Turno da Noite

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 História contada pelo marido de Ernestina, comadre de minha avó que trabalhava, por volta da década de 1970, numa empresa de construção. Estava no meio de um serviço grande que lhe fora designado. Era o coordenador das obras, na época, quando ouve o ocorrido.

 A empresa construía um condomínio numa área afastada da cidade. O local era, ainda, muito selvagem, praticamente intocado, coberto por quilômetros de mata densa. Segundo alguns trabalhadores, haviam pontos de floresta virgem, intocada pela intervenção humana. De fato uma única estrada de terra batida conectava o local das obras com a cidade. Fora isso nada mais havia de civilizado naquelas paragens.

 Os trabalhos estavam no início. Apenas uma parte do terreno havia sido alterada, tendo suas árvores arrancadas e a terra aplainada. Uma mata imensa cercava aquela clareira e, depois dessa vegetação, vasta serra podia ser vista. As máquinas trabalhavam no solo, assentando-o, preparando o local para receber o asfalto das ruas e os alicerces das casas.

 No intuito de agilizar o trabalho, os funcionários eram contratados para dormir no canteiro de obras durante a semana, indo pra casa no sábado, retornando na segunda-feira de manhã. O marido de Ernestina e os trabalhadores dormiam num barracão de madeira, construído próximo à estrada de acesso ao terreno. Em frente desse local eram estacionados carros e máquinas, ao final do dia.

 Em certa tarde, quando o expediente chegava ao fim e os funcionários começavam recolher o equipamento e parar as máquinas, retirando-se para tomar um banho, jantar e dormir, um dos tratoristas resolveu adiantar um pouco das tarefas e trabalhar um pouco mais. Conduzindo sua máquina, foi limpar uma área mais afastada do terreno, próxima ao pé da serra.

 Um tempo depois, quando a noite havia caído e quase todos já estavam recolhidos, dormindo, o marido de Ernestina, e alguns outros, acordaram com o barulho do trator parando em frente ao barracão. Suas luzes fortes atravessavam as ripas de madeira do cômodo. Da forma como a máquina veio pelo terreno, parecia que ia atravessar as paredes e invadir o quarto.

 Ao saírem pra fora, encontraram o condutor ao lado do veículo, muito abalado, apoiando-se na lateral da máquina. Este, ao ver seu chefe, foi até ele dizendo que não mais trabalharia naquele lugar. Arrumaria suas coisas e partiria logo cedo. Dito isso, entrou no barracão e não conversou com mais ninguém.

 Na manhã seguinte, enquanto assinava alguns papéis e orientava como o funcionário deveria proceder no escritório da cidade, seu chefe quis saber o que havia acontecido para que tomasse uma decisão daquelas. O homem, então, contou que quando já era noite, trabalhando no terreno ao lado da serra, notou algo que lhe chamou a atenção. Um tipo de bola de luz branca e brilhante apareceu, flutuando acima das árvores, num dos morros. No mesmo momento, parou o trator e desligou seu motor, permanecendo somente com as luzes acesas, observando aquela esfera luminosa descer, aos poucos, a extensão da serra. Ao alcançar a mata na base do morro, desapareceu entre as árvores e não foi mais vista. Foi quando ouviu-se um ruído ao lado do trator. Ao olhar para o chão pode ver, iluminada pelas luzes da máquina, uma grossa corrente rastejando ao lado da roda dianteira. Era longa, com grandes elos prateados que refletiam as luzes da cabine. Movia-se rapidamente, deslizando pelo chão acidentado como uma cobra. Da mesma forma que surgiu, desapareceu, saindo do alcance das luzes, perdendo-se na escuridão depois dela. O trabalhador, apavorado com o que acabara de ver, ligou novamente o motor e saiu o mais rápido que pode de lá, fugindo para o barracão.

 Ernestina contava que, segundo o relato de seu marido, aquele homem foi embora, nunca mais sendo visto novamente por aquelas bandas.

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