16.

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Oi oi gente.

Outro capítulo pra compensar o tanto que ando demorando para postar ultimamente.

Boa leitura!!

[...]

O testamento em vida que Camila havia assinado no escritório do advogado era o documento que Lauren havia trazido ao hospital. Entre outras coisas, ela especificava que os aparelhos e sondas de alimentação deveriam ser desligados e desconectados após doze semanas. Hoje era o dia em que ela deveria fazer a sua escolha. Sentada ao lado de Camila no hospital, Lauren lembrou-se da conversa que teve com ela naquela noite. Ela se lembrou do juramento que fez. Ela repetiu aquelas palavras uma centena de vezes durante as últimas semanas e, conforme a marca dos três meses se aproximava, ela percebia que estava ficando cada vez mais desesperada, desejando que Camila acordasse. Assim como Taylor, e era por isso que ela iria esperá-la em sua casa quando ela voltasse. Há seis semanas ela havia contado a Taylor sobre a promessa que fizera a Camila; a necessidade de compartilhar aquilo havia ficado quase insuportável. As seis semanas seguintes se passaram sem nenhum alívio. Camila não somente não fez um único movimento, como não mostrava sinais de recuperação em nenhuma das suas funções cerebrais. Embora ela tentasse ignorar o óbvio, o relógio continuava avançando, e a hora da decisão havia chegado.
Às vezes, durante suas conversas imaginárias com ela, Lauren tentava fazer com que ela mudasse de ideia. Ela argumentava que a promessa não havia sido justa; que a única razão pela qual ela havia concordado com aquilo era a improbabilidade de que pudesse acontecer, algo em que ela nunca acreditou realmente. Ela confessou que, se tivesse a capacidade de prever o futuro, teria rasgado os documentos que ela assinou no escritório do advogado. Mesmo que ela não fosse capaz de responder, ela ainda não conseguia imaginar uma vida sem a presença de Camila. Ela nunca seria como Kenneth Baker. Não sentia nenhuma amargura em relação a Camila, e nunca sentiria. Lauren precisava dela, precisava da esperança que sentia quando estavam juntas. Ela se sentia revigorada quando a visitava.

Mais cedo, naquele dia, ela estava exausta e letárgica; conforme o dia progrediu, seu senso de comprometimento havia se fortalecido, deixando-a com a certeza de que ela teria capacidade de rir com suas filhas, de ser a mãe que Camila queria que ela fosse. Funcionou por três meses, e ela sabia que poderia fazer aquilo para sempre. O que não sabia era como poderia viver sabendo que Camila estava morta. Por mais estranho que aquilo parecesse, havia uma previsibilidade reconfortante na nova rotina da sua vida. Do lado de fora da janela, o pombo andava para a frente e para trás, fazendo Lauren pensar que a ave estivesse ponderando a decisão com ela. Havia momentos em que ela sentia uma estranha sensação de familiaridade em relação àquele pombo, como se ele estivesse tentando lhe dizer alguma coisa, embora ele não fizesse ideia do que poderia ser. Certa vez, ele havia trazido um pouco de pão, mas não tinha se dado conta de que a tela nas janelas o impediria de jogar algumas migalhas para fora. Em pé diante do vidro, o pombo olhou para o pão que ele tinha nas mãos, arrulhando suavemente. Ele voou para longe um momento depois e, mais tarde, voltou para passar o resto do dia ali. Depois daquele dia, o pombo não voltou a demonstrar medo dela. Lauren podia dar batidinhas no vidro que o pombo continuaria no lugar. Era uma situação curiosa que lhe dava algo em que pensar enquanto estava sentada no silêncio do quarto. O que ela queria perguntar ao pombo era o seguinte:

"Eu devo me tornar uma assassina?"

Seus pensamentos inevitavelmente a levavam àquela questão, e era o que a diferenciava de outras pessoas que deviam honrar os desejos descritos em testamentos. Elas estavam fazendo a coisa certa; suas escolhas estavam enraizadas na compaixão que sentiam por seus entes queridos. Para ela, entretanto, a escolha era diferente, mesmo que as razões fossem lógicas. Se A e B fossem corretos, então C também seria. Mas, com a sua racionalização de
que havia cometido uma sequência de erros, o acidente não deveria ter ocorrido; se o acidente não houvesse ocorrido, não haveria o estado de coma. Ela foi a responsável pelos ferimentos que Camila sofreu, mas ela não havia morrido. E agora, apresentando alguns documentos que ela trazia no bolso, ela poderia terminar o serviço. Podia ser a responsável pela morte da sua esposa. A diferença fazia seu estômago se revirar; a cada dia, conforme a decisão se aproximava, ela comia cada vez menos. Às vezes, parecia que Deus não queria apenas que Camila morresse, mas que Lauren soubesse que era a única culpada por aquilo.
Ela tinha certeza de que Camila negaria aquilo.  O acidente foi apenas isso - um acidente. E foi ela, não Lauren, quem tomou a decisão sobre o período de tempo em que aceitaria ser alimentada por uma sonda. Mesmo assim, ela não conseguia se livrar do peso esmagador da responsabilidade que tinha, pela simples razão de que ninguém além de Taylor sabia o que Camila queria. No fim, a escolha recairia unicamente sobre ela.

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