IX

195 44 19
                                    

Um feixe de luz iluminava uma parte do chão do quarto. Os desenhos, que antes se encontravam nas paredes, estavam espalhados no meio da escuridão. Os pássaros lá fora já cantavam, mas o menino não se levantou.

Tyler encarava aquela linha que a luz criava, iluminando os papéis. Não conseguia piscar, seus olhos ardiam, estavam pesados demais para qualquer movimento. Sua mão estava estendida do lado da cama, o moletom estava puxado até os cotovelos, revelando seu antebraço. Tyler finalmente virou a cabeça para olhar o que tinha feito.

Onde sua mente tinha ido.

Ele sentiu a garganta arder e os olhos ficarem úmidos. Estava se sentindo um lixo, ou pior, estava se sentindo um nada.

O menino respirou fundo, controlando as lágrimas e praguejou baixo quando tentou se levantar, mal tinha forças. Porém, precisava fazer algo antes que algum familiar aparecesse. Ele se pôs sentado, olhando as linhas de sangue que se estendiam do braço para a mão, onde havia escorrido alguns centímetros. Levou a mão limpa à boca evitando que seu choro fizesse barulho.

O que tinha feito?

Se levantou o mais rápido possível jogando as roupas que usava no cesto, quase soltando um grito ao tirar o moletom que passou roçando nos machucados. Entrou no banho quente e se arrependeu assim que sentiu o braço arder, mas continuou parado debaixo d'água. Seus cabelos cresciam, molhados eles grudavam nas laterais de seu rosto enquanto tinha a testa apoiada no box. Ele pensava no dia anterior, pensava nas palavras de dor que tinha dito para Josh. A única pessoa que chegara perto de ser seu amigo, mas depois do que tinha feito... não sabia se iria voltar a vê-lo.

Então, no meio dos seus pensamentos, escutou a campainha lá em baixo. Ele tremeu.

Como uma onda de eletricidade, ele lavou rapidamente onde o sangue havia coagulado. Não passou nem um minuto e já estava se secando, indo para o guarda-roupa logo depois procurar algo. Não pensou duas vezes antes de pegar uma blusa branca e vestir assim como sua calça preta. Quando terminou, ele lembrou do ocorrido, mas escutou passos na escada, então só deu tempo de pegar a jaqueta mais próxima e vestir. A porta abriu.

-Bom dia, filho. - Kelly falou parada na porta, vendo o filho sorrir para ela.

-Bom dia, mãe. - respondeu e notou o olhar dela sob o quarto. Ele então viu os desenhos que tinha arrancado das paredes, todos espalhados pelo chão. Engolindo em seco, falou a primeira coisa que pensou. - Estava sem espaço para os mais novos, decidi guardar esses em uma pasta e pendurar os outros. - sorriu.

Kelly não parecia acreditar no que disse, mas apenas assentiu com a cabeça.

-Vim só para avisar que tem visita. - ela falou e saiu do quarto, deixando um Tyler confuso. Ele pensou em todos os parentes que conhecia e se perguntou quem iria o visitar naquele dia. Um "feliz aniversário" atrasado, talvez.

Então, sem demorar, ele juntou todos os papéis em um monte e deixou na escrivaninha, fazendo-o arregalar os olhos para o canivete que havia deixado ali. Pegou-o rapidamente o escondendo em uma falha da madeira de sua cama, onde costumava colocar. Depois de checar tudo ao redor, saiu do quarto.

Enquanto descia as escadas, escutou uma voz e, assim que reconheceu, ele parou de andar.

Era Josh.

Ele sentiu as pernas falharem e se apoiou na parede do seu lado. Por baixo da jaqueta, sentiu o braço coçar.

Mentalmente, ele praguejou por sua mãe ter dado seu endereço para a Sra. Dun.

-Oi, Ty. - Josh disse assim que o viu parado nas escadas. Tyler então notou o quanto estava nervoso e olhou sua mãe que estranhava. Ela estava sentada no sofá da sala conversando com Josh antes de aparecer.

-O-oi, Josh... - falou quase não achando o ar dos pulmões. Depois de arranjar um pouco de forças nas pernas, ele andou até o cômodo onde Josh estava sentado, sua mãe se levantou.

-Quer algo para comer, Joshua? O Tyler ainda não tomou café da manhã. Se quiser, pode o acompanhar.

-Adoraria, Sra. Joseph, confesso que também não comi. - ele sorriu e Tyler ficou encarando aquele sorriso como se fosse a coisa mais preciosa do mundo. Josh o olhou e ele virou rapidamente o rosto.

-E-eu só vou comer cereal, mãe. Obrigado. - avisou e foi em direção da cozinha, pegando sua tigela e leite, então sentiu Josh do seu lado também pegando uma tigela e sorrindo para si. Ele estava tão desconfortável que ignorou e foi para a mesa, se servindo. Josh fez o mesmo do seu lado, escolhendo a cadeira mais próxima de Tyler, tudo no maior silêncio. Kelly não estava mais na sala, subiu avisando que ia ajudar Madison com algo.

Se passaram apenas cinco minutos e Tyler não podia estar mais incomodado com o único barulho que eram os dois comendo. Ele tentava controlar a tremedeira da mão, mas Josh notou quando o leite caía pela lateral da colher, fazendo-o soltar a própria na tigela.

Se curvando para apenas Tyler ouvir, ele cochichou.

-O que aconteceu ontem? Saiu correndo da minha casa e não atendia minhas ligações. - ele parecia muito irritado, fazendo Tyler tremer mais que tudo. - Ei, olha pra mim. - chamou.

O garoto finalmente olhou Josh e corou. Ele usava um moletom rosa bebê e um boné preto virado para trás, seu cabelo que fugia das laterais do boné estava cada vez mais claro. Tyler então notou as olheiras escuras embaixo dos lindos olhos de Josh.

-Tem ideia de como fiquei preocupado? - ele continuou e o garoto sentiu seus olhos úmidos. - Por favor, não faz mais isso, Ty.

Se assustando com o súbito movimento, Tyler sentiu os braços de Josh o envolvendo em um abraço. A colher de Tyler tinha caído no chão com um barulho fino para os ouvidos, mas ele não ligou. Dessa vez, ele abraçou Josh o mais forte possível, como se ele pudesse concertar todos os seus erros.

-Não quero que diga nada agora, ok? Mas, droga, Ty... - Josh sussurrava no ouvido de Tyler. - Não faz mais isso. - repetiu. Por um segundo, o garoto de jaqueta achava que Josh sabia o que tinha feito, mas, como?

Nenhum dos dois se importou com a posição desconfortável que estavam, ou com as vozes da família Joseph no andar de cima, ou com o calor que começava a fazer. Não. As sensações que sentiam nos seus corpos iam além dessas coisas. O pouco tempo que aquele abraço durou significou tanto que ninguém mexeu um músculo querendo aproveitar ao máximo aquele contato.

Então Josh se afastou para olhar Tyler que tinha lágrimas descendo as bochechas, o de boné sorriu e passou o dedão nelas para afastá-las. Um momento tão rápido, mas Tyler pôde sentir o breve carinho naquela região e fechou os olhos. Josh o encarava, notando como ele se acalmara com aquele toque e sorriu.

Mocha (Joshler) [EM PAUSA]Onde histórias criam vida. Descubra agora