Liberum Adolescentia

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"— Tem certeza de que é essa a faculdade que você quer, meu filho?

— Tenho sim, mãe. Sociologia me faria entender mais sobre...

— VOCÊ NÃO VAI ENTENDER NADA, VOCÊ VEM COMIGO PRO BATALHÃO! ANDA LOGO ANTES QUE EU META BALA NESSA SUA CARA!"

Acordei assustado e ofegante. Um pesadelo que veio em um péssimo momento, onde estava lutando para sobreviver.

No pesadelo, eu tentava explicar à minha mãe o porquê do meu sonho de fazer sociologia. Eu queria saber e aprender mais sobre isso, mesmo que não soubesse explicar o porquê. Enquanto eu procurava as palavras, um dos soldados invadia a minha casa, destruindo tudo para me levar. A única coisa que seria pior que esse sofrimento seria se minha mãe estivesse passando por algo parecido....

... Minha mãe... Como será que ela estava? Enquanto corria, não reparava muito nas casas, mas percebi que os soldados faziam um tipo de cerco, onde quem estava em casa não saía e quem estava fora não entrava, não sem permissão ou ordem vinda de cima. Não consegui chegar a uma conclusão de como ela estava, então resolvi deixar pra lá, pelo menos por enquanto. Deveria ao menos estar vivo quando fosse vê-la outra vez.

Quando descemos pelo alçapão, o caminho em que a Ten. Thompson indicou não tinha erro. Frente, esquerda, frente, esquerda, direita, esquerda, frente. Segundo ela, haveria uma porta com a inscrição "liberum adolescentia". Ela disse que, numa tradução bem literal, significa "juventude livre". As chaves estavam em minhas mãos e só deveríamos chegar até lá sem fazer alarde.

Senti um braço se entrelaçar ao meu. Quando olhei para o lado, era Maria.

— Você tá com medo?... — Ela perguntou, segurando a lanterna e iluminando o caminho para nós e para os outros dois, que andavam mais à frente.

— Como nunca na minha vida. — Respondi sem medo de parecer fraco.

— Bom, se a Thompson confiou em você pra nos levar até lá, eu também confio. — Ela disse, apertando o meu braço, mas sem olhar pra mim. Ela estava muito concentrada no caminho.

— Eu agradeço, mas....

Antes que pudesse terminar de falar, avistamos a porta. Era uma porta de aço no meio de uma parede de concreto. Chegamos mais perto, e a tal inscrição estava ali. Coloquei a chave com o risco vermelho, como orientado pela Ten. Thompson, e girei. Olhamos todos pelo cômodo úmido e gelado. Uma cama com um colchão no canto do cômodo, uma escrivaninha suja e com a lâmpada falhando, algumas goteiras e um cheiro insuportável de mofo, de pano guardado. Vi também um fogão a gás, um botijãozinho, uma pia minúscula, algumas caixas de pizza, algumas embalagens de fast-food,....

Quando olhei no canto da sala, meu coração disparou. Vi uma televisãozinha, apoiada em um criado-mudo, e o que parecia ser uma pessoa sentada à frente dela. Uma voz meio rouca e com mais um sotaque carregado falou:

— Ela disse que vocês viriam.

Como assim? Ela disse que nós viríamos? Foi tudo planejado?

— Você quis dizer que ela disse que alguém viria, né? — Sophie perguntou ao rapaz (deduzi pela voz.).

— Sim. Ainda não me acostumei com o idioma de vocês. Thompson me disse que buscaria um de vocês....

Uns de vocês. — Sophie corrigiu de novo.

— Isso. Peço paciência comigo. Algumas coisas eu consigo falar normalmente, mas outras eu travo.

— Sim, mas podemos saber o seu nome? — perguntei já um tanto desconfiado.

Underneath - Abaixo de TudoOnde histórias criam vida. Descubra agora