Na noite anterior, depois de deixar Alice em casa, Marina tomou uma decisão. Depois de toda aquela confusão mais cedo, alguma coisa não parecia certa para ela. Aparentemente Heitor ainda sentia alguma coisa por Alice, então por quê começar toda aquela história com Ariane? Não fazia o menor sentido. Uma coisa em especial borbulhava na cabeça dele. Em algum momento da briga ele disse algo sobre Alice só ter interesses, e ter trocado ele porque o que ele tinha já não era suficiente. De onde ele tinha tirado aquilo? Ela imaginava que Ariane fosse capaz de dizer uma outra mentira, ou de dizer alguma coisa para jogar Heitor contra Alice, mas nunca pensou que ela pudesse chegar tão longe. Outra lembrança passou correndo por sua cabeça, um flash, uma coisa rápida, mas que fez com que tudo que ela estava analisando fizesse ainda menos sentido para ela. Alguns dias antes daquele incidente com Heitor e Ariane Marina tinha escutado a moça falar alguma coisa sobre um rapaz da Califórnia que ela tinha conhecido, e sobre como ela estava se apaixonando, e que talvez aquele fosse o homem dos seus sonhos. De repente, ela estava jogada nos braços de Heitor. As coisas simplesmente não pareciam se encaixar para ela. Por toda essa série de informações cruzadas, coisas que não se encaixavam e informações que não levavam a lugar nenhum, ela resolveu que ela iria até Ariane, saber como aquilo tinha começado, e o que ela tinha dito sobre Alice par Heitor, o que ela tinha falado para desencadear tudo aquilo. Se ela não contasse nada, pelo menos ela ficaria sabendo o que o seu namorado andava fazendo nas noites em que ela não estava se apresentando no clube. Aquilo não podia se repetir. Por mais maravilhoso e razoável que o Gabriel parecesse, ela não acreditava que ele fosse aceitar bem aquela situação. O que ela achava bastante compreensível. Quer dizer, um homem qualquer subindo no palco, enquanto sua namorada está se apresentando, e falando tudo aquilo. Não seria estranho se Gabriel simplesmente surtasse. Ele já era compreensivo demais por entender tudo que se apresentar ali significava para Alice, o respeito que ela tinha por aquela forma de arte, a maioria dos homens não aceitaria algo assim. Se virou para o motorista quando o carro já estava bem afastado da rua de Alice. O melhor seria que amiga nem imaginasse o que ela iria fazer. Com toda certeza Alice a reprovaria por fazer aquilo. Para garantir que a amiga não desconfiasse de nada ela disse o endereço de sua casa para o taxista, era naquela direção que eles estavam seguindo. Mas agora era hora de ir para o real destino que ela planejava.
-Nós vamos nos virar na próxima rua.
-Mas nós vamos sair em outro bairro, senhora.
-Sim, tive uma mudança de planos, já te passo o endereço exato.
Marina imaginou que ela seria, digamos, mais persuasiva se ela fosse acompanhada até a casa de Ariane. Colocou a mão na bolsa e mexeu até encontrar um papel. Sorriu, sem graça, quando leu o que tinha anotado nele. Colocou os cabelos que caíam no rosto para trás, revelando um rosto levemente corado. Era difícil não corar quando se tinha consciência do quão boba aquele sorriso a fazia parecer. Entregou o papel para o taxista.
-Vamos para esse endereço.
-Sim senhora.
O carro seguiu pelas ruas escuras da cidade, até parar quando finalmente chegou ao seu destino. Eles pararam em frente de um sobrado. A casa não era nem rica, e nem pobre. Parecia ser confortável. As paredes eram brancas e tinham grandes janelas pintadas de azul. Um azul forte, lembrava a cor do oceano. A cor que as águas frias do norte tem. Ela desceu do carro e foi até a calçada. Parou na frente da sineta que havia para chamar o dono da casa e colocou a mão na cabeça. "Isso pode não ser uma boa ideia", pensou. Mesmo com esse pensamento esticou o braço em direção da sineta, mas parou antes de tocar na corda. Olhou para os lados e viu como estava o movimento na rua. Ninguém mais estava ali. Respirou fundo. Não seria fácil fazer aquilo, mas era o certo a se fazer. Tinha medo da reação que viria daquele chamado, mas achava que aquela ajuda seria muito bem vinda. Puxou a corda. sineta tocou, com seu barulho estridente, especialmente irritante em meio ao silêncio daquela madrugada. Esperou. Silêncio novamente. Olhou em direção à casa. Ninguém parecia vir. Puxou novamente o sino, dessa vez sem pensar. Achou que se já tinha puxado a primeira vez, fazer novamente não seria tão mal. A rua era toda silencio novamente, já não se escutava nada além dos barulhos que ela mesma fazia. Uma luz se acendeu num quarto, no segundo andar do sobrado. Ela ouviu o som de passos dentro da casa. Andava de um lado para o outro na calçada. A mão coçando a cabeça, como se algum bicho estivesse morando ali. A porta se abriu e ela pode identificar um vulto masculino no meio das sombras. Ele veio andando devagar, parecendo nem ter muito equilíbrio. Com certeza estava dormindo antes de Marina chamá-lo. Ele abriu o portão, ainda meio desnorteado. Mas quando viu quem estava ali sorriu. Um sorriso bonito, espontâneo, que dizia Bem-vinda. Marina sorriu também, aliviada. Fernando não tinha se incomodado com a visita numa hora daquelas, sem ter sido avisado. Marina achou que ele estava especialmente belo ali, sob a luz do luar. A falta de pretensão e preocupação em se arrumar que era consequência daquele encontro lhe caíam bem. Ele era alto, e parecia ainda mais alto naquela noite. Não tinha abotoado a blusa, na pressa de ver quem era, o que tinha deixado à mostra seu peitoral. Ele era forte e firme. Marina sentiu vontade de se deitar sobre aquele peito, e de beijar aqueles lábios, que pareciam chamar pelos seus. Mas aquele não era o objetivo da visita dela. Ela precisava ajudar Alice.
-Boa noite, Fernando. Me desculpe o incômodo.
-Você nunca me incomoda, Marina.
Ela desviou o olhar, desconcertada.
-Que bom que nunca te incomodo, porque preciso de um favor seu.
-Do que se trata?
-Preciso falar com uma pessoa, para esclarecer uma história, será que você poderia ir comigo té lá.
-Mas é claro. Só peço que você espere eu me aprontar.
-Está bem.
-Você quer entrar enquanto eu me arrumo?
-Não, estou bem. Vou te esperar por aqui.
-Volto rápido.
Marina colocou as mãos na cintura e sorriu para ele. Fernando correu até o interior de sua casa e a deixou na calçada, esperando por ele. Alguns minutos depois ele estava de volta.
-Vamos?
-Vamos!
Foram até o taxista, que esperaram pelos dois.
-Desculpe o inconveniente, moço.
-Já passei por coisas piores dona.
Ela passou o endereço para o motorista, que deu partida no carro. Alguns minutos depois eles estavam chegando na casa de Ariane.

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Alice
Fiksi SejarahAlice é uma dançarina de burlesco que se vê dividida entre dois homens, tentando se decidir entre o homem que ela ama e o homem que a ama. Nessa busca conta com o apoio de amigos para superar suas dúvidas, seus problemas e os perigos que o amor mal...