Capítulo 7 - Parte III

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– Eu não posso fazer nada. Apenas o padre Gabriel, Bernard. Desculpa aí, irmão. 

Pedro se levantou e foi direto para sua cama. Fiquei olhando para as ripas de madeira que sustentavam o colchão de cima por horas e horas. No outro dia, Pedro estava bastante ansioso. Andava de lá para cá o tempo todo. Eu até cheguei a dizer para ele: 

– Calma, cara. Você vai ter um troço ainda. Mas me conta aqui, qual é seu plano? 

– Você acha mesmo que vou te contar? Nem te conheço direito. Você está aqui há poucos meses e já se acha o espertinho. 

Apenas bati com minhas mãos no ombro dele, andei alguns metros. Olhei por sobre o ombro e disse: 

– Talvez eu não seja digno de sua confiança mesmo. 

Sai do pátio e fui direto para a sala de aula. Fiquei ali sozinho por algum tempo, observando pela janela a movimentação de Pedro. Não tinha novidade alguma, ele apenas olhava ansiosamente para seu relógio de pulso e fazia aquele movimento repetitivo. Era cansativo ver aquilo. 

Observei que não era apenas eu que estava observando. Padre Gabriel, enquanto apitava o jogo de futebol, o olhava a todo momento. Eu queria saber de todo jeito como ele iria fugir dali. Não demorou muito tempo para que alguém chegasse na sala e me perguntar: 

– O que você está fazendo aqui a esta hora? Ainda faltam vinte minutos para iniciar a aula. 

– Estou apenas descansando, Padre. 

– Descansar do quê? Vocês não fazem nada e alegam estar cansados. Volte já para a quadra. 

Não me mexi da cadeira. Padre João já sem paciência diz: 

– Seja lá o que você estiver aprontando, pode parar agora. Aqui as normas são rígidas. Você ainda não conhece a sala vip, não é? 

Olhei para ele e perguntei: 

– O que é sala vip? 

Ele deu um sorrisinho irônico. 

– Não sabe o que é sala vip? 

– Não – respondi. 

– Nunca queira ir lá – padre João saiu rindo da sala. 

"Agora, pronto", pensei. Além de eu estar no inferno, ainda tem uma sala vip? Deve ser a salinha onde o capeta está com o espeto, esperando alguém ir lá para fazer companhia. Ou a sala vip é uma sala onde veremos alguma mulher neste mausoléu? Pouco provável. 

Volto a olhar pela janela e observo que Pedro e Padre Gabriel não estão mais lá. Procuro por todo o canto e nada deles. O filho da puta deve estar fugindo! 

Olho para o lado da capela e nada. Chega então toda a classe com o padre Gabriel. Todos, menos Pedro. O professor entra e minha ansiedade aumenta mais e mais. 

– Bom dia, vou fazer a chamada – padre João disse. 

Logo pensei: "E agora? Pedro vai ser descoberto." Ele começou a chamada e todos responderam. Pedro era o último da lista. Quando ele disse: 

– Pedro. Logo respondi em outra voz: – Presente. 

Todo mundo me olhou e coloquei minha mochila em sua carteira. Bosta! Agora alguém vai me dedurar e vão caçar Pedro. 

– Bernard, cadê o Pedro? – perguntou Lucas atrás de mim. 

Olhei para trás e respondi: 

– Está no banheiro. 

Ele não me incomodou mais. Porém, a minha tentativa de ajudá-lo foi pela culatra quando, no meio da aula, o padre João perguntou para a classe: 

- Cadê o Pedro? Olhei apavorado e respondi rápido. 

– No banheiro, professor. Não está passando muito bem. 

Ele me olha desconfiado e sai da sala. "Fodeu!", pensei. 

O professor demora um tempão e fico apreensivo. Me levanto um pouco e olho pela janela. Para minha surpresa, vejo Pedro, padre João e o diretor da instituição segurando-o pelo braço com uma agressão visível. 

Todo mundo segue a minha atitude e olha também. Foi uma euforia na sala e começou a gritaria. Não demorou muito para chegar algum padre idiota e nos banir. 

– Vocês viram pela janela? – perguntou o padre. Todo mundo senta rapidamente e olham para ele – Não tentem fugir daqui. Aqui vocês têm tudo o que precisam. Moradia, alimentação, segurança e saúde. 

Abri a minha boca para responder, mas me contive. A gente tem tudo mesmo. Bebida, abuso sexual e prisão. O padre devia saber o que é ser mantido praticamente preso sem cometer nenhum crime. 

A rotina árdua segue normalmente. E vejo que Pedro não volta para o dormitório. Padre Gabriel também não retorna. Quem o substituiu naquele dia foi outro padre que nunca havia visto na vida. Não consegui dormir naquela noite. Esperava logo o café da manhã para ver se conseguia avistar Pedro. Sem sucesso. Os padres pulavam o nome dele da chamada, sua cama estava intacta e ele não apareceu em nenhuma atividade. Fiquei preocupado com a frase que ele tinha dito: 'Aqui as pessoas morrem de morte natural!' 

Passou uma semana e revi o padre Gabriel. Não pensei duas vezes e fui correndo para perguntar: 

– Cadê o Pedro, padre? 

– Descansando meu filho. 

Olhei com fúria. Queria dar um murro nele e soltei: 

– Descansando ele não está. Vocês acham que sou burro? Ele sumiu e aposto que deve estar morto essa hora. Vocês são um bando de assassinos. 

Ele me respondeu com o mesmo tom. 

– Você está louco de falar assim comigo. Vá agora para a capela e reze cem Ave Marias e cinquenta Pai Nossos. Depois disso, vá até seu dormitório e veja se Pedro não está lá. 

– Não vou fazer nada disso. Quero ver ele agora. 

Todo mundo olhou para nossa pequena discussão. Dois padres que estavam tomando o café da manhã se levantaram e foram em nossa direção. 

Padre Gabriel disse para o padre Moreno: 

– Leve este garoto agora para a capela e o faça rezar cem Ave Marias e cinquenta Pai Nossos. 

– Eu já disse que não vou – respondi e tentei correr. 

Padre Moreno me segurou pelo braço e disse gritando: 

– Vai, sim. Você vai fazer isso, nem que seja a última coisa que faço aqui. Escutou, moleque? 

Bernard - Agilmar FerreiraOnde histórias criam vida. Descubra agora