Mistério no Apartamento

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 Houve um tempo em que, enfrentando uma crise financeira, me vi forçada a mudar da casa onde vivia para um apartamento menor, num dos bairros próximos ao centro da cidade onde moro. Sempre vivi sozinha então, na mudança, fomos somente eu e minhas duas gatas. O bairro não era tão bom quanto o que morava antes, um pouco deserto e perigoso a noite, mas era o que minha situação, na época, podia pagar. Então segui em frente até que a má fase fosse superada.

 No mês seguinte á mudança, coisas esquisitas começaram acontecer. A primeira e mais gritante de todas era o comportamento dos gatos. Havia algo lá que deixava-os inquietos. Alguma coisa os incomodava de tal forma fazendo com que ficassem num estado de constante alerta. Os barulhos e estalos noturnos, revezando madrugada adentro pela sala, cozinha e quarto, inclusive comigo dentro, que meus amigos insistiam em dizer serem causados pelo calor, mesmo que estivéssemos em pleno inverno rigoroso. A infiltração misteriosa na parede da sala por onde não passava nenhum cano e que não havia meio do zelador descobrir a origem. Mas, ainda que ressabiada, segui em frente.

 Numa madrugada ouvi um barulho mais forte na sala e, ao me levantar e ir até o cômodo, fui surpreendida e imobilizada por um homem que invadira meu apartamento. Era alto, magro, moreno escuro e careca. Fedia uma mistura de bebida com suor e sussurrava baixinho em meu ouvido que se gritasse ou tentasse fugir, seria retalhada pela faca que tinha numa das mãos. Queria dinheiro, celular, o laptop, e o que mais tivesse de valor. Mal comecei responder que não tinha muito e ele me atirou no chão, chutando minha cabeça com força. O golpe foi tão violento que, completamente zonza e aturdida, não conseguia entender direito o que ele dizia, ainda em voz baixa e alterada, provavelmente transtornado pelo efeito das drogas, da bebida ou do que quer que ele tivesse ingerido naquela noite. Foi quando aconteceu.

 O invasor começou gritar palavras desconexas e desferia golpes de faca no vazio. Ordenava que se afastassem dele e o deixassem em paz. Estava convencida de que seria morta, cedo ou tarde, em meio de seu surto psicótico, quando o infeliz correu em direção a grande janela da sala e, gritando, atirou-se por ela. Encontrou a morte treze andares abaixo, na calçada.

 A pancada que recebi, felizmente, não foi prejudicial e quando o zelador e um vizinho entraram pra ajudar, já havia me levantado e sentado num poltrona. Lembro de ver minhas duas gatinhas, assustadas, escondidas debaixo da cama, mas perfeitamente sãs e salvas, assim como eu. A autópsia do infeliz, dias depois, confirmou que estava sob efeito de drogas pesadas. Polícia fez poucas perguntas, certa de tratar-se de mais um caso de invasão de domicílio, comum na região, como fui descobrir depois. Quanto a mim, no dia seguinte após sair do hospital, peguei minhas gatas, fui pra casa de minha irmã e lá fiquei até que minha situação, tanto financeira quanto psicológica, voltassem ao normal e pudesse me mudar para uma casa melhor, num lugar melhor.

 Até hoje me pergunto se aquele homem fez o que fez por conta de um surto ou porque outra coisa aconteceu naquele apartamento.

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