu e meu dia ficou negro. Heinrich Alencar tem tirado o melhor de mim em mau humor. As vezes que me lembro dele aqui, presunçoso saindo dessa sala meu ego se inflama. Realizei a uma reunião para informar o corte de bonificações. Claro, como era de se esperar, o tumulto foi geral e os elogios foram os mais "agradáveis possíveis" já que estamos tratando de minha pessoa. Queria poder dizer que me senti ótima em fazer essas modificações e que os apelidos que recebo não me importam, mais a verdade é que o vazio habita em mim; queria ser respeitada no império que comando mais também queria ser adi admirada. Acredito que seja tarde para isso. Melhor continuar com meu desempenho inicial e manter as coisas como estão, afinal, não quero ser considerada fraca em minha personalidade nem muito menos da o gostinho de abaixar a cabeça para os funcionários.

Hoje procurei o nosso Gerente de Logística e o mesmo se encontrava viajando para uma de nossas filiais. Pedi que entrassem em contato e que o mesmo me certificasse sobre a reposição de nossos medicamentos nas redes do estado de Florianópolis. Pois há uma reclamação sobre a quantidade de produtos. Minha falha memória esquece-se de quem se tratava e o meu corpo reagiu inteiramente ao som daquela voz. Apesar da raiva que sinto quando me lembro de como me tratou naquele dia, meu corpo traidor se ouriça todo com o tom de grave ao falar:

-Boa tarde Srta. Arantes. Em que posso ajuda-la?

-Sr. Alencar. Eu quero uma explicação mais que plausível para a falta na demanda de medicamentos e cosméticos em uma de nossas farmácias em Florianópolis. –Meu nervosismo e irritabilidade são mais que perceptível em minhas palavras, já que estou quase gritando. Só não consigo reconhecer o motivo; se por sua falta às obrigações ou se por sentir o que não quero em relação a ele.

-Senhorita Arantes eu peço por gentileza para usar um pouco da educação que eu acredito que eu a Senhorita tenha. Afinal, é a dona do império farmacêutico, não? Então, por favor, não precisa falar-me aos gritos, pois não sou surdo. E mais, a entrega em uma das farmácias em Florianópolis se deu de maneira correta. O caso é que o gerente solicitou um aumento na demanda de ultima hora, o que não foi possível para este abastecimento, pois já estava com os malotes certos para cada farmácia. A senhorita bem sabe que não temos manipuladora nesse estado e que as remessas vêm diretamente da matriz. –Minha raiva se acende em quinhentos graus. Mais decido me conter só para prova-lo que sei o que é educação, mais a minha mente grita e tenho que me segurar para não o mandar ir à merda.

-Sr. Alencar eu o quero na minha sala no primeiro horário aman...

-A Srta. Me quer? Ora, ora! -Ele fala e sorrir dando duplo sentido as minhas palavras porem não se detém a isto e logo volta a entoar sua voz firme no telefone:

-Eu sinto muito Srta. Mas eu não poderei atender ao seu capricho. Não antes de terminar minhas funções ao qual sou resignado. No mínimo estarei de volta na quarta-feira, no máximo, sexta; ou seja, a Senhorita terá que aprender a desempenhar uma função simples.

-Não me diga? E qual seria esta função?

-Esperar, Srta. Tenha uma boa tarde. E assim, mais uma vez esse arrogante me tira do prumo. Ele está me desfiando, só pode! Eu não sei o porquê de mantê-lo aqui ainda. Não hesitarei em dispensá-lo quando pagar o que me deve. Lembrando-me deste fato, recorro a um calendário e vejo que falta apenas três semanas para acabar o prazo vigente que dei aquele presunçoso. Sua voz de comando me faz tremer e eu odeio isso. Que ele não perceba mais quando ele toma posse do controle, quando ele é arrogante e metido a besta em sua maneira eu simplesmente não sou eu. Ele me cala e sempre sai às coisas da maneira que ele quiser e isto está me assustando. Eu preciso reverter esta situação e vamos começar sabendo quem é Heinrich Alencar fora das instalações Arant's. peço sua ficha de contratação ao Rh e em menos do esperado ela está em minhas mãos.

As informações que ele me deu a respeito de seus cargos estão todas aqui. Contem também sobre seus dependentes. Ele tem nos registros cadastrais a sua mãe e uma menina de quatro anos. Acredito ser sua filha. Nesse momento lembro-me do crédito nas manipuladoras da rede Arant's. Deve ser para sua mãe os medicamentos. Talvez uma senhora de idade acima dos cinquenta, visto que o Heinrich tem trinta anos. Os relatórios não trazem muito da vida particular dos funcionários e isso me deixa insatisfeita com o pouco que apurei da minha investigação. Preciso de mais. Mas para quer mesmo? Eu não sei. Sei apenas que quero estar a par da vida dele, talvez na tentativa de me cercar de alguma forma do seu modo arrogante que sempre leva a melhor diante de mim. Eu preciso contornar essa situação e coloca-lo no seu devido lugar.

Chego a minha casa no extremo do cansaço físico e psicológico. Confesso que imaginei ser mais simples estar na liderança do grupo Arant's, mas as coisas não são tão fáceis como imaginei. Olho para o grande espaço que esta casa tem e me pergunto internamente se é realmente necessário; eu poderia viver confortavelmente em um apartamento pequeno e com certeza a vastidão não seria assoladora. Mas deixo esse pensamento para lá, afinal, eu convive com essa solidão alarmante a vida toda e não é agora que ela me fará correr feito um animalzinho indefeso. Depois que jantei segui para o meu quarto e a realidade bateu fortemente. Eu queria ser forte, mas viver uma vida dividida com a solidão está me deixando amargurada. As pessoas me olham ou com medo do que eu possa fazer a elas ou com interesse, imaginando o que podem ter em beneficio aproximando-se de mim. Uma vida desgraça essa que Valério me condenou. Nessa mesma noite tenho um pesadelo, a minha vida nunca pareceu tão real quanto ali naquelas cenas. Parecia que eu estava vivendo tudo aquilo novamente. Acordei com meu corpo ensopado de suor e inevitavelmente eu chorei por ainda carregar as marcas do desprezo que aquele homem sem coração deixou em mim; tanto me marcou que eu sou a sua replica fiel.

Nos dias seguintes na empresa, os momentos não foram dos melhores. Alguns funcionários tentaram tumultuar um movimento de greve, alegando eles que as bonificações que recebiam foi um acordo com Valério e que eles estavam resguardados no rigor da lei. O recado em resposta foi o seguinte: Se até o fim do dia esse burburinho se alastrasse nas instalações da empresa, dispensaria um por um dos envolvidos de suas obrigações e alegaria justa causa. Não admito esses alardes sem fundamentos no meio dos funcionários. Contudo, eu preciso me assegurar; saber se existe um acordo legal que de direitos a esses baderneiros.

O fim de semana passou naquela monotonia de sempre. Minhas amigas estão curtindo suas vidas de farras e bebedeiras, enquanto eu me tornei essa mulher de negócios. Uma fortuna incalculável nos cofres dos bancos mais o coração e a vida com um vazio imensurável. Hoje é domingo e decido dar um passeio no parque aqui perto, afinal, o dia está ótimo para passear e pensar no que poderia ser a vida. Aquela que eu nunca terei. Decido eu mesma dirigir, faz tanto tempo que não guio pelas ruas dessa cidade. O parque está movimentado. Famílias estão curtindo um domingo à tarde em perfeita sintonia. Crianças correm e brincam de um lado para outro, sorriem, vivem a vida de uma maneira tão bela que até parece que nada de ruim pode acontecer ou estar acontecendo neste mundo caótico. Eu escolho um banco afastado e fico de lá mesmo observando e pensando: Eu nunca tive esta vida. Eu nunca recebi um terço do carinho que essas crianças recebem dos seus pais. A vida foi totalmente injusta comigo me tirando o único ser que realmente me amava. Não sei em que momento mais aquele emaranhado de pessoas rindo e se divertindo, demonstrando seus sentimentos um para com o outro me fez chorar. Chorei de uma maneira tão dolorosa e tão minha que me esqueci de onde me encontrava até ouvir aquela voz imperativa, seca mais estonteante sonar nos meus ouvidos.

-Inacreditável! A princesinha do coração de gelo resolver ver a vida fora do seu castelo? –O dono daquela voz sabe como mexer com meus sentidos. Heinrich Alencar tem o dom de me fazer ir do extremo ao outro do inferno em questões de minutos. Sim, inferno. Na minha vida, eu nunca soube o significado de algo se quer parecido com o céu.  

O Preço da FelicidadeOnde histórias criam vida. Descubra agora