17 | Às claras

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Houve um longo período de silêncio da minha parte quando a poeira abaixou sobre a cena que tinha acabado de acontecer. Eu estava tentando recompor o fato de que Will, uma pessoa que eu suspeitei ser dramática e irritante, veio aqui em casa me pedir desculpas, precisando ainda abandonar a clínica para isso. Era um choque grande demais para mim; e imaginava a dificuldade que ele teve — se é que ele teve — para engolir sua raiva e vir ao meu encontro. Não sei se conseguiria fazer o que fez se a situação fosse trocada.

Trevor parecia tão entorpecido quanto eu.

— Você está bem mesmo? Ele não o machucou?

Balancei o rosto ao me sentar no sofá da sala, o rosto indecifrável até para mim mesmo.

— Pelos céus. — Trevor passou as duas mãos no rosto e sentou-se comigo, sua voz indicando alívio. — Quando Edward me ligou e disse que Will estava com você...

— Ele precisava de ajuda — sussurrei bem distante, relembrando das palavras de seu ex comigo. Olhei para Harper. — Ele veio aqui para isso.

Trevor me observou por um tempo arrastado, confuso demais para dizer algo.

— Ele me pediu desculpas — expliquei. — Depois de tudo o que fez.

— O quê? — Seu olhar foi mais estreito. — Ele não veio para mais ameaças?

Tornei a balançar o rosto.

— Vi uma outra pessoa na minha frente — falei, ainda entorpecido por relembrar das lágrimas escorrendo pela face de Will. — Era sincera demais para eu achar que estava mentindo, sabe?

— Espera... — pediu Trevor, vindo para mais perto de mim. Era tangível seu desnorteio. — Ele veio somente para pedir seu perdão? Mesmo antes de Edward ter puxado a arma?

— Sim.

Ele ficou calado, mas sua expressão dizia perfeitamente o que sua voz não conseguia.

— A clínica o ajudou, eu acho — continuei, suspirando lentamente. Meu olhar parecia atravessar o corpo de Trevor, pois o foco não vinha. — Bom, pelo menos foi isso o que ele disse.

Dei de ombros, inspirando com força.

— Compreendo — disse passando a mão na barba, tão longínquo quanto eu.

— E... — Cocei a cabeça, apertando os olhos. — Eu fui atrás de você quando saiu.

Rapidamente fiz suas feições retornarem.

— Fiquei preocupado com a forma como você atendeu o telefone e pensei que fosse Heitor. Só... achei que deveria saber. Fui com Edward.

Ele balançou a cabeça, mas seu rosto estava longe de ser zangado.

— Presumi que fosse fazer isso assim que saísse — admitiu. — Mas pensei que talvez pudesse ainda assim estar errado. — Ele demonstrou um sorriso daqueles onde você quer revirar os olhos. Eu queria vê-lo fazer esse gesto, embora ele não tivesse feito. — Você não tem jeito.

— Fiquei com medo.

— Agora quem está preocupado com quem? — Ele moveu sua mão pela lateral da minha cintura e beijou meu pescoço castamente, descansando seu nariz na minha pele. Estava carinhoso, eu notei, talvez porque tudo o que passamos significou um alívio. — Não posso dizer o que tem ou não o que fazer, Chris. Se eu pedi para ficar, é por causa de sua perna. Não entenda que estou ordenando-o.

— Isso nem passou pela minha cabeça — admiti com certo humor, acomodando-me mais no sofá só para dar mais conforto a ele. — Sem contar que eu nunca deixaria isso acontecer.

EU ENTREGO MINHA VIDA A VOCÊOnde histórias criam vida. Descubra agora