9 - Lay in the atmosphere

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9 meses antes

Depois que Taehyung descobriu sobre mim e (s/n), eu me sentia constantemente vigiado por ele. E talvez realmente estivesse, afinal, sempre que tinha uma oportunidade, o garoto adorava soltar um comentário inoportuno. Um dia estávamos eu, (s/n), ele e Yoongi hyung quando do nada, sem explicação nenhuma, ele me veio com um "vocês são uma gracinha um do lado do outro". Ainda bem que rapidamente a situação foi concertada porque eu estava ao lado de Yoongi hyung, o que não amenizou de maneira alguma o nível dos meus batimentos cardíacos. Qual era o problema dele? E por que ele continuava me chamando de oppa? Questionamentos que eu nunca chegarei a resposta, ao menos não nesta vida. Por isso eu escolhia depositar o meu foco em coisas como a cor de cabelo de (s/n), que ficava linda sobre a luz do sol. Ela fingia me ignorar com os olhos fixos em uma edição de Blue Exorcist que eu tinha, mas eu só conseguia pensar no quão linda ela estava naquele momento. Se fosse dotado de coragem, pegaria uma câmera fotográfica e registraria aquele momento pra sempre em na máquina. Infelizmente, era uma manhã muito calma pra que eu me desse esse trabalho. Nós não nos víamos todos os dias, tínhamos que despistar quaisquer inconvenientes e evitar coincidências, por isso tentávamos transformar cada momento em único. Nem sempre isso significava algo extraordinário, pelo contrário, na maioria das vezes queria dizer assistir doramas e comer ramén. Entretanto, naquela manhã, tudo se resumia a ela me ignorando. O motivo? Eu tinha dito que Playful Kiss não era irritante. Enfim, eu não realmente me importava. Sabia que não iria durar por muito tempo.
Infelizmente, eu estava certo.
Tudo começou quando o telefone dela tocou repetidamente, três vezes, antes que ela simplesmente virasse na minha direção.
- Vê pra mim quem é?
Assenti, levantando e pegando o aparelho nas minhas mãos.
- É a Gaeul.
(s/n) franziu a testa.
- Posso atender?
- Claro.
Arrastei o visor, atendendo a ligação, e colocando em meus ouvidos.
- Alô? - Perguntei.
- Quem é? - A garota disparou do outro lado, a voz claramente alterada.
- É o Jungkook.
- Ah, oi. Pode me passar pra (s/n)? Tenho algo importante a dizer.
A voz de Gaeul estava estranhamente alta e instável, mas mesmo assim entreguei o celular pra (s/n).
- Oi, Gaeul. - Alguns segundos se passaram até que ela franzisse a testa e ajeitasse a postura. - Gaeul, o que houve? Por que está chorando?
Outros segundos se seguiram até (s/n) arregalar os olhos e estes se encherem de lágrimas, a mão dela começando a tremer. Obviamente, fiquei super preocupado e logo me aproximei, encarando-a.
- M-mas como isso aconteceu? - Ela perguntou.
Lágrimas escorriam pelo rosto vermelho dela e eu honestamente não sabia o que fazer. Só consegui ficar parado como uma estátua inútil sem resolver nada.
- Ele estava no carro com ela? - Mais perguntas que eu não saberia a resposta. - Ele tá bem?
Gaeul deve ter respondido alguma coisa que fez (s/n) respirar fundo.
- Ainda bem. É, eu... Eu preciso desligar. Obrigada por me avisar.
E assim ela desligou o celular, porém não o largou durante um bom tempo, encarando a tela e a manchando com suas lágrimas, que não desistiam de escorrer.
- (s/n), o que aconteceu? - Eu perguntei, mas não obtive resposta. - (s/n).
Então ela me olhou com o olhar mais perdido que eu tinha visto em dezenove anos de existência, e pareceu que meu mundo caiu.
- A Sana morreu.
- Sua prima? - Ela assentiu. - Mas...
- Acidente de carro. Ela e meu primo estavam... Estavam voltando de uma noitada... O carro capotou...
Ela não conseguiu mais falar durante um bom tempo, apenas ficou chorando e tremendo. Fiz a única coisa que passou pela minha mente naquele instante: a puxei pra perto de mim e a abracei fortemente contra meu peitoral, tentando ao máximo transmitir conforto e afeto. Conforme eu a apertava mais contra o abraço, mais intenso o choro dela ficava. Em um certo momento, (s/n) se afastou, apontando para o celular.
- Avisa pro... Pro Yugyeom... Manda mensagem. Ele precisa saber...
Imediatamente concordei, me levantando e indo diretamente mandar o comunicado para o garoto. A mensagem foi simples e direta, infelizmente. Não esperei por resposta, no segundo seguinte, (s/n) estava de pé, caminhando de um lado para o outro, resmungando coisas inaudíveis e repetitivas. Me aproximei, sendo afastado pelos braços dela.
- A culpa foi minha. Eu a incentivei a sair, falei que seria uma boa ideia.
- Como a culpa pode ser sua? - Tentei uma reaproximação. - Ninguém tem culpa dessas coisas, (s/a).
- Por que? Por que justamente com a Sana? Ela é uma garota tão boa, tão gentil... Como vai ficar esse mundo sem ela?
Os barulhos de choro e dor cresciam a medida que as lamentações se faziam presentes. Meu coração estava apertado contra meu peito, uma dor aguda se instalando por mim ao vê-la daquele jeito. Mordi meu lábio inferior numa tentativa de descontar minha frustração.
- Eu quero ir pra casa - ela anunciou.
- Eu te levo.
Peguei as chaves, como sempre fazia, me pondo como um fiel guarda costas ao lado dela, que negava com a cabeça.
- Mas e o Jimin?
- Dizemos que nos encontramos na rua, você estava desesperada chorando e eu achei melhor te trazer pra casa.
Ela finalmente assentiu, pondo-se a caminhar ao meu lado, pronta pra seguir seu rumo para seu lar. No caminho até a casa dela, tudo se manteve no mesmo quadro, o que não melhorava em nada a minha ansiedade ao presenciar aquela cena. Eu nunca tinha passado por algo do tipo, desconhecia a sensação. (s/n) e Sana eram próximas, o que piorava a situação. Eu mal podia imaginar, e pra ser sincero, nem sei se queria.
Assim que paramos na frente da casa, me atrevi a pegar na mão dela, que felizmente retribuiu meu toque afetuoso. Saí do carro pronto para ajudá-la, mas a garota já estava quase na porra de casa. A e acompanhei, testemunhando sua dificuldade para enfiar as chaves na fechadura, por conta das tremedeiras.
- (s/n) - a chamei. - Respira fundo.
Ela seguiu minhas instruções e conseguiu enfiar a chave, destrancado o portão de casa. Entramos meio desajeitados por conta do tapete na entrada. Poucos segundos depois de adentrarmos a moradia, passos rápidos foram ouvidos descendo da escada sem o menor cuidado. Ergui meu olhar e vi Jimin com a expressão raivosa, as bochechas infladas, os olhos pesados e o nariz vermelho. Ele também esteve chorando, a essa altura do campeonato já sabia o que tinha acontecido com a prima.
- Onde você estava? - Ele perguntou com o tom áspero.
- Na casa do Yugyeom - (s/n) respondeu, obviamente mais uma mentira deslavada.
- Eu a encontrei chorando em desespero na rua e achei melhor a trazer, hyung - completei a mentira.
- Fez muito bem, Jungkook. Obrigado. - Jimin voltou sua atenção pra irmã. - Por que não me avisou?
- Você não ia ligar muito, então achei melhor dispensar a informação.
- Nunca mais diga isso! Você realmente acha que eu não ligo pra você? Que tipo de irmão acha que eu sou? Porra, (s/n)... O que aconteceu com a Sana... Podia ser a gente.
Ao terminar de dizer aquela frase, a garota retomou o choro. Pensei em simplesmente mandá-lo calar a boca e tirá-la dali, mas não era um assunto meu, logo, não era da minha conta.
- Podia ser eu dirigindo aquele carro, não o Hoseok, podia ser você no banco do passageiro, não a Sana... Tudo isso me faz pensar, me deixa tão perdido, eu... Eu não sei o que fazer.
(s/n) chorava desesperadamente com os próprios braços ao redor do corpo, tentando amenizar a própria dor. Eu, por minha vez, simplesmente estava parado em um canto, olhando pra baixo, sem saber como me portar diante daquilo tudo.
- Só de pensar na possibilidade de fazer algum mal pra você, ser responsável por algum tipo de sofrimento seu, já me deixa com ódio. Eu não... Eu não sei o que faria se te perdesse.
Jimin se aproximou da irmã, ele próprio derramando lágrimas grossas e que marcavam seu rosto com um rastro de luminosidade.
- Posso ser rude na maioria das vezes, um verdadeiro babaca, mas você é a coisa mais importante nesse mundo pra mim. Eu não sei o que seria de mim sem você. Sinto que... Não digo que te amo o suficiente. Aliás, eu nunca digo. Me perdoa por ser um péssimo irmão.
Dito isso, ele cortou o espaço entre os dois, juntando seus corpos em um abraço apertado, marcado principalmente pela choradeira interminável e murmúrios que soavam como "me perdoe" e "eu te amo". Ali, naquele canto, completamente imóvel e tocado, tive a certeza absoluta de que não temos controle sobre nada em nossas vidas, apenas achamos que temos.
O resto do dia não foi muito diferente daquilo. Senhor e senhora Park apareceram algumas horas depois com o mesmo olhar de (s/n) e Jimin, mas me agradeceram por ajudar a filha deles e impedir que ela se machucasse por conta da notícia impactante. (s/n) por sua vez se retirou para seu quarto em função de descansar, já que o enterro seria no dia seguinte em Gwangju, do outro lado do país. Teriam de viajar de avião, mas acho que era perfeitamente compreensível. Eu estava sentado ao lado de Jimin, que encarava fixamente a televisão desligada.
- Eu ainda acho que isso é um pesadelo - ele começou. - Mas abro os olhos e vejo que o pesadelo continua. Pelo contrário, ele fica pior.
- Não vou dizer que sei como se sente, porque não sei. O máximo que posso te oferecer é o meu apoio e minha amizade, se você aceitar.
Jimin me olhou, sorriu, e pegou na minha mão, sacudindo-a.
- Que bom que sempre posso contar contigo, Jungkookie. Você pode ser tudo, menos relapso. Tenho sorte por ter um amigo como você.
Sorri, não sabendo muito bem o que responder.
- Tenho que te pedir um favor, se não for muito incômodo.
- Claro que não. Pode me pedir qualquer coisa, hyung.
- Eu queria saber se você aceitaria ir pra Gwangju com a gente. Sei que é de última hora e muito inconveniente, mas é que não sei se consigo suportar isso sozinho. Ainda mais com (s/n) do meu lado. - Ele fez uma pausa pra controlar suas emoções. - Às vezes tenho certeza que sou um péssimo irmão, aish.
- Não diga isso, hyung. Esses são seus sentimentos conturbados falando no seu lugar. E minha resposta é sim, vou a Gwangju com vocês.
No dia seguinte estávamos prontos pra seguir em direção a Gwangju. Embora morresse de medo de aviões, (s/n) estava decidida a ser uma garota corajosa diante daquela situação. Eu admirei essa atitude dela, afinal, era complicado ser forte mediante aquilo tudo. No vôo, a tranquilidade me espantou um pouco. Com a minha cabeça encostada na poltrona, milhares de pensamentos vinham na minha cabeça. Contudo, não coloquei nenhum deles pra fora. Jimin não quis se comunicar durante a viagem toda, o que me fez sentir um pouco sozinho, mas respeitei de qualquer forma. Meus olhares constantemente chegavam em (s/n), que dormia calmamente em seu lugar, como se nada pudesse a atrapalhar. Todas as partes do meu ser desejavam que isso fosse verdade, porém não era. Não passava de uma expectativa sem fundo de realidade. Por isso, então, resolvi dormir. Quem sabe dessa forma meus pensamentos se esvaissem.

Eu nunca tinha ido a um enterro. Meus pais nunca permitiram que eu comparecesse a esse tipo de evento, por medo que eu ficasse traumatizado. A questão é que a morte em si nunca me afetou tanto. Sempre a vi como algo inevitável, um fim que esperava a todos os seres humanos. Meu problema era com cadáveres. Ainda mais cadáveres de conhecidos. Isso realmente era complicado, tenho que admitir. Com a faculdade de medicina esse desconfortos ia se dissipando, mas ainda existia. Ninguém, em santa consciência, gosta de ver cadáveres.
Devido a minha falta de experiência com enterros, a primeira vez foi estranha. Eu me sentia deslocado porque não era da família e porque realmente não sabia o que fazer. Chorar? Rezar? Comer? Não, definitivamente não. O que me restava era observar, e isso fazia com louvor. De fato, quem estava pior era a mãe de Sana, que estava sendo amparada por três pessoas. Yugyeom não estava muito atrás, sendo amparado por (s/n). Hoseok, o irmão de Sana, parecia já ter chorado tudo o que conseguia. Estava largado em um canto, machucados cobrindo todo o seu corpo. Jimin se aproximou de mim, segurando algo parecido com uma cerveja.
- O que resta para os inconformados é o álcool. Como sempre, recorremos a ele pra afogar nossas mágoas.
- Sim - concordei. - Não consigo parar de achar que estou deslocado.
- Bem, não tem como ficar feliz de estar aqui. Isso seria muito estranho e errado. Mas se te serve de consolo, estou feliz que esteja aqui comigo. Nunca vou esquecer.
- Você sabe bem que eu iria do outro lado do mundo por você, hyung.
Ele sorriu.
- Quer me fazer chorar, é? Entra na fila.
Ri, mas me contive. Não é educado rir em enterros.
Um tempo após, o pai de Sana subiu em uma espécie de pedestal e anunciou que era o momento final para as despedidas da garota. Geralmente era o momento em que todos se desfaziam em lágrimas. Vamos ver se eu me enquadrava nesse meio. Discursos vieram, discursos se foram. Finalmente chegou a vez de (s/n).
- Eu poderia começar esse discurso de uma maneira completamente diferente, mas não vou. Conhecia Sana o suficiente pra dizer que ela não gostaria que eu me debulhasse em lamentações, por isso vou tomar outro rumo. Lembra de quando saíamos pra colher margaridas na plantação do tio Jaegun? Você sempre deixava as suas flores voarem, porque queria ser livre como elas um dia. Nunca entendi o que isso queria dizer. Hoje eu percebo que, por mais que parecesse um delírio de criança, foi a forma mais pura que eu já escutei alguém falar sobre liberdade. O que é ser livre, afinal? Eu não sei. Ninguém sabe. Sana não sabia, mas desejava saber.
Ela respirou fundo antes de continuar.
- Voar era um sonho que ela tinha. Sentir a temperatura do vento moldando seu rosto, a leveza que só o ar nos dá, tudo isso. Por isso ela gostava tanto de lugares altos. Sinto que por mais que a dor pareça enorme agora, Sana está voando por aí, sendo livre como ela sempre quis ser. É uma dor enorme que tenho certeza que demorará pra sarar, mas... - Ela fungou. - Como ela adorava dizer, tudo passa, sendo ruim ou bom. Enfim, Sana, quero que saiba que toda vez que eu ver uma margarida, sem exceção alguma, eu te enxergarei nela. Toda vez que uma criança soltar as flores no vento, eu lembrarei de você. Voando, livre, graciosa, como sempre quis. Você não será esquecida.
O discurso foi encerrado com palmas e lágrimas, inclusive as minhas. Não consegui me controlar. Só queria correr na direção da minha garota e dizer que tudo ficaria bem, mas não pude. E isso me matou por dentro.

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