Capítulo 8 - Parte II

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Olhei assustado para ele e discordei. 

– Não cara, eu nunca vou fazer isso na vida. Tá ficando louco? 

Ele segurou meus ombros, olhou no fundo dos meus olhos e disse sério: 

– E você tem uma opção melhor? 

Olhei para o chão e disse: 

– Não! 

– Ele falou também que tem um lugar pra gente dormir! E se toparmos, poderíamos ir para lá hoje mesmo. Mas é o seguinte. Vinte reais por dia que dormirmos lá. E tem que pagar no dia – Pedro disse. 

Ainda olhando para o chão, respondi: 

– A gente não tem dinheiro nem para comer direito. Como vamos pagar isso? 

– Você é burro, Bernard? A gente aceita o trabalho e pronto, cara. Se for de aviãozinho, é dez por cento nosso. E se for prostituindo, pagamos mais vinte pelo ponto. 

Que belo trabalho! Acho que em nenhuma vez na vida tinha pensado nisso. É como se alguém virasse para você e perguntasse: "Só tem Pepsi, pode ser?" E como eu não tinha dinheiro para comprar uma Coca-Cola, respondi: 

– Pode ser! Você vai fazer o que, Pedro? Se prostituir ou vender drogas? 

Pedro olhou longe e disse: 

– Não sei. Ele disse que, se a gente topar, começamos amanhã mesmo. Ou seja, temos até amanhã para pensar. 

Pedro então foi ao encontro com os caras, foi coisa super rápida e logo voltou. Me chamou para ver o local onde "alugamos" e de cara disse: 

– Vinte reais por um beco na rua? 

Não havia porta, não havia janelas, não havia nada. Na verdade, tinha sim: dois colchões velhos jogados e alguns panos sujos no canto. O teto era forrado por uma lona velha. Alugamos um espaço de dois metros quadrados. Não sabia o que era pior, o novo lar ou o antigo. 

Anoiteceu, pegamos os colchões mofados, os panos sujos e nos cobrimos. Sentia saudades de tomar um banho. Havia dias que não tomava. Aquele lugar tinha uma coisa especial. O vento não batia forte sobre nós, era mais quentinho e tínhamos a tal segurança prometida. Não trocamos muitas palavras naquela noite, houve apenas uma pergunta de Pedro: 

– Já decidiu o que vai escolher? 

Não respondi, fingi estar dormindo. Ele não perguntou mais nada e peguei no sono. 

– Moleque, volta aqui – disse minha mãe. 

– Não fui eu, mamãe. Eu juro por Deus – respondi. 

– Você não tem vergonha de mentir, não? Ela pegou um cinto e começou a despejar toda a raiva sobre mim. 

– Para, mãe, está doendo – gritei. 

– Se não fosse para doer, eu fazia carinho. 

Eu olhava para ela sem entender porque me batia com tanta raiva. Havia um detalhe especial nela. Estava vestida com farda militar e com um crucifixo enorme enrolado em um terço na sua mão esquerda. Olhei para trás e lá estava meu pai com uma faca na mão, tentando correr para onde estava e não conseguia. Ele falava várias coisas e não saía som algum. Suas tentativas de sair do lugar eram em vão. Parecia estar preso por detrás de um vidro. 

Minha mãe continuava a me bater, parava por alguns minutos e rezava o Pai Nosso. Era super mecânico. Batia e rezava. Quando ela virou o cinto para o lado da fivela e fez o movimento para me bater, eu despertei do sonho.

Bernard - Agilmar FerreiraOnde histórias criam vida. Descubra agora