Capítulo 7 - Parte VI

34 11 10
                                    

– Só mais um: Imbecil. Como você pode fazer isso comigo, cara? Você é muito trouxa de me ligar, desligar o telefone e sumir assim. 

– André, você está chorando? 

– Não, Bernard, caiu uma árvore no meu olho. Onde você está? 

– Na minha antiga casa – respondo. 

– Que você tá fazendo aí? – diz André assustado. 

– Também não sei. Vim parar aqui. E você, onde está? 

– Na porta do IML, esperando seu corpo. 

Não consigo segurar a gargalhada. 

– Por que você está rindo, idiota? – diz agressivamente. 

– Achou que eu estava morto? – perguntei. 

André desliga o telefone na minha cara e não atende meus retornos. Mas, me sinto aliviado de pelo menos alguém se preocupar comigo. 

– Era seu amigo André? – pergunta Ana. 

– Era, sim. Acredita que ele estava no IML esperando meu corpo chegar? 

– Não creio. Sério? 

Os olhos de Ana se arregalaram, parecendo duas jabuticabas. 

– Sim. 

– Voltando ao assunto. Você havia falado que tinha sido liberado do orfanato. Como eles conseguiram fazer isso? Você deve ter aprontado lá, não é? 

Se Ana soubesse que na verdade eu fugi, ela não diria isso. 

Contei a Pedro o plano de fuga. Ele no começo ficou meio incomodado, mas depois topou na hora. Eu também estava com medo de algo dar errado. 

Foi uma tarde de domingo. Pedro e eu não podíamos topar em nenhum lugar que logo começava uma discussão ou porrada. Os padres já tinham nos chamado até para fazer as pazes novamente, porém, nenhum aceitou e começou uma discussão bem na frente deles. Eles tinham até ameaçado nos trocar de quarto inúmeras vezes. Não estava nem aí com isso. Fomos para o refeitório para o café da tarde. Para minha alegria, era bolo de cenoura com cobertura de chocolate. 

A etiqueta que aprendíamos ali dentro era clara. Existem talheres especiais para bolo. Um pequeno garfo e uma faca menor. Particularmente, ainda acho bem feminino. Comi normalmente meu bolo e fiquei de olho em quando Pedro iria chegar para o lanche, o que não demorou muito. Sentou na mesa em frente a minha e comeu rapidamente também. Enquanto estava distraído olhando para o teto de madeira do refeitório, escuto Pedro gritando, em pé, no meio de todo mundo. 

– Todo mundo aqui sabe que o Bernard deu para mim e depois virou a cara? 

Não pensei duas vezes, peguei a faca, levantei rapidamente e fui na direção dele. 

– O que você disse? – olhei bem nos olhos deles. 

Percebi que ele tinha pegado a faca também. Ele respondeu:

– Eu te comi gostoso e você apaixonou. Mulherzinha. 

Não pensei duas vezes e enfiei a faca na barriga dele. Quando estava com a faca ainda dentro dele, percebo que ele também tinha enfiado a faca na minha barriga. O sangue derramava por toda nossa roupas e escuto a movimentação dos padres chegando: 

– O que está acontecendo aqui, garotos? – disse um deles. 

– Minha nossa senhora! Padre Gabriel, arrume o carro que vamos ter que levá-los para o hospital – disse padre Antônio, que era o responsável pela cozinha. 

Ainda sem fazer nenhuma movimentação, com muito custo, deitei no chão com a faca ainda na barriga. Vi de longe a médica Cíntia correndo com duas macas e com um maleta.

– Afaste-se todo mundo. Preciso de quatro pessoas para me ajudar a colocá-los na maca. Com muito cuidado – ordenou a médica. 

Com muito custo, deitei na maca e vi que Pedro também havia deitado. Escutei o diretor da instituição dizendo:

– Onde a senhora pensa que vai levar esses garotos? 

– Para o hospital. Aqui não tem infraestrutura alguma para retirar essa faca e conter o sangramento. 

– Sinto muito. Eles não saem daqui sem autorização – disse o diretor com tom agressivo. 

Bernard - Agilmar FerreiraOnde histórias criam vida. Descubra agora