Capítulo XIX - A Coroa Sangrenta

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Octavia.

Minha cabeça latejava. Enquanto meus olhos se abriam, apenas o frio do solo era notável para mim. Havia sido pega. Mesmo que ela não pronunciasse uma palavra sequer, podia sentir a presença de Athena. Senti-me. Minha irmã gêmea era mais parecida comigo quando estava contente.
- Olá, irmã - disse ela, sorrindo - Faz um tempo.
- Poupe-me da falsa modéstia - retruco, seca - O que vai acontecer comigo?
- O que imagina que vai acontecer com você, Octavia? - vocifera ela - Você é minha família.
- Isso não a impediu de fazer tudo que fez, não é mesmo?
Athena baixou a cabeça. Entretanto, a mulher que estava na minha frente não era nada parecida com a Skairipa. Não era a Ceifadora do Céu, tampouco um monstro. Ela nunca pareceu tão humana.
- Steven Price foi o único pai que conheci - narrou ela - E eu o matei.
Foi ela.
- Ele era um monstro, Athena - disse - Não que você seja muito diferente, mas o mundo não sentirá falta dele.
- Ele era meu pai, Octavia - bradou ela, chorando - Eu o matei para sobreviver porque ele não me via como eu era.
- Nosso pai biológico, Marcus Kane, não foi muito diferente - argumentei - Quis me usar para os propósitos pessoais dele e quando ele e a Iniciativa falharam, ele revelou ser quem sempre foi. Acho que você seria a garotinha do papai.
- Eu ainda lembro do dia em que me tornei Wanheda - disse Athena, ignorando meu último comentário - Foi doloroso, a princípio. Mas tudo que veio depois foi maravilhoso, até que a ameaça nociva da Praga fez meu pai perder o juízo. Ele sabia que nem todos poderiam suportar a "maldição".
- Steven queria a cura somente para Jason, ele nunca foi altruísta - disse - Ele usou você. Ele lhe deu o nome da deusa da guerra e da sabedoria porque você sempre foi a arma mais poderosa do arsenal dele.
- Você acha que não sei disso? - riu ela - Delphine foi o mais próximo que tive de uma amiga e ela era louca bem antes de Diana ser morta.
Congelei.
- Foi você que a matou? Nenhum de nós o fez, tampouco os poucos guardas da Ômega.
Ela somente assentiu.
- Ela ia me prender novamente e eu surtei - rebateu ela - Eu me tornei a Morte, Octavia. Não sou culpada por ceifar aqueles ao meu redor.
- Você matou a Nação do Gelo, Athena - disse - Você matou um clã terráqueo por inteiro somente para fazer uma jogada suja. Para mostrar que estava no controle.
- Pandora não cederia se não fosse ameaçada e se ela não cedesse, não teríamos a cura - sibilou ela - E por favor, não queira dar-me lições de moral. Mount Weather é a prova viva de que nenhum de vocês é um santo.
- Não há heróis, apenas sobreviventes - murmurei - Para derrotar um inimigo que fará de tudo, você também tem que estar disposta a fazer de tudo. Não tínhamos outra alternativa.
- Eu concordo - disse Athena Price - A cura não dizimará só a Praga, mas a maldição Wanheda também. Eu não serei nada menos que uma humana, e não quero que tirem isso de mim. Não vão tirar. Não importa quem tenha que morrer.
- Bellamy não vai deixar que mais ninguém se transforme em etéreos - proferi - Você não pode tomar uma decisão importante dessas sozinha. Não importa quão Heda você seja, carregar uma coroa sangrenta não tratará benefício algum.
- Coroa esta que é sua por direito - lembrou ela - Lexa morreu e o povo passou o manto para você. Você deveria liderá-los, mas estava muito ocupada chorando por Lincoln e posteriormente muito ocupada com Milo.
- Eles não têm nada com isso, eu sou a responsável pelos meus atos - disse - E ninguém me tirará a honra de destruir o governo nocivo que você criou.
- A quem você quer enganar, irmã? - sussurrou ela - Ainda que Bellamy e os outros cheguem até Polis, eles estão em menor número. Nosso armamento, ainda que precário, segue sendo superior. E eu sou a Comandante da Morte, a Skairipa, ninguém pode me vencer.
- E nem precisamos fazer muito esforço, irmã - feri - Você é uma usurpadora, um nada. O seu maior medo nunca foi perder a maldição, foi descobrir quem você é sem ela. Eu sou Heda por mérito você, por medo.
- É tudo que tenho - Athena chorou, até os monstros podiam chorar - Por favor, irmã, não tire de mim.
- Você pode escolher ascender das cinzas, Athena Price - afirmei - Permita-se se redescobrir, e talvez, você seja uma pessoa bem melhor do que jamais seria como Wanheda.
- Eles nunca me perdoarão, O - ela continuava a chorar - Ainda que eu tente e até mude, eu sempre serei a ameaça.
- Você é família, Athena. E nós nunca desistimos da família.
Ela sorriu. Eu podia terminar esta guerra aqui, agora. Derrubando a rainha, dando o xeque-mate. Mas a risada dela perfurou meus tímpanos e os meus sentimentos.
- Eu definitivamente teria sido uma atriz digna de Oscar - assegurou ela - Esse teatrinho aqui, irmãzinha, foi apenas para garantir que o próximo passo do meu plano dará certo.
- Que passo? - bufei, enojada.
- Iremos trocar de identidade, ao menos por um tempo - disse ela - Você sofrerá a punição designada para Athena e eu, como Octavia, destruirei seu grupo de dentro para fora. E ainda no trono como Heda, tomarei o que me é por direito: o mundo.
- Seu plano tem uma falha: eles nunca acreditarão nisso - disse - Eles sabem quem é Octavia Blake.
- Vai perceber que as coisas costumam morrer com mais rapidez do que o esperado - disse Athena - Essa é a última vez que nos veremos, O. Finalmente serei a única garota bonita por aqui.
- Athena, você pode escolher ser melhor! - gritei - Você não precisa ser um monstro. Você não precisa ser igual ao seu pai.
A última frase a parou. A menção ao pai a fazia tremer. Ao menos algo em sua estória era verídica. Entretanto, eu me permiti esquecer um detalhe sobre monstros: eles tendem a ser mais perigosos quando estão assustados. Pela janela, vi um gás vermelho tomar conta do céu. Era a cura, eles conseguiram. Meus amigos salvaram o mundo.
Em um ato de fúria, Athena acertou minha cabeça e tudo que vi foi escuridão.

The 100 (#3)Onde histórias criam vida. Descubra agora