Capítulo 4: Dylan

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Naquela época eu sempre te via como a minha Mia. Aquela mesma que sempre dividia comigo os fones de ouvido, aquela que eu beijei no chão do meu quarto. Mas agora não consigo te ver da mesma forma. Sempre que fecho os meus olhos você continua lá, mas não é a mesma. E nem eu me sinto da mesma forma.

Seus olhos estão opacos, seus cabelos sem cor, seu rosto mais pálido que o normal, seus pulsos cobertos de sangue, e seu corpo quase sem vida.

Eu te beijo, como se aquilo fosse trazê- lá de volta, ou me fazer despertar daquele pesadelo. Sempre que fecho os olhos você esta lá Mia, mas você está morrendo, eu posso sentir sua vida escorrendo pelos meus dedos. Você está indo embora e eu não sei o que fazer para te salvar. Mas você continua lá.

*************

Ouço uma batida na porta. Abro meus olhos, piscando varias vezes contra a luz, até focar na imagem do meu pai de pé apoiado no batente da porta.

- Chegou faz tempo? – Pergunto a ele

- Provavelmente estou parado aqui faz uns 30 minutos. Acho que aproveitei para tirar um cochilo - ele brinca e entra no quarto.

A proposito o quarto é exatamente igual ao outro. Aquele onde nos beijamos. Sempre pensei que um dia você, Mia, viria aqui e notaria a semelhança. Nunca pensei em muda-lo, porque ele sempre me fez pensar em você.

- Onde está a mamãe? -Pergunto me sentando na cama, bato no espaço livre ao meu lado, ele senta.

- Quando sai do hospital sua mãe estava entrando em uma cirurgia. - ele diz e coça os olhos sonolentos.

- Achei que sairiam juntos do plantão.

- É, na verdade resolvemos cobrir o plantão da Linda. – ele responde

- Linda? Linda Wallace? - pergunto

- Ela mesma. Ela pediu o dia de folga. A Mia sai hoje do centro psiquiátrico.

Eu não podia acreditar naquilo. Ela estava bem, e estava voltando pra casa. Hoje!

- Desculpa filho, eu devia ter contado a você. Ao menos falado como ela estava. – ele diz parecendo culpado.

- Tudo bem pai.- mas na verdade não estou nada bem. Meu coração começa a bater rápido demais.

- Você está bem? - ele pergunta

Faço que sim com a cabeça

- Tudo bem então. - ele fala e levanta da cama. - eu vou tomar um banho e depois podemos sair pra comer uma pizza.

- Isso me parece ótimo. - respondo

- Uhull, pizza! - ele grita indo em direção à porta. – só não conta pra sua mãe. Ela não quer me ver comendo carboidratos. – ele pede e segue cantarolando até o quarto.

Eu solto uma risada, não consigo evitar.

- Ok pai, esse será o nosso segredo.

***************

Vou até o quarto do meu pai e bato na porta.

- Pai? - chamo. - não me diz que você tá dormindo. Eu estou morrendo de fome.

Ouço um resmungo do outro lado da porta. Entro no quarto.

Encontro meu pai, ainda de roupão jogado na cama, dormindo.

- Pai – chamo-o novamente- acorda!

Ele solta um resmungo e vira de lado.

Droga.

Pego a carteira que ele sempre deixa em cima da cômoda e pego algumas notas de vinte e de dez.

- Desculpa pai mais você me deve essa - digo e saio do quarto.

Pego o celular para ligar para a pizzaria, mas acabo desistindo. Pego as chaves de casa e caminho até a porta.

Caminho até a pizzaria que fica a quatro quadras de distância, e faço o pedido de sempre. Meio Margarita, Meio Mussarela.

- Você devia ter ligado - diz a moça do caixa. Acho que o nome dela é Danna.

- Eu precisava caminhar um pouco - respondo

Ela assente uma vez.

Pago e sigo para a fila de entrega. Fico encarando um papel grudado na parede que diz: Precisamos de ajudante.

- Ei Dylan - diz Danna. Olho na sua direção. - Tá afim de curtir um show esse final de semana.

Ela estava me chamando pra sair?

- Eu ia adorar, mas não posso - minto

- Tudo bem - ela diz - fica pra uma próxima

- Ei – falo para ele – Você acha que eu teria chances? – pergunto a ela e aponto para o cartaz da parede.

- Eu acho que você pode tentar – ela diz e sorrir.

Faço que sim.

Pego minha pizza e começo a fazer o caminho de volta ate a minha casa, viro na esquina e é ai que a vejo.

A principio penso que é uma miragem, uma alucinação. Fecho os olhos e volto a abrir , e ela continua lá.

Vejo sua mãe, Linda, descer do carro, carregando algumas sacolas e um buquê de flores. Flores do campo. Mia é alérgica a flores do campo. Ela gosta de rosas, rosas na cor amarela. Um gosto bem peculiar por sinal.

Ela está segurando um pacote, sua mãe lhe entrega uma sacola, ela pega e depois solta. A sacola cai no chão, vários frascos rolando em direção a rua. Quero correr para ajudar, para dizer 'Oi Mia, como você está? Que bom que já esta em casa', mas minhas pernas não me obedecem.

Ela fala alguma coisa, parece chateada. Sua mãe corre para ajudar.

Ela se abaixa para pegar um frasco do chão e ai tudo parece acontecer em câmera lenta. Ela abaixa, pega o frasco e olha para cima, bem na minha direção.

Parece surpresa ao me ver.

Ela sorri e eu continuo lá, parado na calçada, olhando para ela e me perguntando o que será dali pra frente.

Estilhaços - RepostandoOnde histórias criam vida. Descubra agora