Capítulo II - Surpresa

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A chefa da aldeia fez uma anotação mental para patrulhar mais vezes, pois pegara a maioria das sentinelas dormitando em seus postos — tudo bem que o clima invernal não ajudava, mas os designados para aquela tarefa deveriam estar atentos para qualquer sinal na floresta circundante. Poderiam dizer que Kyrah era dura quanto à vigia das fronteiras da aldeia, mas segurança nunca era demais. Preferia estar prevenida para a chegada de qualquer mensageiro ou forasteiro suspeito, do que ser pega de surpresa por algum invasor.

Chegando perto de mais um dos pontos de vigia, amarrou na beirada da sela a lebre que caçara e desmontou de sua égua Skuld, aproximando-se do moreno que olhava muito interessado para um dos galhos no alto. Parou e olhou na mesma direção, não vendo nada interessante, antes de voltar-se para o homem.

— Angus, viu algum esquilo? — perguntou Kyrah, curiosa com o jeito compenetrado do amigo.

O huno voltou-se para a chefa, piscando e franzindo as sobrancelhas, como se retornasse do mundo dos sonhos, que provavelmente eram bem mirabolantes e sem sentido, como bem o conhecia, mas então ele disse simplesmente:

— Deixaram uma mensagem da Berna.

— É mesmo? — estalou Kyrah, o rosto iluminando com o fato, e já estendendo a mão para ele. — Quem deixou?

— Um bardo gaulês — Angus informou, entregando a cartinha amarelada e amassada para a chefa. — Só estava de passagem para outra aldeia. Ainda bem, pois tinha uma voz mais estridente que um javali guinchando ao ser espetado por uma lança.

Careteando ao imaginar uma música daquele bardo, Kyrah pegou a carta da irmã e verificou que o lacre de cera estava intacto, antes de agradecer o amigo e abrir ali mesmo, lendo rapidamente a mensagem. Berna era breve em seu relato, provavelmente por não saber se a carta iria mesmo parar em suas mãos, mas ao menos continha uma estimativa do seu retorno.

— Então? — incitou Angus, querendo mais notícias do velho amigo, Tristan.

— Eles estão bem, mas só vão retornar no próximo outono — Kyrah disse, desapontada.

— Ah — fez o huno, soltando um muxoxo — Que coisa, mas ninguém consegue controlar os pés daqueles dois.

— Sim — concordou ela com um suspiro. — Bom, obrigada de novo, Angus. Depois me informe se lembrar de alguma coisa que o bardo falou sobre a Berna, e dê um descanso para a Ingra. Já é o que, o quinto de vocês?

— Quarto, e tenho o dever de repovoar o meu clã — Angus deu de ombros, com um sorriso a pairar no rosto moreno.

— Não todo ele, a aldeia já está com crianças saindo pelas janelas, logo teremos que aumentar o Escribarium — Kyrah meio que bronqueou, guardando a carta nas vestes — Enfim, eu vou continuar minha patrulha, bom trabalho.

Angus apenas acenou para a chefa, voltando a contemplar o galho onde estava pousado um inseto de cabeça para baixo.

Um pouco frustrada com a mensagem tão esperada, mas que minara as suas expectativas de ver a irmã tão cedo, Kyrah guiou sua bela égua pela trilha arborizada em um trote ritmado, atenta aos sons da floresta. Aquela área era um pouco mais densa, por ficar perto de um morro, e ultimamente lobos circundavam a região, então era bom se preve.... Estalos de galhos quebrados e um rosnado grave que ecoou pelas árvores cortaram os pensamentos de Kyrah, que chicoteou a cabeça na direção do som. Skuld empacara, com as orelhas atentas e resfolegando inquieta.

— Calma, garota — sussurrou para a égua, dando leves tapinhas no pescoço para acalmá-la. Pressionou os joelhos para que continuasse a trotar pelo caminho que bifurcava logo à frente, enquanto alcançava o arco recurvo de caça e encaixava uma flecha na corda.

O Destino da RainhaOnde histórias criam vida. Descubra agora