Capítulo Sete

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Amora parecia não entender, mas por alguma razão, sua mente a transportou vinte anos no tempo, para quando ela ainda era criança, para quando seus pais ainda eram casados, para quando seu pai ainda era vivo.

Vê-lo depois de tanto tempo fez seu coração disparar. A vontade de abraçá-lo era tão forte, mas mesmo que tentasse, nada aconteceria, era apenas um sonho. Mas mesmo assim, ela sentiu as lágrimas que rolaram, e a saudade era tão real quanto aquelas lágrimas.

  - Amora? - disse ele, e o coração da moça parou. "Ele pode me ver?" ela pensou. Mas logo percebeu que era com a pequena Amora que ele falava.

  - Oi papai. - respondeu a pequena, e saiu correndo, subindo em sua cama para se esconder.

  - Você pode correr, mas não pode se esconder. - cantarolou ele, indo em direção à cama da menina - Achei você! - disse enquanto segurava com carinho aquele montinho embaixo da coberta.

A pequena deu um grito, e logo caiu na gargalhada. E os dois riram, e se abraçaram. Amora sentiu aquele abraço recebido por sua versão mirim, e sorriu. Inundada de felicidade ela se assustou quando foi puxada por um corredor de luz, arrancada daquela lembrança por um beep-beep-beep insistente. Quando abriu os olhos estava ofegante, e demorou um pouco para reconhecer o beep do despertador. Seus olhos estavam molhados, e ela ainda estava tonta depois daquela viagem no tempo. Aquele sonho fora tão real, e a lembrança de seu pai - que era apenas uma sombra da infância - retornou, trazendo um saudosismo que a fazia sorrir ao se lembrar das brincadeiras e do carinho que o pai tinha com ela. Amora lamentou o fato de ter perdido o pai tão cedo. Mas, qual seria o acontecimento tão importante que a faria voltar vinte anos no tempo? O que teria acontecido? Bom, talvez a sessão viagem no tempo continuasse essa madrugada, afinal foi apenas um sonho.

  - E que sonho, hein! - disse Fabi, boquiaberta ao ouvir o relato de Amora. - Mas, como era seu pai? Você nunca falou dele.

  - Ele era um grande homem. - ela sorriu com a lembrança - Morreu quando eu era criança, não tenho muitas lembranças.

  - Lamento! - disse a amiga em solidariedade.

  - Bom, vamos voltar ao trabalho. Temos pessoas famintas para alimentar! - disse Amora, tentando afastar a tristeza que estava prestes a surgir.

  - Sim, patroa! - respondeu Fabi, brincando.

As duas riram, e voltaram ao trabalho em silêncio; mas a questão pendente ficou pairando nos pensamentos da moça durante todo o dia. A verdade é que Amora pouco sabia sobre seu pai. Ele faleceu quando ela tinha cinco anos, e sua mãe se recusava a falar sobre ele, dizia que o assunto era mórbido demais para ela que preferia se concentrar nos vivos, mas ela não tinha a quem recorrer senão à ela. Seria difícil, mas valeria a pena tentar!

  - Amora, tem um gato lá fora procurando por você! - disse Fabi, sem nenhuma cerimônia.

  - Ah tem? - respondeu a patroa, fingindo não saber do que se tratava.

  - Vai ter que me contar essa história depois. - sussurrou Fabi enquanto as duas iam em direção ao salão da lanchonete.

  - Então é aqui! - disse Tiago, sorridente. - Lugar bacana esse! E seu?

  - Sim, é meu cantinho! - respondeu a moça, sentindo a bochecha corar novamente.

  - Um belo cantinho, devo dizer. - elogiou o rapaz, ainda sorrindo - Como você está?

  - Estou bem! - respondeu Amora, saindo de trás do balcão, indo ao encontro de Tiago. - E você, como está?

  - Bem! Demorei um pouco pra me recuperar da madrugada de jogatina, mas estou bem! - disse, ainda sorrindo. O que fez Amora querer perguntar se ele nunca parava de sorrir.

AmoraOnde histórias criam vida. Descubra agora