Ela não está mais entre nós

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No dia sete de maio de 2017, minha mãe, conhecida como Pastora Nilda,  deu seu último suspiro.  Fica uma curiosidade, ela morreu no dia sete, no sétimo andar, no leito sete, as sete horas e poucos minutos, no ano de 2017. Como temos este número como o número da perfeição, prefiro entender que tudo aconteceu no momento perfeito. Não que perder a mãe seja algo perfeito, mas no decorrer deste capítulo você vai entender melhor.

Minha mãe sempre foi uma pessoa muito intensa emocionalmente, suas amizades foram sinceras e devotadas, ela tirava de si pra ver as pessoas bem, o mesmo acontecia conosco. Posso contar nos dedos as vezes que ouvi minha mãe falando sobre seus desejos, e que estes não fossem voltados para o próximo. Ela sonhava pra Deus, pra igreja, para as pessoas, queria ver todo mundo bem, isso a deixava feliz. Algumas pessoas abusavam desse coração tão bom, mas ela sabia que estava agradando a quem mais lhe interessava, o Senhor.

Seu temor a Deus foi admirável, Deus sempre em primeiro lugar, tudo pra Ele e por Ele.  Fui realmente educado nos caminhos de Deus, e das vezes que me afastei sempre soube que um dia estaria de volta e trabalhando na casa de Deus. Fui criado e educado desta forma, meus pais me passaram isso, através de seu ensino e exemplo de vida.

Há mais ou menos quinze anos, ela teve câncer, que foi devidamente tratado, mas voltou anos depois. Novamente ela venceu aquela doença terrível, mas os efeitos colaterais de todo aquele medicamento lhe causaram outros danos, nos rins e coração principalmente. Foram mais de 14 anos de sofrimentos com doença, sempre grata a Deus por cada dia de vida e por cada livramento que teve.

Nunca ouvi minha mãe murmurar. 

Algo que ensino em minhas palestras, não pergunte "por que?" isso remete a sofrimento, pergunte "Pra que?" isso sim remete a propósito. Minha mãe não era coach, mas não me lembro de te-la ouvido perguntando o "por que" de seu sofrimento, mas me lembro como se fosse hoje, do dia em que ela fez a seguinte pergunta: "Qual o propósito disso, Senhor? Se for pra Tua glória amém. Que pessoas sejam salvas". Ela ganhava almas pra Jesus onde quer que estivesse, principalmente nos hospitais.

Apesar de todo sofrimento, sua resiliência nos confortava e as coisas foram se normalizando, mas não para ela. A gente sempre passava por lá, e minhas visitas se intensificaram depois de minha ordenação pastoral, pois agora vinha aos cultos com mais frequência. 

Nos últimos seis meses meu pai já cuidava de todos os afazeres da casa e alimentação. Falei com ele outro dia que até nisso Deus foi cuidadoso com, pois o acostumou fazer de tudo em casa, e quando perdeu sua esposa já sabia se virar. 

Ao passo com que as internações aumentavam eu sentia uma sensação diferente, algo que me preparava, mas o fato é que a gente nunca esta realmente preparado. 

Seus dias de UTI foram os momentos de mais tranquilidade, pois estava sedada, nos últimos quatro dias estava em coma induzido, então não havia dor. Mas a gente não quer perder, então continua a orar e clamar por um milagre. Só que nas últimas vezes que ela passou mal eu estava perto, e  da última ela sussurrou: "Me deixa partir, estou cansada".
Não mãe, aguenta firme, eu disse, e ela repetiu novamente, então me pediram pra sair. Ali eu já sabia o que viria. Ela cansou e pediu pelo merecido descanso.

No dia seguinte ao enterro eu acordei e escrevi uma música:

Tudo acontece pra bem
Daqueles que amam a Deus
Até aquilo que aos nossos olhos
Não é tão bom assim

Se a vida parece cruel
Descanso aos Teus olhos achei
És meu refúgio, esconderijo
Melhor lugar pra mim

Não preciso entender
Quero viver os Teus "Pra Quês"
És o meu "sim", tudo pra mim
Dono do meu coração

É mais fácil aceitar
Do que tentar compreender
Tua graça me basta
Meu fôlego pra viver

Pela graça, eu sou livre
Em Tua graça, sim eu vivo

Na semana de seu enterro tive oportunidade de aconselhar a três pessoas que perderem entes queridos, só depois parei pra pensar que eu não sabia o que era este sentimento até então. Mas assim é a vida, este ciclo passageiro em que uns nascem e outros morrem.

Só não podemos deixar morrer o legado, aquilo de bom que as pessoas que amamos deixam, dar continuidade ao trabalho faz parte do processo, nos ajuda a entender e curar a ferida na alma.

E de legado minha mãe entendia, nunca vi tanta gente emocionada, e não era apenas compaixão por nós, era saudades da historia vivida com cada uma delas. Naquele momento percebi que tudo o que fiz até hoje ainda não está perto do que posso fazer por Deus e pelo próximo. Adorar é servir, ela fez assim, vou fazer assim também.


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