Capítulo XV - A Cura

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Octavia.

A chuva lá fora não bastou para cessar o clima fúnebre que se instalara em Croatoan. Milo dormira na cadeira, observando-me. Ele temia que eu tivesse mais pesadelos. Que eu visse Murphy, Lincoln, Abby e todos aqueles que pereceram. Mas eles não eram a causa do meu medo. Ela era. Athena, minha irmã. Tirando-me do devaneio, o ruído premeditado da porta fez Kieran conseguir minha atenção. Modestamente, ele acenou, me chamando. Olhei Milo novamente: dormindo, perfeito, sereno. Levantei e andei com passos lentos até a porta.
- O que você quer? - sussurrei.
- Preciso conversar com você - retrucou ele - É sobre a Reyes.
- Raven? - franzi a testa - O que você quer falar sobre ela?
- Acho que... Acho que estou apaixonado por ela - disparou ele - Mas sei que ela namorava o Murphy, e que faz menos de uma semana desde a morte dele...
- Você quer que eu diga se você deve investir ou não - finalizei, com seu assentimento logo em seguida - Raven merece toda a felicidade do mundo. Ela perdeu muita gente, na verdade, todos nós. Acho que antes de tentar qualquer coisa, você devia se aproximar dela. Ela parece durona, e na verdade ela é. Mas você pode conseguir penetrar na armadura.
Kieran sorriu.
- Obrigado, O - disse ele - De verdade.
- Mas por que você perguntou para mim? - indaguei - Não que você não pudesse, mas...
- Você é uma das pessoas mais resistentes que conheço, Octavia Blake - continuou Kieran - Eu não a conheço pessoalmente por tanto tempo, mas me foi relatado toda a sua vida. Você é uma guerreira, uma mulher que inspira todos ao seu redor.
- Não seja um puxa-saco - disse, sorrindo - Não se perguntou como alguém que foi criada isolada não é completamente insensível?
- É porque você foi amada, o amor te mantém humana.
Ele sorriu novamente, partindo. Ele estava certo. O amor me mantinha humana, tal como a dor. E nada como a dor para lembrar você que está vivo. 
                              +++
Ao nascer do sol, estávamos todos em pé. O café da manhã fora o tradicional: uma barra de cereal para cada um. Contudo, a mensagem que Bellamy tinha era ainda mais importante do que comer.
- Invadiremos o acampamento da Nação do Gelo esta noite - afirmou ele.
- Como faremos isso se estamos em menor número? - inqueriu um soldado, seco.
- Com estratégia, Smithers - disse Clarke - Não Invadiremos de mãos vazias, tampouco sem um plano. Athena está nos observando, esperando apenas uma oportunidade.
- Não, não está - corrigi - Athena é mais sagaz do que todos nós podemos presumir. Estamos pensando como ela pensa e é exatamente essa nossa falha. Ela espera que nós a levemos até a cura, por isso não nos atacou.
- Ainda - disse Raven - Se o que ela quer é destruir a cura para vingar-se de Price, como reagirá ao souber que ele está morto?
- Se ela mesma não o matou - disse Milo, mordendo sua barra - Lembrem-se que não identificamos o paradeiro da arma.
- Estamos com a cura ao nosso alcance, não podemos falhar - disse Kieran - Eu acho que Athena precisa de uma distração. Algo que a faça se afastar da Nação do Gelo enquanto atacamos.
- E o que seria isso? - perguntei.
Todos me encararam. Não era por eu estar falando, era por eu ser a resposta.
Eu era a isca.
                              +++
A ideia não me agradara. Pandora devia morrer pelas minhas mãos. Enquanto eu segurava uma espada aguardando a possível chegada da minha irmã, eles me observavam. Apenas esperando a chance para marchar até o acampamento.
Respirei fundo. Athena era minha gêmea e, talvez, nossa ameaça mais perigosa.
- Por que enviaram você para cá, irmãzinha? - uma voz fria cortou o silêncio - Espero que não estejam planejando nada.
Na minha frente, Athena Price mantinha-se gloriosa, coberta de sangue. Igualmente com sua arma em mãos, ela me observava.
- E o que a leva a crer que alguém me enviou? - rebati - Talvez você esteja em alerta desnecessariamente.
- Não tente me fazer de idiota, Octavia - gritou ela - Ambas sabemos que não sou.
- Por que você quer destruir a cura?
Ela me avaliou mais severamente.
- A cura é um antídoto não somente para a Praga, mas também para a maldição Wanheda - disse Athena - E diferente de Bellamy e Clarke, essa dádiva não é algo que eu queira me desfazer.
- Engraçado, você matará todo um povo para manter-se empoderada - aproximei-me dela - Mas quando todos aqui morrerem, seu poder não valerá de nada.
- Você se engana, irmãzinha - disse ela - Meu reinado está apenas começando e nada e nem ninguém tirará do que me é por direito.
- Você roubou meu trono, irmãzinha - vociferei - E não se engane ao pensar que o seu reinado será atemporal. Você vai cair, e eu estarei lá pra te ver sucumbir como o verme que é.
Com um acesso de fúria, Athena se lançou sobre mim. Senti seu joelho chocar-se com meu estômago e me deixar sem ar. Soquei seu rosto no primeiro vacilo que encontrei e ela caiu para trás. Peguei minha espada novamente e ela riu.
- Você não é uma Heda, Octavia - disse ela - Você é apenas a garotinha que morava no sótão e temia o mundo ao seu redor.
- E você foi um rato de laboratório, continua sendo - a frieza tomou minha voz - Todavia, eu tenho uma família, Athena, e você não tem nada.
O som longínquo do canhão nos fez atentar para o leste. Minha gêmea riu.
- Acho que seus amigos acabaram de chegar no acampamento.
Ela sabia. Ela sempre soube.
- Como? - indaguei.
- Eu disse para que não tentasse me enganar, O - continuou - A Nação do Gelo foi o único clã que não pereceu com nenhum sintoma da Praga. Os Ascendentes, por outro lado...
- Estava fazendo experiências? - disse.
- Sou a deusa da sabedoria, minha querida - disse ela - Sobrevivência e monstruosidade jamais foram termos antagônicos, você já deve ter percebido. Contudo, ainda não estou com a cura em mãos. E como negaram-se a me indicar o paradeiro de Pandora, eu... Me alterei.
- Você matou toda a Nação do Gelo? - bufei.
- E vocês são os próximos - disse Athena - Eu tenho planos para você, irmãzinha. Nos veremos muito em breve.
Pulando do precipício, minha inimiga sumiu.
                               +++
Meu estômago ainda doía. Tudo que fizemos foi por nada. Ela ainda saíra triunfante, mesmo não localizando a cura.
- Eu não vou resistir mais, Skairipa - disse uma voz atrás de mim.
Eu reconheceria aquele agouro em qualquer lugar — era Pandora. E ela achava que eu era Athena.
- Ainda está você, verme - disse, com minha melhor imitação - Pensei que continuaria a se esconder. O seu povo não o fez, mas você...
- Fui covarde, Heda - disse ela - Mas estou disposta a receber o peso de sua ira. Bendita seja vois, Skairipa. Ceifadora do Céu.
Era isso. Era minha chance. Eu vingaria Lincoln e salvaria a humanidade. Sobreviveríamos.
Sobrevivência e monstruosidade jamais foram termos antagônicos.
Eu não era um monstro. Eu não seria um.
- Pandora krom Azgeda, você agora é minha prisioneira - urrei - E a salvação de todos.
Com o cabo da minha espada, atingi o rosto dela.


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