Capítulo VII - Aliança

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— Tem certeza, mãe? — perguntara Kadaj, na semana anterior, quando a rainha o confidenciara seus planos.

Era de noite, sua irmã já estava dormindo feito uma pedra e estavam sentados no banco da saleta à frente do quarto da mãe, que o fitava preocupada, depois de tentar o explicar racionalmente sua decisão.

Bragi tinha partido há alguns dias, levando a mensagem para Emmerich, e Kyrah pensara que era bom preparar o terreno, caso o caçador aceitasse sua proposta. De qualquer forma, Kadaj merecia saber, e se aprovasse Maküsh, ficaria mais fácil fazer Safyrah se habituar à nova situação.

Sim, eu pensei bastante no assunto, parece a melhor escolha até agora — afirmou Kyrah, sustentando o olhar do menino cacheado, sentado de frente para ela.

— Então, ainda dá para trocar... — acrescentou o rapazinho, torcendo o nariz.

— Kadaj! — bronqueou, mas acabou rindo do que ele disse, antes perguntar, séria — Não gosta do Emmerich?

— Ele parece ser um bom homem... — o moreninho desconversou, encolhendo os ombros e desviando o olhar para as próprias mãos, que tamborilavam uma melodia imaginária.

Observara desconfiado o ruivo que andara atrás da mãe, pronto a atirar sua adaga se a faltasse com o respeito, mas aquele guerreiro ao menos era mais civilizado que os anteriores que andaram a perseguindo, então não precisara intervir.

— Meu pequeno guerreiro — Kyrah adiantou a mão para o rosto do filho e o acarinhou, atraindo os grandes olhos castanhos para si — Não precisa ter medo de dizer o que pensa, você e Safyrah sempre estarão em primeiro lugar na minha vida — afirmou, em tom terno que pasmaria qualquer outro ouvinte — É justamente pela segurança de nossa família que precisei tomar essa decisão. Preciso de um homem de clã nobre ao meu lado, para que seja plenamente respeitada nas outras Aldeias.

— Os outros chefes são todos uns idiotas — Kadaj declarou em tom seco, franzindo o cenho. — Pena que o tio Bragi não serve para colocar muita moral...

Aquilo arrancou outra risada de Kyrah, que balançou a cabeça em concordância. Suspirando, o menino apoiou a cabeça no vão do ombro dela, abraçando-a de lado.

— Quero que seja feliz, mãe — confessou Kadaj, com a voz abafada pela capa de peles — Vi que o Emmerich a fez sorrir durante a festa — e levantou o olhar para Kyrah, que o ouvia atentamente — sorrir de verdade, como há tempos eu não via, nem quando o Urso ainda estava... — e a voz dele sumiu, enquanto os expressivos olhos castanhos nublavam-se com as memórias tristes do passado.

Kadaj sempre fora uma criança muito perceptiva, então Kyrah não estava surpresa com o fato de o menino ter notado aquilo, antes que pudesse se dar conta de seus próprios sentimentos.

— Obrigado, Kadaj — e a rainha sorriu fechada, afagando os cachos de seu primogênito.

— Só que ninguém vai tomar o lugar do meu pai — ele acrescentou, em tom decidido.

— É claro que não, filho — Kyrah concordou, com um leve sorriso a pairar no rosto ao sugerir — Mas, vocês podem ser bons amigos. Emmerich é inteligente e pode ter muito a lhe ensinar, não seja tão duro com ele.

— Vou pensar no seu caso, mãe — declarou Kadaj, arqueando as sobrancelhas enquanto julgava a sugestão.

Exatamente com a mesma expressão que olhava agora, da entrada da cozinha, para o ruivo que pegara no flagra, agarrando a sua mãe — Emmerich até tentou disfarçar, enquanto tirava a mochila de couro das costas. Kadaj estreitou os olhos para o homem, meio enciumado por um momento, antes de voltá-los para Kyrah, ao lembrar-se de seu propósito.

O Destino da RainhaOnde histórias criam vida. Descubra agora