Brilho da lâmina

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A trilha terminou em uma grande clareira aberta. Dali era possível avistar um morro de pedras irregulares que descia íngreme até o chão, perdendo-se no meio do matagal cinzento. Do alto podia ver algumas tendas camufladas, entre folhas e galhos. Lonas pretas estiradas entre as copas das arvores, onde de tempos em tempos alguém se movia sorrateiro por baixo. A maioria dos militantes havia abandonado o lugar, possivelmente as pressas, pois diversos caixotes estavam espalhados, bem como roupas e até alguns mantimentos.

Slasher caminhou através do acampamento, alerta ao movimento dos homens que se moviam sorrateiros como cobras por trás das arvores e pulavam sobre os galhos. Irumi seguia o caçador de uma distância segura. Era obvio que os guerrilheiros haviam lhes deixado entrar na região, caso contrário teriam sido recebidos com uma saraivada de tiros. O que ela não conseguia entender era o porquê disso.

Irumi observou as pedras e concluiu que aquele paredão de rochas, foi o que tudo que restou de uma antiga cachoeira. A formação rochosa garantia uma proteção natural ao acampamento, mantendo-o escondido nas sombras. Haviam um atirador, visivelmente posicionado na fenda da muralha de pedra. Apontava o rifle para os dois intrusos. Irumi olhou apreensiva pra Slasher, que continuava a caminhar.

Troncos de madeira foram enterrados no chão, e pequenos estrados de bambu facilitavam o acesso entre as tendas, espalhadas ao redor das rochas e arvores. As marcas de pneus riscavam a lama em diversas direções e desapareciam na orla da floresta. Bem no centro do lugar havia uma gigantesca arvore, completamente torcida do tronco até a copa, forrada por uma folhagem cor de rosa. Nos galhos haviam bandeiras da Amizade de Rivera: três faixas azuis nas diagonais sobre um fundo vermelho e um A.R. estampando no centro. Na base da gigantesca arvore estava montada uma tenda, uma mesa de madeira improvisada, com várias latas e caixotes em volta.

- Piúva... - murmurou Irumi. - Essa arvore é uma piúva. Uma árvore muito antiga e que aparece em locais onde tem muita água. Talvez essa seja uma das últimas que exista na região...

- ..E o mercado negro paga uma fortuna pelo metro dessa madeira. - uma voz masculina vinda de dentro da tenda surpreendeu a dupla.

Um homem surgiu pela abertura no tecido. Era jovem e alto, tinha os cabelos cacheados e a barba rala. Usava um par de óculos de visão noturna, que repousavam na cabeça, como uma tiara. A fumaça fedorenta da erva preta saia em espirais do cachimbo de osso que segurava entre os dentes. Vestia uma jaqueta de jeans azul, rasgada em diferentes lugares e por baixo um pesado colete a prova de balas. As calças camufladas tinham duas bainhas atadas a perna e panturrilha, uma para o facão e a outra para a adaga. Um reluzente cinto de balas cruzava seu peito e terminava na alça de uma metralhadora de um modelo muito antigo. Tinha a expressão bem serena e observou os dois de forma quase cordial.

Slasher acompanhou cada passo do homem, caminhava lentamente em direção a mesa de madeira. A cada passo que ele dava, as folhas secas crepitavam no chão. Os guerrilheiros se movimentavam ao redor, o som das armas sendo engatilhadas era um recado para que soubessem que só entraram ali por que ele próprio havia permitido.

- Meus batedores viram vocês entrando pela trilha oculta. Dei ordens claras de que deixassem vocês virem até mim. O senhor é muito habilidoso, senhor Slasher. - ele apoiou as mãos na mesa. - Mas eu tenho olhos em todos os lados dessa floresta.

- Então deve ter visto o que eu fiz com sua quadrilha de esfarrapados. -debochou Slasher.

Mais uma baforada no cachimbo, e o resto do cheiro podre se esvaiu no ar.

- Aqueles não eram meus homens. Eram guerrilheiros da Amizade de Rivera. Igualmente como aqueles que você matou naquela casa. Somos todos amicos aqui.

A REDENÇÃO DOS MALDITOS  | A Cidade dos Santos EnforcadosOnde histórias criam vida. Descubra agora