Charlie

11 2 0
                                    

Aquela conversa de manhã tinha sido um pouco longa, até demais do que eu costumo ter, geralmente eu sou sozinho  e ter esses dois pra discutir algumas coisas foi algo muito bom. Eu e Charlie não podemos falar muito das nossas experiências de vida, já que só tínhamos, eu 16 e ele 17, a Rebecca a também tinha 17, esses dois sempre me zuavam por isso, sendo que só era alguns meses de diferença.

Mas voltando a conversa, o Senhor Jones disse que depois que seu primeiro filho nasceu, o pai do Charlie, ele decidiu manter uma imagem de família tradicional, mas só para seus filhos. O Senhor Jones era apaixonado por música, ele tinha e ainda deve estar lá naquela casa o porão que era cheio de coisas relacionadas a música.

Logo que entrei lá pensei "velho desgraçado me tratava mal por conta do Marilyn Manson, mas é você que tem em looping na tv o vídeo do Ozzy Osbourne comendo a cabeça de um morcego" depois dessa minha distração com o vídeo dei uma pequena olhada em volta e fiquei impressionado por uma das paredes que tinham inúmeras fotos que ia do preto-e-branco ao sépia que mudava para o colorido logo mais o digital e por ultimo full hd, e o mesmo era com ele em cada foto mudando as roupas de acordo com movimento da época ou festival, e sobre festivais ele tinha do seu primeiro em woodstock até o último knotfest, me senti emocionado em ver a felicidade da vida dele ao passar dos anos.

não conseguia nem mais lembrar das vezes que fui tratado mal, eu só queria lembrar desse novo senhor Jones que já estava com pouco tempo de vida, afinal ele não mais o jovem que não precisa acordar cedo para tomar remédios e até sua insulina matinal. Teve uma vez em que eu dei uma barra de chocolate pra ele e claro ele havia ficado puto comigo, descobri naquele dia que era mentira, ele me pediu desculpas por várias coisas, coisas que eu nem lembrava.

Ainda lembro que terminamos aquela manhã com David Bowie, para ser mais exato com changes do David Bowie e iniciamos a tarde com Californication.

Depois da música do Red Hot subi até o quarto da Rebecca e a vis se vestir e fomos ao studio tattoo, nome simples, mas o tatuador era bom e marcamos a primeira tatuagem dela, teríamos que esperar três dias até isso acontecer.

Ela não me contou o que ia fazer, ela tinha dado um jeito de falar apenas para o tatuador, ela provavelmente queria que eu a incomoda-se para poder descobrir, né fiz isso fiquei na minha. Ela não choro e disse que não sentiu muito dor ela também me disse que seria algo pequeno como primeira tatuagem e ela decidiu fazer uma flecha com uma pena em aquarela no antebraço, assim que terminou vi no olhar dela que iríamos voltar lá ainda naquele ano.

Como eu havia pensado voltamos lá uma outra vez, mas diferente da primeira essa tivemos que ir com o Senhor Jones já que o tatuador percebeu que éramos de menor, só não sei como não tinha se ligado antes.

Dessa vez ela tinha feito os nossos nomes de killjoys que inventamos para nós, ele tinha tatuado nos antebraços e eu fiz igual, mas nos braços, no esquerdo era o dela "blackstar" junto de seu símbolo que era uma simples estrela negra logo embaixo e no direito o meu "star cross" que tem o símbolo de uma estrela em pentagrama com a última ponta não encostada na primeira sendo puxada para baixo e sendo feito uma cruz de ponta cabeça...

Foi tudo tão bom, até o final desse ano, mais precisamente na nossa formatura que eu, a Rebecca e o Charlie passamos um mês inteiro nos preparando para uma apresentação musical em que o Charlie cantou Death Of A Bachalor, depois de longos ensaios usando roupas normais descobri no dia o figurino que iríamos usar, era uma gravata, um colete e mais a camisa social que juntas deixa um estilo de um gigolô, que seria para o Charlie.

Havia também um vestido bem demarcado que iria deixar muito bem a mostra o corpo da Rebecca, enquanto que eu deveria ter um blazer junto com uma camisa social (igual ao Brendon)... Mas eu achei estranho quando os dois pegaram as sociais e jogaram o vestido em mim, eu sei que nós três juntos não era algo normal, e graças a esses dois a cada dia que passava eu sentia que explorava cada vez mais esse meu lado feminino, era como se eu já estivesse estabelecido meu lado hétero com a Rebecca, mas não tivesse ninguém para o meu lado gay, eu não estava querendo aceitar, até aquele momento.

Ainda lembro e ainda tenho guardado esse vestido, que estava preso pelo meu pescoço por um pequena cinta e na cintura era bem apertado ao meu quadril, tendo só um pouco do que realmente deveria ter de tecido para tapar meu peito e tinha um decote enorme, que não funcionava da forma sexy que funcionaria se fosse a Rebecca usando sem contar que era aberto deixando todo a minha perna esquerda livre, e a cor?! Era cinza para continuar a temática preto-e-branco da apresentação, mas o salto era preto, salto quinze que eu já tinha até o costume de usar.

Em segredo tinha ficado com inveja só de pensar em um dos outros dois usarem, provavelmente eles sabiam que eu gostaria e acharia genial fazer a apresentação assim.

Foi algo tão bom para mim, eu estava super feliz, mas tinha que me acalmar e entrar no palco logo após que o Charlie dissesse o que seria apresentado... As luzes se apagaram e eu entrei, só se via a minha silhueta andando até eu ficar por trás dele e puxar um isqueiro de seu bolso, assim que puxei fiquei de costas para a plateia e Charlie iria pular do palco e cantar na altura do público, assim que ouvi batendo os pés no chão por conta da queda tirei o cabelo do rosto com uma das mãos e com a outra iluminei meu rosto com o fogo do isqueiro, ouvi a música iniciar e a voz de Charlie começando a ecoar pelo local, comecei a dançar, essa primeira parte era eu sozinho até a Rebecca entrar e ficarmos só nos olhando enquanto dançávamos e já na terceira parte ficávamos próximos e a música dava uma pausa para a voz e volta com tudo e nessa hora notei que todo aquele ensaio em que eu a conduzia serviu para ela saber o que deveria fazer, e fez me sentir leve e até me segurar em momentos e o mais importante foi ela sempre sorrindo pra mim igual no ensaio quando brincávamos e a puxava para um beijo, ela me puxou também no palco, mas fez diferente, ela me segurou pela minha perna livre me deixando quase cair no chão, mas ela segurou até podermos ouvir os últimos estalares de dedo do Charlie e as luzes se apagaram, caímos no escuro porque ela não aguentou mais o meu peso, tivemos aplausos e luzes eram acesas novamente para os agradecimentos, porém plateia só viu o nosso último beijo naquela noite, o beijo que achei que seria o último que daria na boca dela...

Mudanças Pelo caminhoOnde histórias criam vida. Descubra agora