Capítulo 14- Dylan

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Apago as luzes, tranco as portas e saio para a rua.

Tento ignorar a dor latejante da minha mão, que agora está inchada e adotando um tom estranho de verde com roxo.

- ...Please, please, please... – Cantarolo a melodia que toma meus sentidos.

Dou a volta ao redor da pizzaria, e tomo o caminho de uma praça.

E é ai que a vejo.

A principio penso que é uma alucinação, algo da minha cabeça. Mas vejo-a se mover.

Ela está sentada em um dos bancos da praça, semi escondida por alguns arbustos. Tem um livro sobre os joelhos e está levemente inclinada sobre ele. Ela vira uma página e continua lendo. Vejo um sorriso brotar em seus lábios, e ela solta um suspiro curto levando uma mão a boca para morder a unha do polegar, os braços cobertos por um casaco de mangas longas na cor cinza. Imagino que esteja lendo, mais uma vez, Orgulho e Preconceito, e sorrio diante desse pensamento.

Continuo parado no meio da rua, olhando para ela. Não estou mais dando a mínima para a minha mão, ou para musica que começa a tocar nos meus fones.

Um cara na bicicleta passa por mim e xinga para que eu saia da frente. Saio da frente com um sobressalto e quanto volto a olhar para ela, ela está me encarando de volta.

Os olhos tomados por um brilho intenso, os lábios entreabertos em um sorriso tímido, os cabelos levemente avermelhados, num contraste incrível com a pele branca demais.

Ela parece um sonho.

Olho para os lados, consciente de que certamente estou fazendo papel de bobo, e começo a caminhar até ela.

Ela fecha o livro, mas antes dobra a ponta da pagina, e o põe de lado no assento, não é o clássico da Jane Austen, percebo. Corro os olhos pelo nome da autora... Sylvia Plath.

- Oi – eu digo enquanto me aproximo.

Tudo o que eu queria era abraça-la e senti-la junto a mim. Mas apenas fico lá, olhando-a de cima para baixo.

Ela, ainda sentada, levanta a cabeça e sorrir.

- Oi, Dylan – ela fala.

- Oi, Mia – minha voz sai grossa, estranha.

Há muito que eu não pronunciava o nome dela. Não dessa forma, com todas as letras.

Ficamos ali, um olhando para o outro, sem dizer nada. É como se eu pudesse sentir o ar ficando cada vez mais denso, pesado, como se tudo o que temos a dizer um ao outro se acumulasse naquele pequeno espaço entre nós, mas no final, optamos pelo velho e confortável silêncio.

- O que faz aqui? – pergunto, incapaz de manter o eco dos meus pensamentos por mais um segundo sequer.

- Precisamos conversar. – ela diz – E eu queria ver você. Acho que merece mais do que me encontrar em uma cama de hospital. – ela continua.

Meu coração dá um salto. Ela me ouviu?

- Eu devo isso a você- ela continua.

- Você me deve muitas coisas, Mia, e ao mesmo tempo não me deve nada. – eu digo a ela num sussurro.

- Eu sei, eu sei – ela diz e levanta.

Ela é tão pequena – eu penso.

- Por favor, só não me peça mais do que eu posso lhe oferecer agora – ela fala.

- Eu não estou pedindo nada, Mia – eu ficava repetindo o nome dela, tentando me convencer de que tudo aquilo era real. – Não pedi que viesse aqui, e nem que...

Estilhaços - RepostandoOnde histórias criam vida. Descubra agora